Capa da brochura
CUNHA, Xavier da – A Bíblia dos Bibliophilos – Divagações Bibliographicas e Biblioeconómicas pelo Director da Biblioteca Nacional de Lisboa. Coimbra, Imprensa da Universidade, 1911. 103 págs. Brochura.
Conforme tinha prometido (e o que é prometido é devido), apresento-vos o livro de que vos falei no último texto.
Página de rosto
Antes de entrarmos no livro, propriamente dito, deixo estes apontamentos breves sobre Xavier da Cunha.
“Xavier da Cunha nasceu em Évora, a 14 de Fevereiro de 1840, e faleceu em Lisboa, em 11 de Janeiro de 1920. Era filho de Estêvão Xavier da Cunha, jornalista, que detinha o cargo de secretário da Administração Geral do Distrito, em Évora. Foi casado com D. Antónia Balbina Mendes Figueiredo da Cunha.
Concluiu o curso da Escola Médico-Cirúrgica em 1865. Exerceu funções de cirurgião interno no Hospital da Marinha, em Lisboa, de facultativo da Associação Conciliadora de Santa Catarina, em Lisboa, do Hospital da Misericórdia, de Alcobaça, e do Hospital de Constância, na vila da Barquinha.
Em 1886 foi provido no cargo de segundo conservador da Biblioteca Nacional de Lisboa, tendo sido nomeado director da mesma em 1902, cargo que ocupou até 1910. No desempenho desta função organizou várias exposições, como as dedicadas a Cervantes, Petrarca, Garrett, ou biblio-iconográficas.
Publicou "A Biblioteca Nacional e os seus livros médicos"; "A legislação tributária em benefício da Biblioteca Nacional"; "A Bíblia dos bibliófilos"; "A Biblioteca Nacional de Lisboa: suas deficiências e remédio dessas deficiências"; "Impressões deslandesianas: divagações bibliográficas"; "Notice sur la Bibliothèque Nationale".
CUNHA, Xavier da, 1840-1920
Impressões deslandesianas : divulgações bibliographicas / Xavier da Cunha.
Lisboa : na Imprensa Nacional, [1895] (1896). - 2 v.
(Cópia publica, em pdf, acessível em: http://purl.pt/254/2/)
Foi escritor, poeta, bibliógrafo. Publicou poesia lírica sob o pseudónimo de Olímpio de Freitas. As suas obras foram compiladas num volume, em 1910, com prefácio do próprio. Parte delas foi traduzida e publicada noutras línguas, nomeadamente em italiano, tendo sido tradutor Próspero Peragallo.
Uma das suas obras mais conhecidas é "Pretidão de Amor: endechas de Camões a Bárbara escrava seguidas da respectiva tradução em várias línguas". Lisboa: Imprensa Nacional, 1893-95. Publicou ainda "António Ribeiro dos Santos: bibliófilo"; "Camões e Lord Stangford"; "Filinto Elísio: bibliófilo"; "Francisco Henrique Ahlaers: subsídios para a sua biografia"; "Homenagem a Vasco da Gama"; Notícia de um precioso livro da Biblioteca Nacional: repertório dos tempos de Valentim Fernandes Aleman"; "A epopeia das navegações portuguesas: estrofes com traduções em italiano, espanhol e francês, por Prospero Peragallo, D. José Lamarque e José Benoliel"; "Frederico Mistral: parecer à sua candidatura"; "Garrett e as cantoras de San Carlos"; "Homenagem póstuma ao visconde Júlio de Castilho"; "Manuel Vieira da Natividade"; "A medalha de Casimiro José de Lima em homenagem a Sousa Martins"; "No adro da igreja das Chagas: soneto a Camões"; "A medalha escolar do Colégio do Corpo Santo"; "Algumas palavras acerca do Conde de Valenças"; "Quem era José Colffs de Guimarães"; "Sepultura de Garrett"; entre outras.
