"Se não te agradar o estylo,e o methodo, que sigo, terás paciência, porque não posso saber o teu génio, mas se lendo encontrares alguns erros, (como pode suceder, que encontres) ficar-tehey em grande obrigação se delles me advertires, para que emendando-os fique o teu gosto mais satisfeito"
Bento Morganti - Nummismologia. Lisboa, 1737. no Prólogo «A Quem Ler»

sábado, 31 de julho de 2010

Livros censurados



Frontispício do
Index Librorum Prohibitorum
(Veneza1564)

Este título evoca, de imediato, a lista negra do Index Librorum Prohibitorum onde figuram nomes como os de Erasmo de Roterdão, François Rabelais, Giordano Bruno, René Descartes, Thomas Hobbes, David Hume, Denis Diderot, Honoré de Balzac, Èmile Zola, Stendahl, Gustave Flaubert, Anatole France, Henri Bergson, Maurice Maeterlinck, André Gide, Jean-Paul Sartre entre muitos outros escritores infelizmente.


Denis Diderot

Por razões ideológicas, religiosas, morais, políticas ou, simplesmente, “bem-pensantes”, muitas foram aqueles  que puderam testemunhar este verdadeiro atentado contra a liberdade de expressão.


Gustave Flaubert

Esta “caça às bruxas” deu lugar à censura que ainda hoje sofremos, de uma maneira tácita ou não, e muitos livros viram-se retirados das prateleiras das livrarias ou mesmo impedidos de lá chegar por razões, por vezes, demasiado obscuras.


Stendhal (Henri Beyle)

Desde tempos bastante recuados que a Igreja achou que se devia pronunciar sobre o conteúdo dos livros e do direito para a sua publicação, tentando obviamente impedir o aparecimento de livros indesejáveis.

Para isso criou em 1559 o Index Librorum Prohibitorum (que coligindo títulos até 1966).


Giordano Bruno
(Gravura de C. Meyer de Paris sec. XIX)

Como já referi muitos foram os autores vetados. Perdurará na memória colectiva Giordano Bruno (que foi queimado vivo) e claro Charles Darwin, pois que também não poderia escapar à inclusão na famigerada lista por causa das suas ideias heréticas da teoria da evolução.


Charles Darwin

Este intróito vem a propósito de uma escolha curiosa de Libros censurados: la lista negra de la literatura em diversas partes do mundo e épocas, que a IberLibro  propõe no seu site.

Muitos de nós ficarão surpresos com as obras que vamos encontrar, pois muitos autores, cujos livros circulam hoje de uma maneira perfeitamente “inocente”, foram vítimas do escândalo e da reprovação.


Ray Bradbury – Fahrenheit 451
(Capa da 1ª edição)

Refira-se que Ray Bradbury, ao escrever Fahrenheit 451, uma história contra a censura, onde os bombeiros tinham a obrigação de queimar os livros e como se tentava iludir essa mesma perseguição, também seria vítima desta mesma censura... foi vetado!


IberLibro

Proponho a leitura desta lista da IberLibro, pois nunca é demais recordar o lado negro da cultura, seja ela ideológica, religiosa ou simplesmente “para defesa da boa moral”, que muitos de nós já sentimos enquanto cidadãos nos seus países.

Boa leitura e que o vosso fim de semana seja tão livre quanto gostaríamos que a liberdade de expressão continue a ser


Saudações bibliófilas.

sábado, 17 de julho de 2010

Livraria Antiquária do Calhariz – 8º Boletim Bibliográfico




8º Boletim Bibliográfico

Em continuação da divulgação dos lançamentos de catálogos de livrarias-antiquárias deixo hoje aqui a notícia do lançamento do “8º Boletim Bibliográfico” da Livraria Antiquária do Calhariz.


8º Boletim Bibliográfico
Página 3

Como não tem página na Internet, sugiro que os mais interessados solicitem para esta vos enviar o Catálogo on-line, pelo que aqui fica o respectivo contacto: livraria.antiquariacalhariz@gmail.com.


8º Boletim Bibliográfico
Página 12

Do seu conteúdo destaco as seguinte temáticas:

Alvarás;
Literatura;
(com algumas obras interessantes de Camilo Castelo Branco, Eugénio de Castro, Natália Correia, José Gomes Ferreira, Herberto Helder, David Mourão Ferreira e Teixeira de Pascoaes entre outros )
Fotografia e Cinema;
Manuscritos; e
Mapas;.


8º Boletim Bibliográfico
Página 45

Lembro que podem consultar uma grande selecção dos livros desta Livraria na sua página de Internet: www.iberlibro.com/librerias/ANTIQUARIACALHARIZ.

Espero que vos tenha despertado o interesse para a consulta mais detalhada deste Catálogo.

Permito-me chamar a vossa atenção, para os menos conhecedores claro, que esta Livraria tem habitualmente um bom acervo em livro antigo, pois é a área para que está mais vocacionada.

Saudações bibliófilas.

Livraria Castro e Silva – Catálogo n.º 123



 

Como nem só de literatura brasileira se mantém um Blog; claro que português, pois se este fosse brasileiro, muito trabalho haveria para se fazer, apesar de neste campo já existirem algumas referências importantes.

Vem isto a propósito de algumas notícias do que de bom se vai fazendo, em termos de bibliofilia, “nesta lado do oceano”, e das quais quero deixar aqui o meu contributo para a sua divulgação.

Para começar, quero dar notícia do “Catálogo n.º 123” da Livraria Castro e Silva, ainda que com algum atraso.



Reunindo obras de temáticas que podem despertar o interesse de alguns bibliófilos no seu início; é, no entanto, sempre com alguma expectativa que aguardamos pelo seu “Suplemento” onde aparecem as obras que são efectivamente mais apelativas ... claro que aqui os preços também são de uma outra dimensão (a sua justificação caberá sempre aos mais entendidos...)