Colaborou no "Arquivo Pitoresco", na "Gazeta de Portugal" e no "Dicionário Contemporâneo", organizado por Caldas Aulete e Santos Valente, e no "Dicionário Popular", dirigido por Pinheiro Chagas, e ainda no "Álbum de Costumes Portugueses", "Lisboa-Creche" ou "A Espanha", publicação ilustrada, dedicada à Associação dos Escritores e Artistas Espanhóis - Madrid. Dirigiu, ele próprio, várias publicações, como "A Biblioteca do Povo e das Escolas".
Colaborou também na Exposição Oceanográfica e no Congresso Internacional de Liège
Foi sócio correspondente da Academia das Ciências de Lisboa, bem como de outras instituições de carácter literário e científico, em Portugal e no estrangeiro”. (1)
Trata-se de A Bíblia dos Bibliophilos de Xavier da Cunha, livro baseado num artigo publicado no n.º 2, referente ao mês de Abril de 1910, do Boletin de la Biblioteca Municipal de Guayaquil – cidade do Equador – e intitulado precisamente “La Biblia de los Bibliofilos”, texto baseado no trabalho “Don’t” de Harold Klett publicado em The Library Journal de Nova Iorque em que este descreve os trinta preceitos a seguir pelos bibliófilos.
Como se pode ler na tradução castelhana: “Puede calificarse así, las reglas que ha estabelecido, para el aprovechamiento y conservación de los libros, uno de los más autorizados bibliófilos americanos”
Xavier da Cunha neste seu trabalho propõe-se: “ […], farei aqui transcrição, accrescentando-lhe commentários meus.”
Página inicial e 1º preceito
Ora vejamos então estes “preceitos”.
Começo com o 1º preceito: “No leer en la cama”
Aqui, como médico que era, não pode deixar de expressar o ponto vista da sua especialidade.
O 2º preceito é: “No poner notas marginales, á menos de ser un Coleridge”
Neste ponto, os seus comentários são mais detalhados (pág. 6-19) e polemiza com o autor – ou não seja este um dos aspectos de discussão bibliófila e ainda hoje não consensual – e sempre presente quando se descreve ou adquire um livro!
2º preceito
Dado o interesse do tema, deixo algumas páginas ilustrativas, para se poder ajuizar dos seus pontos de vista (2).
O 3º preceito é: “No doblar las puntas de las hojas”
O 4º preceito é: “No cortar con negligencia los libros nuevos”
3º, 4º e 5º preceito
O 5º preceito é: “No garabatear vuestro interesante y precioso autógrafo en las páginas de título”
Outro ponto de polémica entre os bibliófilos e, como tal, o autor estende-se pelas págs. 21-77, rebatendo este ponto de vista, contrapondo com alguns dos exemplares da sua colecção bibliófila, em que demonstra o valor de certas assinaturas de posse. (3)
Mas como sempre a polémica deverá manter-se.
O 6º preceito é: “No poner en un libro de un peso, una encuadernación de cinco pesos“
5º e 6º preceito
O 7º preceito é: “No mojar la punta de los dedos para dar más fácilmente la vuelta a las hojas”
Mais uma vez, fala mais como médico do que bibliófilo.
7º preceito
O 8º preceito é: “No ler comiendo”
O 9º preceito é: “No fiar los libros preciosos a malos encuadernadores”
Vale a pena conhecer um pouco da história do encadernador Aleixo Bouret – este dos bons! – estabelecido em Lisboa no Largo de S. Carlos, que ele nos traça.
8º e 9º preceito
O 10º preceito é: “No dejar caer sobre el libro las cenizas del cigarro; y aun mejor no fumar leyendo. Esto prejudica la vista”
10º preceito
O 11º preceito é: “No arrancar de los libros los grabados antiguos”
O 12º preceito é: “No colocar vuestros libros sobre el borde exterior ó canal, como se hace frecuentemente cuando se ley se interrumpe momentáneamente la lectura, en vez de tomarse el trabajo de cerrar el libro después de puesto una señal”
O 13º preceito é: “No dejar secar hojas de plantas dentro de los litros”
O 14º preceito é: “No tener los estantes de las bibliotecas encima de los picos de gas”
11º, 12º, 13º e 14º preceito
O 15ª preceito é: “No sostener los libros sugéstandolos por las tapas”
O 16º preceito é: “No estornudar sobre las páginas”
O 17º preceito é: “No arrancar las hojas de la guarda”
15º, 16º e 17º preceito
O 18º preceito é: “No comprar libros sin valor”
O 19º preceito é: “No limpiar los libros com trapos sucios”
O 20º preceito é: “No tener los libros encerrados en arquillas, escritorios, cómodas, ni armários: tienen necesidad de aire”
18º, 19º e 20º preceito
O 21º preceito é: “No encuadernar juntos, dos libros diferentes”
21º preceito
O 22º preceito é: “EN NINGUN CASO sacar las láminas y los mapas de los libros”
O 23º preceito é: “No cortar los libros con horquillas para el cabello”
O 24º preceito é: “No hacer encuadernar los libros en cuero de Rusia”
22º, 23º e 24º preceito
O 25º preceito é: “No emplear los libros para asegurar las sillas ó mesas cojas”
O 26º preceito é: “No arrojar los libros á los gatos, ní contra los niños”
25º e 26º preceito
O 27º preceito é: “No romper el lomo de los libros abriéndolos enteramente y por fuerza”
O 28º preceito é: “No leer los libros encuadernados muy cerca del fuego de la chimenea, ni en la hamaca, ni embarcado”
O 29ª preceito é: “No dejar que los libros tomen humedad”
O 30º preceito é: “No olvidar estes consejos”
27º, 28º. 29º e 30º preceito
Como nota de remate, deixo aqui a citação com que o autor encerra o seu trabalho:
“É o caso de Manuel de Faria e Sousa no comentário à Ecloga I de Camões: - “ Quien me quiera agora meter en esta? Mucho mejor es dexarlo”.
Saudações bibliófilas
Notas:
(1) Arquivo Nacional Torre do Tombo – Xavier da Cunha (PT/TT/XC):
(2) Não sendo um livro raro, ou excepcionalmente caro, é pouco frequente de se encontrar no mercado, pelo que o número de fotografias das páginas, que me parecem de maior interesse para a vossa leitura é grande … pelo facto, peço desculpa a todos aqueles que conhecem ou já leram a obra.
(3) Contem apontamentos de alguma importância para os estudiosos da obra de Almeida Garrett, de Camilo Castelo Branco e de M. M. Barbosa du Bocage entre outros.
6 comentários:
Caro Rui.
No conocía el libro,es sensacional. Me parecen muy buenos los preceptos creo que algunos pecadillos he cometido, aunque puedo asegurar que nunca le he arrojado, un libro a un gato.
¡Fantástico!
Gracias por compartirlo.
Un abrazo.
Rui,
Ótimo texto e um livro muito interessante. Realmente, o conselho de “No arrojar los libros á los gatos, ní contra los niños” é muito útil para os momentos em que os felinos nos perturbam, e procurarei sempre lembrá-lo.
Abraços de além-mar,
Angelo
Caros amigos,
De facto, penso que este livro, ainda que na sua simplicidade mas escrito com grande erudição e conhecimento, encerra muitos ensinamentos para além dos referidos “preceitos” – que todos temos em mente, mas que por vezes esquecemos...claro que “No arrojar los libros á los gatos, ní contra los niños”, talvez seja um dos mais respeitados (e eu até gosto de gatos).
Para o estudioso da bibliofilia portuguesa contem algumas informações bastante importantes.
Um abraço
Muy curiosos preceptos bibliófilos, Rui, algunos bien divertidos. Estoy totalmente de acuerdo con el segundo: no me importaría tener un libro totalmente garabateado de notas marginales, si éstas fueran de Lope de Vega o Quevedo :-)
Saludos bibliófilos
Urzay,
Este livro, na sua forma um pouco “brincalhona” como trata estes preceitos, acabe por trazer para o terreno da discussão temas bastantes importantes para a bibliofilia , revelar alguns pormenores dispersos pela literatura bibliográfica e traçar também o perfil coleccionista do próprio autor. Gostei muito de o ler.
Um abraço
18 No comprar libros sin valor. Pero... ¡es que son tan baratos!
Grandes consejos, que habría que dar cuando se enseña a leer.
Enviar um comentário