163. KIDDER (D. P.) e Fletcher (J. C.) BRAZIL AND THE BRAZILIANS, portrayed in historical and descriptive sketches. By Rev. D. P. Kidder, D. D., and Rev. J. C. Fletcher. Illustrated by one hundred and fifty engravings. [Stereotyped by L. Johnson & Co. Printed by Deacon & Peterson]. Philadelphia: Childs & Peterson. [Pennsylvania]. 1857. De 23x16 cm. Com 630 pags. Encadernação do editor em percalina castanha gravada a seco com as armas do Império Brasileiro. Obra profusamente ilustrada no texto e em extra texto com acabamentos coloridos sobre papel couché protegidos por folhas de papel vegetal. Contém mapa desdobrável do Brazil e um retrato de meio corpo do Imperador D. Pedro II, aos 31 anos de idade, em anterrosto (Litografia de R. Whitechurch).Pedro II governou desde 1840 - quando foi antecipada sua maioridade - até ao ano de1889, em que foi deposto com a proclamação da República Brasileira. Entretanto a escravatura tinha sido abolida no Brasil em 1888. Obra de referência na abordagem da sociedade brasileira na transição da escravatura para o abolicionismo, com importantes comentários contemporâneos sobre este tema (Cap. VIII).
Mas vejamos estes dois exemplos do referido “Suplemento”. Claro que são os espécimes mais cotados deste Catálogo, mas convenhamos que são exemplares preciosos e, sobretudo o lote 358, uma das obras de prestigio da nossa actividade impressora no séc. XVIII.



358. ANDRADE. (Carlos Manuel de) LUZ DA LIBERAL, E NOBRE ARTE DA CAVALLARIA, OFFERECIDA AO SENHOR D. JOÃO PRINCIPE DO BRAZIL, POR CARLOS MANUEL DE ANDRADE, Picador da Picaria Real de Sua Magestade Fidelíssima. LISBOA, NA REGIA OFFICINA TYPOGRAFICA. ANNO M. DCC. XC. (1790) In fólio de 33,5x23 cm. Com xxvi-(i) em branco-454-(i) de erratas.



Encadernação da época inteira de pele com ferros a ouro e nervos na lombada. Ilustrado com o retrato de D. João VI em anterrosto, 2 vinhetas e 93 gravuras extra texto, algumas desdobráveis, tudo magnificamente desenhado por Carneiro da Silva e gravado por Frois. Obra máxima da tipografia portuguesa do século dezoito, famosa e valiosa internacionalmente, praticamente única no seu género entre nós e possivelmente o melhor tratado equestre da sua época a nível mundial. Exemplar em perfeito estado de conservação, na impressão desta obra muito nítida foi utilizado papel de grande qualidade. Tiram-se 1000 exemplares infelizmente muitos foram desfeitos para se emoldurarem as gravuras que são de rara beleza.



Inocêncio V, 386. “MANUEL CARLOS DE ANDRADE, Picador da Picaria Real de Sua Magestade Fidelissima. Da sua naturalidade, nascimento, obito e mais circumstancias não me foi até agora possivel colher alguma noticia, posto que empregasse a esse intento as diligencias que estavam ao meu alcance. Luz da liberal e nobre arte da cavallaria; offerecida ao sr. D. João principe do Brasil. Parte primeira. Lisboa, na Reg. Offic. Typ. 1790. Fol. maior, de XXVI 454 pag., e mais uma no fim, contendo a errata: illustrada com 93 estampas, e um retrato do principe, delineados pelo habil artista portuguez Joaquim Carneiro da Silva, de quem já fiz menção no Diccionario em logar competente. Posto que no frontispicio se lêa a designação de Parte 1.ª, nem por isso a obra deixa de achar se completa, comprehendendo este volume tambem a Parte 2.ª Esta edicão, que póde equiparar se em nitidez e perfeição typographica ás producções do celebre Ibarra, foi mandada executar por ordem da rainha a senhora D. Maria I; sendo a tiragem de mil exemplares, dos quaes se entregaram oitocentos ao auctor, ficando duzentos para serem na officina expostos á venda: e ainda na Imprensa Nacional existe ao presente o resto d'esses exemplares, cujo preço antigo que era de 9:600 réis, foi ha poucos annos reduzido a 7:200 réis. Custou a gravura das chapas, vinhetas e letras iniciaes 4:200$000 réis, e a despeza total da impressão foi de 6:588$000 réis. Alguns pretenderam, não sei se com legitimo fundamento, que o verdadeiro auctor d'esta Arte da Cavallaria fôra o marquez de Marialva D. Pedro de Alcantara de Menezes Coutinho, estribeiro mór da Casa Real; e que Manuel Carlos de Andrade não tivera n'ella mais parte que a de collocar o seu nome no frontispicio, porque assim fôra a vontade do marquez. Um dos que ainda ha pouco inculcou esta opinião por verdadeira foi o sr. João Carlos Feo, em uma carta, ou artigo que sahiu inserto no Jornal do Commercio de 28 de Septembro de 1859.”



365. BLUTEAU. (Raphael) VOCABULARIO PORTUGUEZ E LATINO, AULICO, ANATOMICO, ARCHITECTONICO, BELLICO, BOTANICO, Brasilico, Comico, Critico, Dogmatico, Dialectico, Dendrologico, Ecclesiastico, Etymologico, Economico, Florifero, Forense, Fructifero, Geographico, Geometrico, Gnomonico, Hydrographico, Homonymico, Hierologico, Ichtyologico, Indico Isagogico, Laconico, Liturgico, Lithologico, Medico, Musico, Meteorologico, Nautico, Numerico, Neoterico, Ortographico, Optico, Ornithologico, Poetico, Philologico, Pharmaceutico, Quidditativo, Qualitativo, Quantitativo, Syllabico, Theologico, Terapeutico, Technologico, Uranologico, Xenophonico, Zoologico, AUTORIZADO COM EXEMPLOS DOS MELHORES ESCRITORES PORTUGUEZES, E LATINOS; PELO PADRE D. RAPHAEL BLUTEAU CLERIGO REGULAR, DOUTOR NA SAGRADA Theologia, Prêgador da Raynha de Inglaterra, Henriqueta Maria de França, & Calificador no Sagrado Tribunal da Inquisiçaõ de Lisboa. COIMBRA No Collegio das Artes da Companhia de JESU Anno de 1712 - [1728] – [no final do 8.º volume vem encadernado junto, mas com rosto e paginação próprios:] - DICCIONARIO CASTELLANO, Y PORTUGUEZ PARA FACILITAR A LOS CURIOSOS la noticia de la lengua Latina, com el uso del Vocabulario Portuguez, y Latino, IMPRESSO EN LISBOA Por orden delRey de Portugal D. JUAN V. PRECEDE A DICHO DICCIONARIO, un discurso intitulado, Prosopopeia del idioma Portuguez, a su hermana la Lingua Castellana; Y a este discurso se sigue una tabla de Palabras Portuguezas, mas remotas del idioma Castellano. AUTHOR D. RAPHAEL BLUTEAU. LISBOA OCCIDENTAL, Imprenta de PASCOAL DA SYLVA. M. DCCXXI. (1721) [os volumes 9º e 10º são o suplemento ao Vocabulário Português e Latino] In fólio de 28,5x20 cm. 10 volumes com (cxvi)-698 [aliás 666], (ii)-216-654 [aliás 648], (xii)-319-407, (xii)-243-164-91-237, (xxviii)-778, (viii)-839, (iv)-824, (xii)-652-(iv), 189, (cxxxii)-568 e (iv)-325-(vi)-592 pags.



Encadernações da época inteiras de pele com nervos e ferros a ouro nas lombadas. A encadernação do 10º volume, é ligeiramente diferente. As folhas de rostos são impressas a duas cores com excepção do Dicionário Castelhano e Latino, que é a negro. Obra impressa até ao 4º volume no Colégio das Artes da Companhia de Jesus, sendo os seguintes, até ao 8º da Oficina de Pascoal da Silva, incluindo o Dicionário Castelhano e Português. Os 2 volumes do Suplemento ao Vocabulário Português e Latino impressos foram impressos na Oficina de José António da Silva. Magnifico exemplar. Obra-prima da língua e cultura portuguesa, monumental repositório filológico, nunca foi reeditada. Brunet 1, 367. Azevedo Samodães 1, 427. Inocêncio VII, 42. “D. RAPHAEL BLUTEAU, Clerigo regular Theatino, excluido por Barbosa da Bibl. Lus. em sua qualidade de estrangeiro. - N. em Londres, a 4 de Dezembro do 1638, de paes francezes. Aos seis annos de edade, no de 1644 sahiu de Inglaterra para França, na companhia de sua mãe, fugindo ás turbações e alvorotos que assolaram aquelle reino depois da tragica morte de Carlos I. Começando a desenvolver se n'elle o talento e paixão pelos estudos, juntamente com o desejo de seguir a vida religiosa, depois de cursar humanidades em París, e doutorar se em Roma nas sciencias theologicas, vestiu a roupeta de clerigo regular em 29 de Agosto de 1661. Tinha já adquirido boa nomeada em França como prégador, quando por obediencia ao Geral da ordem veiu em 1668 para Portugal, onde a sua religião dera entrada quinze ou vinte annos antes. Aprendendo em breve tempo a lingua portugueza, começou em Lisboa a distinguir se na predica, grangeando applausos e credito na côrte, e a especial protecção da rainha D. Maria Francisca de Saboya, mulher dos reis D. Affonso VI e D. Pedro II. Em 1680 passou de Lisboa á côrte de Turim na companhia do doutor Duarte Ribeiro de Macedo, encarregado de tractar o casamento da princeza herdeira D. Isabel com Victor Amadêo, duque de Saboya; e falecendo o enviado durante a viagem, o P. Bluteau o substituiu na sua missão, até chegar de Lisboa novo ministro para concluir as negociações, que a final se mallograram. Como partidista e affeiçoado da rainha, soffreu por morte d'esta alguns dissabores, que o levaram a retirar se para França, e ahi se conservou por alguns annos, até regressar a Portugal em 1704. Foi d'esta vez menos bem acolhido do que talvez esperava, pois tornando se suspeito ao governo, em razão da guerra declarada a esse tempo entre as duas corôas, recebeu ordem para recolher se ao mosteiro de Alcobaça, onde poz a ultima lima ao seu Vocabulario, e a outras obras emprehendidas com louvavel dedicação em beneficio das letras portuguezas. Obteve em fim a permissão de vir para Lisboa em 1713, quando concluida a paz geral. D'então em diante mereceu particular favor e acceitação a el rei D. JoãoV, que entre outras provas da estima em que o tinha, ordenou que á custa da fazenda real fossem estampadas todas as suas obras, e o nomeou Academico do numero da Academia Real da Historia, quando em 1720 erigiu esta corporação. O P. Bluteau era já por esse tempo membro da Academia dos Generosos, da dos Applicados, das Conferencias eruditas celebradas em casa do Conde da Ericeira, etc., etc. Foi tambem durante alguns annos Preposito da casa de S. Caetano, a qual segundo dizem governou com grande prudencia e acerto. Respeitado geralmente dos homens mais doutos e instruidos do seu tempo, que o veneravam como mestre e estimavam como amigo, passou descansadamente os ultimos annos de sua longa vida, até falecer a 14 de Fevereiro de 1734, contando mais de 95 de edade, dos quaes viveu seis em Inglaterra, cinco em Italia, em França vinte e oito, e cincoenta e seis em Portugal. Ha na Bibl. Publica de Lisboa dous retratos seus de meio corpo, e outro egual, e tambem pintado a oleo na sala da contadoria da Imprensa Nacional. Para a sua biographia vej. as Memorias hist. e chronolog. dos Clerigos regulares, por D. Thomás Caetano de Bem, no tomo I, pag. 283 a 317; o Obsequio funebre pela Academia dos Applicados (Diccionario, tomo VI, n.º O, 2); o Elogio funebre pelo Conde da Ericeira (idem, tomo III, n.º F, 1991); e mais resumidamente Canaes, nos Estudos biographicos, pag. 289. Foi o P. Bluteau homem verdadeiramente sabio e erudito á moda do seu tempo: mais ou menos versado em todo o genero de estudos, mereceu lhe particular predilecção o das linguas mortas e vivas. Falava expedita e desembaraçadamente a ingleza, franceza, italiana, portugueza, castelhana, latina e grega; e em qualquer d'ellas compunha com grande facilidade, tendo aprofundado o conhecimento das grammaticas de todas. Os portuguezes lhe devem eterna gratidão, por lhes dar um Diccionario que não tinham, e de que tanto necessitavam; abalaçando se e conseguindo elle só com o proprio esforço e estudo, o que as Academias não puderam vencer antes, nem depois!”

Espero que tenham apreciado a consulta deste Catálogo e que, se não pensarem em adquirir nenhum exemplar, pelo menos que os vossos conhecimentos tenham ficado mais enriquecidos.

Saudações bibliófilas

segunda-feira, 12 de julho de 2010

José Olympio – uma visão sobre o editor




Editora José Olympio na Rua do Ouvidor 110

Proponho hoje a visualização deste vídeo da “Globo News”: “Poeta Lêdo Ivo e autor da biografia falam sobre José Olympio” publicado em 14/05/2010 no programa – “Espaço Aberto Literatura”.

Durante mais de 60 anos José Olympio reuniu na sua editora grandes nomes da intelectualidade brasileira não assumindo qualquer atitude sectária, pois publicava tanto obras de escritores comunista como de integralistas.


José Mário Pereira (org.) – José Olympio: O editor e sua Casa.
Rio de Janeiro, Sextante, 2008, 424 pp.

É em torno desta actividade editorial que José Mário Pereira, o autor da biografia de José Olympio (1), que conversa com o poeta Lêdo Ivo, e nos desvenda mais um pouco da sua actividade como editor e da importância da sua Livraria Editora..

Um documento a ver com atenção.


Saudações bibliófilas


(1) «José Olympio: o editor e sua Casa» é o primeiro grande inventário da produção da editora criada em 1931 por José Olympio Pereira Filho (1902-1990). Organizado por José Mário Pereira, o livro tem edição a cargo da Sextante, fundada por Geraldo Jordão Pereira (1938-2008), filho de José Olympio, e dirigida por Marcos e Tomás Pereira, netos do editor. Um dos méritos do livro, favorecido por seu formato gráfico, é lançar luz sobre o elenco de expoentes das artes plásticas brasileiras do século XX que imprimiram sua marca à editora tanto quanto os escritores, que constituíam então um grupo de excelência da poesia, da ficção e do ensaio.

Encontram-se aqui reproduzidas 530 capas, quartas capas e folhas de rosto criadas por nomes como Tomás Santa Rosa, Portinari, Cícero Dias, Oswaldo Goeldi, Luís Jardim e Poty Lazzarotto para obras de José Lins do Rego, Graciliano Ramos, Gilberto Freyre, Rachel de Queiroz, Guimarães Rosa.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

José Lins do Rego – Obras: uma descrição bibliográfica e bibliófila.




Engenho de açúcar – gravura de Rugendas

Os romances de José Lins do Rego são agrupados em três temáticas diferentes:

Ciclo da cana-de-açúcar:

José Lins escreveu cinco livros a que nomeou "Ciclo da cana-de-açúcar", numa referência ao papel que nele ocupa a decadência do engenho açucareiro nordestino, visto de modo cada vez menos nostálgico e mais realista pelo autor: Menino de Engenho (1932), Doidinho (1933), Bangüê (1934), O Moleque Ricardo (1935), e Usina (1936). Aos quais acrescentaria Fogo morto (1943).


A cana-de-açúcar

Ciclo do misticismo e do cangaço reúne duas obras: Pedra Bonita (1938) e Cangaceiros (1953).

Não se enquadrando em qualquer destas temáticas temos: Pureza (1937); Riacho doce (1939) e Eurídice (1947).

Otto Maria Carpeaux fez uma súmula de sua obra: “A obra de José Lins do Rego é profundamente triste. É uma epopéia da tristeza, da tristeza da sua terra e da sua gente, da tristeza do Brasil (...) Há na sua obra a consciência de que tudo está condenado a adoecer, a morrer, a apodrecer. Há a certeza da decadência dos seus engenhos e dos seus avós, de toda essa gente que produziu, como último produto, o homem engraçado e triste que lhe erigiu o monumento. É grande literatura.”


Engenho de açúcar – O trabalho no engenho

Na obra de José Lins do Rego, a parte mais importante é a que corresponde ao chamado ciclo da cana-de-açúcar. Partindo de experiências autobiográficas – a vida no engenho do avô – o escritor encontra na memória o fundamento de seus romances, nos quais fixa melancolicamente a decadência do engenho-de-açúcar, substituído como modo de produção pela fábrica. Participante, ou pelo menos observador, deste processo, José Lins do Rego esforça-se para registrar a verdadeira revolução social desencadeada pela nova tecnologia de produção açucareira que, em pouco tempo, levou um grande número de senhores de engenho a mais completa bancarrota económica.

Pesou também sobre Lins do Rego, a influência de Gilberto Freyre, cujo “Manifesto regionalista”, de 1926, propugnava por uma arte voltada para as questões específicas da sociedade nordestina. No prefácio de Usina, o próprio José Lins do Rego delimitou o ciclo da cana-de-açúcar:
“A história desses livros é bem simples: comecei querendo apenas escrever umas memórias que fossem as de todos os meninos criados nas casas-grandes dos engenhos nordestinos. Seria apenas um pedaço da vida o que eu queria contar. Sucede, porém, que um romancista é muitas vezes o instrumento apenas de forças que se acham escondidas no seu interior.”


 Engenho de açúcar e casa do proprietário – o “coronel”

Depois de Menino de Engenho, veio Doidinho e em seguida Bangüê. Carlos de Melo havia crescido, sofrido e fracassado. Mas, o mundo do Santa Rosa não era só Carlos de Melo. Ao lado dos meninos de engenho havia os que nem o nome de menino podiam usar, os chamados “moleques de bagaceira”, os Ricardos.

Ricardo foi viver por fora do Santa Rosa, a sua história que é tão triste quanto a de seu companheiro Carlos. Foi ele de Recife a Fernando de Noronha. Muita gente achou-o parecido com Carlos de Melo. Até podia ser que se parecessem, pois viveram tão juntos um do outro, foram íntimos na infância, tão apegados, que não seria de espantar que Ricardo e Carlinhos se assemelhassem, muito pelo contrário.

Depois de Moleque Ricardo veio Usina, a história do Santa Rosa, arrancado de suas bases, espatifado, com moendas gigantes devorando a cana madura que as suas terras fizeram acamar pelas várzeas. Carlos de Melo, Ricardo e o Santa Rosa acabaram-se, têm o mesmo destino, estão intimamente ligados pois a vida de um tem muito da vida do outro. Uma grande melancolia acaba por os envolver de sombras. Carlos foge, Ricardo morre pelos seus e o Santa Rosa perde até o nome ... escraviza-se.


Trabalho num engenho de açúcar no Brasil colonial


Principais obras:

Menino de Engenho (1932)
Doidinho (1933)
Bangüê (1934)
O Moleque Ricardo (1935)
Usina (1936)
Pureza (1937)
Pedra Bonita (1938)
Riacho Doce (1939)
Água-mãe (1941)
Fogo Morto (1943)
Eurídice (1947)
Cangaceiros (1953)
Meus Verdes Anos (1953)
Histórias da Velha Totonia (1936)
Gordos e Magros (1942)
Poesia e Vida (1945)
Homens, Seres e Coisas (1952)
A Casa e o Homem (1954)
Presença do Nordeste na Literatura Brasileira (1957)
O Vulcão e a Fonte (1958)
Dias Idos e Vividos (1981)


Descrição das obras (1)



José Lins do Rego – “O Menino do Engenho”. Romance.
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, s.d.(1932). 2ª edição. Capa de Cicero Dias.. Encadernação original brochura. 199 págs. (R$ 100,00)
Tiragem: 2.000 exemplares (1ª edição) e 5.000 (2ª edição).
(nenhum exemplar da 1ª edição encontrado em venda)

Prémio da Fundação Graça Aranha (1932).

Narrado em 1ª pessoa por Carlos Melo (personagem), que aponta as suas tensões sociais envolvidas num ambiente de tristeza e decadência, é o primeiro livro do ciclo da cana-de-açúcar. Publicado em 1932, Menino do Engenho é a estreia em romance de José Lins do Rego e já traz os valores que o consagraram na Literatura Brasileira.

É a história típica, natural e sem retoques de uma criança, Carlos, órfão de pai e mãe, que, aos oito anos de idade, vem viver com o avô, o maior proprietário de terras da região - coronel José Paulino.

Carlos é criado sem a repressão familiar e mesmo sem os cuidados e atenções que lhe seriam necessários diante das experiências da vida. Vê o mundo, aprende o bem e o mal e chega a uma provável precocidade acerca dos hábitos que lhe eram "proibidos", mas inevitáveis de serem adquiridos.

Pela ausência de orientação, toma-se viciado, corrompido, aos 12 anos de idade. Além dos problemas íntimos do menino, desorientado para a vida e para o sexo, temos a análise do mundo em que vivia, visto por Carlos, que é o narrador-personagem.

Carlos vê o avô como um verdadeiro Deus, uma figura de grandiosidade inatingível. O engenho é o mundo, um império, de onde o coronel José Paulino dirige e guia os destinos de todos. E, em consequência, Carlos considera-se, e é considerado pelos servos, escravos e agregados, o “coronelzinho” cujas vontades têm que ser rigorosamente realizadas.

Descreve com emoção a vida dos escravos, a senzala, o sofrimento e os castigos do “tronco”. Uma cena a ser destacada é a “enchente” do rio, vista com admiração e susto por Carlos, constituindo uma descrição de grandiosidade bíblica.

Também vêm à tona as superstições e crendices comuns entre as camadas populares, como a do “lobisomem”.

O romance tem como cenário a região limítrofe entre Pernambuco e Paraíba, o que pode ser deduzido pelas descrições da paisagem e da vida dos engenhos de açúcar.

Os bandidos e cangaceiros, comuns na região, são mostrados como única forma de reacção social de um povo oprimido.



José Lins do Rego – “Doidinho”. Romance.
Rio de Janeiro, Ariel Editora, Ltda, s.d. (1933). 1ª edição. Capa de Santa Rosa. Encadernação original brochura. 326 pp. (R$ 250,00 / 420,00)
Tiragem: 2.000 exemplares (1ª edição)

Doidinho, romance de José Lins do Rego lançado em 1933, é uma espécie de continuação do clássico “Menino de Engenho”, publicado um ano antes. O título é o apelido de Carlos Melo, ou Carlinhos, um garoto de 12 anos que narra suas experiências como aluno de um rigoroso internato e cujo grande sonho é retornar ao velho engenho de seu avô. Lá, ele faz inúmeras descobertas sobre a vida, discutindo e debatendo temas tais como a lealdade, a amizade, a traição, intriga, sexo, injustiças e muito mais, sempre sob o olhar atento do director, sempre pronto a impingir castigos físicos.

Nas palavras de Antonio Carlos Villaça, é a segunda parte de Menino de Engenho, mas com uma densidade ficcional que revela as dimensões poderosas de Lins do Rego como romancista e como criador.



José Lins do Rego – “Banguê”. Romance.
“Ciclo da Cana do Assucar III”
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1934. 1ª edição. 310 pp. (R$ 50,00 / 110,00)
Tiragem: 10.000 exemplares (1ª edição)



Nesta obra de transição o autor procura retratar a paisagem local, superando o predomínio da memória.



José Lins do Rego – “O Moleque Ricardo”. Romance.
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1935. 1ª edição. Encadernação original brochura.. 285 pp. (R$ 50,00)
Tiragem: 4.000 exemplares (1ª edição) e 2.000 (2ª edição).

O Moleque Ricardo faz parte das chamadas obras independentes do autor, juntamente com Pureza e Riacho Doce, segundo certos analistas, pois que apresenta traços de ligação com os dois ciclos: o da cana-de-açúcar e o do cangaço.

Mas deve ser considerada, até pela sua sequência de personagens com fazendo parte do ciclo de cana-de-açúcar.

O Moleque Ricardo é o romance mais político de José Lins. Nesta obra, a realidade nordestina está retratada no personagem Ricardo, que, de moleque e serviçal de engenho, passa a proletário urbano. É o romance satélite do ciclo da cana-de-açúcar. Sob o ponto de vista cronológico, fica entre Banguê e Usina. É a história de um daqueles moleques de eito, aparecidos em Menino de Engenho, e que se destaca dos companheiros, abandona Santa Rosa e vai para a cidade com a intenção de mudar de vida.

O romance demonstra o temor dos regionalistas com as novas práticas e o estilo de vida trazido pelas espaços modernos. Assim, analisando a obra, podemos perceber como a construção histórica do nordestino também possui suas descaracterizações, presente nas cidades (modelos de decadência dos costumes "tradicionais"), com práticas consideras desvirilizantes.




José Lins do Rego – “Usina”. Romance.“Ciclo da Cana do Assucar V”
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1936. 1ª edição. Encadernação original brochura. 392 pp. (R$ 100,00 / 120,00)
Tiragem: 5.000 exemplares (1ª edição)

Usina é uma narrativa descritiva do meio de vida nos engenhos de açúcar e nas plantações de cana do Nordeste. Em 1936, após a publicação dessa obra, José Lins do Rego decretou o fim do "ciclo da cana-de-açúcar".

Usina retoma a história do Moleque Ricardo, a partir de sua prisão com os companheiros grevistas em Fernando de Noronha até o seu retorno ao engenho.

Com pouco mais de estariam no velho Santa Rosa, que Ricardo deixara há oito anos, fugido, como de um presídio, de uma ilha de trabalhos forçados. escapara de lá para não ser alugado e fora pior que isso. Tivera dores que os alugados não sofriam nunca.

É na segunda parte do livro que começa propriamente Usina, quando são narrados os acontecimentos que envolvem o Santa Rosa depois que Carlos Melo, fugindo dos problemas que envolviam o engenho, entrega o seu património a parentes.

O Santa Rosa transforma-se na Usina Bom Jesus. O Dr. Juca sonha com o prestígio, negociando com Zé Marreira, proprietário da Fazenda São Félix, deixa-se levar pela ambição e faz a sua primeira operação desastrosa. As hipotecas contraídas e a pressão da Usina São Félix, na figura do Dr. Luís, terminam por forçar a venda. A enchente do Rio Paraíba, destruindo a antiga propriedade, simboliza o fim de um ciclo. O usineiro retira-se com a família em meio à destruição física dos seus antigos domínios.


José Lins do Rego – Histórias da Velha Totonia.
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1936. 1ª edição
(nenhum exemplar encontrado)
Tiragem: 5.200 exemplares (1ª edição)

Trata-se de um livro de literatura infanto-juvenil e, como tal, sempre difícil de ser encontrado, pelo seu uso e, como tal, poucos exemplares se preservavam.



José Lins do Rego – “Pureza”. Romance.
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1937. 1ª edição. 1ª edição. Encadernação original brochura. 347 pp.. (R$ 65,00/150,00)
Tiragem: 5.200 exemplares (1ª edição)

Pureza foi um livro que surpreendeu ao surgir em 1937. Poderia José Lins do Rego renovar-se, depois da série de cinco romances então denominados de Ciclo da cana-de-açúcar? Pôde. Mudou a paisagem física. Saiu em busca de outros mundos, inclusive interiores. Porque Pureza é uma narrativa mais interiorizada. O autor traça bem o personagem central, Lourenço de Melo, inseguro em seu amor pela bela Margarida, e de olhos de uma claridade de porcelana, filha de seu Antônio, o chefe da estação de trem.



José Lins do Rego – “Pedra Bonita”. Romance.
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1938. 1ª edição. Capa de Santa Rosa. Encadernação original brochura. 373 pp. (R$ 100,00/145,00)
Tiragem: 5.200 exemplares (1ª edição)



É um enredo que não saindo da temática principal – fanatismo religioso e cangaceiros – podemos ver uma galeria de personagens e histórias paralelas que nos prendem a atenção de tão bem descrita e interligada. A obra é tão valiosa que até os personagens secundários aparecem, psicologicamente, bem desenvolvidos e trabalhados.
 
Padre Amâncio que foi jovem para Açu, com sonhos de tudo mudar, é o personagem central que dava lugar, algumas vezes à Antônio Bento Vieira, ajudante do padre que a mãe deixou para que o mesmo se fizesse padre também, mas que não houve dinheiro para que tal se concretizasse. Aliás, quem tinha dinheiro em Açu era só Clarimundo, além do comércio, o algodão também lhe dava lucros.

O Major Evangelista, um fiscal que perdeu a esposa e vivia com a sua filha Dona Fausta, uma personagem psicológica de solteirona, que vivia de fazer bordados para fora de Açu e que tinha ataques por falta de sexo/homem. Há também uma descrição sexual, bem atrevida para a época. quando Dona Fausta passa a sonhar e a desejar Antônio Bento, cena em que ela o pega de jeito, mas que não se repete. Aliás Bentinho não era de mulheres, nem o seu irmão Domício.

Açu conhecia a maldição de Pedra Bonita, uma cidade onde homens milagrosos queriam ser como Jesus e Padre Cícero, que levavam o povo às alucinações e fanatismo, a ponto de largar tudo na vida e ir para lá. Cidade com duas pedras enormes como se fossem duas torres de igreja. Açu rejeitava todos os moradores de Pedra Bonita.

A temática sacra é sem dúvida uma das principais, com referência ao fanatismo das religiões incluindo o catolicismo: Ainda que exalte o Padre Cícero por enfrentar bispos e continuar a realizar os seus milagres, exalta também, a figura do padre comum, mas santo, que vive para os pobres, sem vaidade e sem ambição.

Açu era o lugarejo onde despejavam o que se dizia ser o lixo da sociedade. Ali, nem o caminho de ferro conseguiu chegar, pois no dia em que os engenheiros ali apareceram foram destroçados pelo chefe dos cangaceiros, irmão de Bentinho – Aparício.

Pedra Bonita do Araticum com sua lenda da mulher linda que chama os homens para o abismo, também era a pedra dos milagres e dos fanáticos que matavam. Num todo, o romance é a descrição de um mundo rural Nordestino, onde cidades são esquecidas pelo Governo, um mundo de contínua fuga voltando sempre para suas raízes: a religião.

Num discurso indirecto são muitas e muitas cenas diferentes e tantos personagens que não se pode de todos falar.

No sertão são três as vozes de comando, o padre, os cangaceiros e o governo quando sente necessidade de intervir, no mais é uma injustiça sem fim e um morrer sem pedir.

A repetição de cenas descritas é um recurso relevante do autor para que o leitor não se perca e o narrador omnisciente fala por todos e a moda viola, os repentes, as canções que narram as histórias tristes do cangaço, são os atavios que dão ao romance o uso da meta-linguagem com uma grande riqueza descritiva.



José Lins do Rego – “Riacho Doce”. Romance.
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1939. 1ª edição. Capa de Santa Rosa. Encadernação original brochura. 372 pp. (R$ 100,00/145,00)
Tiragem especial, fora do comércio, de 10 exemplares em papel Royal E. F., numerados e assinados pelo autor.

Riacho Doce não repete nenhuma das obras anteriores do seu autor, mas mantém todas as características do escritor com a sua linguagem saborosa e colorida no seu estilo de possante contador de estórias; o documentador profundo e essencial da civilização e da mentalidade nordestina; o mais fecundo inventor de casos e de almas.

O estilo de José Lins do Rego neste romance é uma manifestação soberba de naturalidade e de intimidade com a natureza ou integração na própria natureza exterior. E há que se salientar o processo de análise psicológica, que consiste na repetição sistemática de certos dados. A figura da Mãe Aninha é perfeita como observação da psicologia supersticiosa. Esta e Nô saltam diante dos nossos olhos como criações exactas, inesquecíveis.

Há aqui um fundo lirismo tropical, um instintivismo, um calor humano, um sopro de poesia genuína que faz deste romance de 1939 uma afirmação plena de maturidade artística.

Em Riacho Doce, José Lins une amor e petróleo. Um casal de suecos vem para o Brasil, para Alagoas, e a loura Edna/Eduarda se extasia com a força tropical do Brasil, que ela descobre. Apaixona-se por um mestiço nordestino, Nô, uma das figuras mais empolgantes de toda a ficção de Lins do Rego. O amor de Edna e Nô é o núcleo deste romance. A sueca misteriosa vem descobrir sensualmente a força telúrica do Nordeste rústico, o ritmo popular, os sabores e os cheiros, as formas, as cores, a vida intensa de uma região que é o mundo perene desse grande narrador em contacto amoroso com a vida.

José Lins do Rego dá-nos nesta obra a sua visão possante dos desequilíbrios sociais e dos dramas humanos individuais e colectivos, provocados pelo problema do petróleo em Alagoas. Tudo decorre deste trágico problema da vida contemporânea no Brasil dessa época.. As marés sucessivas de entusiasmo, de desapego às tradições, provocadas pelo engodo da riqueza, e das desconfianças supersticiosas e as cóleras nascidas das desilusões naquela mansa terra de pescadores, são descrições de psicologia colectiva das mais vivas e reais que o romancista fez.

E páginas como a descrição dos primeiros tempos de Edna no Riacho Doce ou capítulos como o do estouro da Mãe Aninha, em que a maldição é criada com uma intensidade trágica maravilhosa, são verdadeiramente trechos geniais.


José Lins do Rego – “Água Mãe”. Romance.
Rio de Janeiro, Organização Simões, 1941. 1ª edição. Introdução de Álvaro Lins e Roberto Alvim Corrêa, com ilustrações em preto e branco de Luis Jardim. 345 pp. (R$ 90,00/100,00)

Prémio Felipe d’Oliveira (1941).

Este é o primeiro romance de José Lins do Rego, que não tem como cenário o Nordeste, e sim Cabo Frio, no Rio de Janeiro. Apresenta a história de três famílias, que seriam a representação de três camadas sociais diferentes: a família rica, a família média e a família pobre e de criaturas que desejam fugir das suas condições naturais, que procuram desligar-se dos seus círculos sociais.



José Lins do Rego – “Fogo Morto”. Romance.
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1943. 1ª edição. Prefácio de Otto Maria Carpeaux. 363 pp. (R$ 90,00 / 250,00)

Como romance de feição realista, esse livro procura penetrar a superfície das coisas e revelar o processo de mudanças sociais por que passa o Nordeste brasileiro, num largo período que vai desde o Segundo Reinado, incluindo a Revolução Praieira e a Abolição, até as primeiras décadas do século XX.

O tema central de Fogo Morto é o desajuste das pessoas com a realidade resultante do declínio do esclavagismo nos engenhos nordestinos, nas primeiras décadas do século XX. O romance conta a história de um poderoso engenho – Engenho Santa Fé localizado na zona da Mata da Paraíba – desde a sua fundação até o declínio, quando se transforma em "fogo morto", expressão com que, no Nordeste, se designam os engenhos inactivos.

É considerado a obra-prima de José Lins do Rego.


José Lins do Rego – “Pedro Américo”. Conferências.
Rio de Janeiro, CEB – Livraria Editora da Casa do Estudante do Brasil, 1943. Coleção Conferências – Série Maná . 1ª edição.
(nenhum exemplar encontrado)



José Lins do Rego – “Gordos e Magros”. Artigos.
Rio de Janeiro, Livraria Editora da Casa do Estudo, 1943. Coleção Ensaios.1ª edição. Encadernação original brochura. 351 pp.(R$ 175,00 / 350,00)



José Lins do Rego – “Poesia e Vida”. Ensaios.
Rio de Janeiro, Editora Universal, 1945. 1ª edição. Capa de Geraldo de Castro. Encadernação original brochura. 261 pp.(R$ 350,00)

Trata-se de um dos livros mais difíceis da bibliografia do autor.



José Lins do Rego – “Conferência no Prata: tendências do romance brasileiro – Raul Pompeia e Machado de Assis”. Conferências.
Rio de Janeiro, CEB – Livraria Editora da Casa do Estudante do Brasil, 1946. Coleção Conferências – Série Maná n.º 17. 1ª edição. Encadernação original brochura. 105 (2) pp.(R$ 45,00)

Edição das conferências lidas no Colégio Livre de Estudos Superiores, de Buenos Aires, em Outubro de 1943. Contem referências interessantes para a história da literatura brasileira.



José Lins do Rego – “Euridice”. Romance.
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1947. 1ª edição. Capa de Santa Rosa. Encadernação capa dura com sobrecapa. 284 pp.(R$ 75,00)

Prémio Fábio Prado (1947).



José Lins do Rego – “Bota das Sete Léguas”. Viagens.
Rio de Janeiro, Editora A Noite, 1947. 1ª edição. Encadernação capa dura com sobrecapa. 194 pp. (R$ 60,00/80,00)


José Lins do Rego – “Homens, Seres e Coisas”
Rio de Janeiro, Ministério Educação Saúde, 1952. Os Cadernos de Cultura. 1ª edição. Encadernação capa dura.. 77 pp. (R$ 8,00)



José Lins do Rego – “Cangaceiros”.
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1953 1ª edição. Romance. Capa de Santa Rosa. Encadernação original brochura com sobrecapa.. 315 pp. (R$ 40,00 / 100,00)

O romance Cangaceiros dá continuidade a história da família de Bento, da obra Pedra Bonita, depois que os beatos são dizimados pelas tropas.

"Volto hoje às minhas criaturas, aos rudes homens do cangaço, às mulheres, aos sertanejos castigados, às terras tostadas de sol e tintas de sangue, ao mundo fabuloso do meu romance, já no meio do caminho.".

A história desenvolve-se entre a vida de Bento, a sua amizade com os vizinhos, o seu namoro com Alice, a notícia das aventuras do irmão, as pragas da mãe que enlouquece, e a esperança de Custódio em ter vingada a morte do filho pelos cangaceiros.

A angústia brasileira determinada pela queda do colonialismo, a industrialização incipiente, a ânsia de renovação. Esses são os temas centrais desta obra que completa o ciclo "O Cangaço" de José Lins do Rego.


José Lins do Rego – “A Casa e o Homem”.
Rio de Janeiro, Organização Simões, 1954 1ª edição Colecção Rex vol. 4 . Brochura com sobrecapa. 230 pp. (R$ 50,00)



José Lins do Rego – “Meus Verdes Anos”. Memórias.
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1956, 1ª edição. Encadernação original brochura. Ilustrações de Luís Jardim. 351 pp. (R$ 90,00)



José Lins do Rego – “Gregos e Troianos”.
Rio de Janeiro, Livraria São José, 1957. 1 ª edição. Encadernação original brochura. 182 pp. (R$ 40,00 / 65,00)


José Lins do Rego – “Presença do Nordeste na Literatura Brasileira”.
Rio de Janeiro, Ministério Educação Saúde, 1957. Os Cadernos de Cultura. 1ª edição.. (R$ 180,00)




José Lins do Rego – “O Vulcão e a Fonte”. Crónicas, ensaios e notas de viagem.
Rio de Janeiro, Edições O Cruzeiro, 1958. 1ª edição. Encadernação original da editora. 315 pp. (R$ 75,00)



José Lins do Rego – “Dias Idos e Vividos”.
Rio de Janeiro, Editora Nova Fronteira, 1981. 1 ª edição. Encadernação original brochura. 460 pp. (R$ 40,00)


Com este artigo completo o ciclo sobre José Lins do Rego, escritor brasileiro com uma vasta produção literária na qual traça o retrato de uma das páginas importantes da própria história do Brasil.

Merece ser lido, para isso basta uma edição qualquer, mas para os apreciadores justifica ser coleccionado, aqui sim as 1ª edições são fundamentais.

Saudações bibliófilas

(1) Fiz uma busca exaustiva na Estante Virtual  para ajuizar da oferta das 1ª edições dos livros de José Lido Rego, visto esta ser a maior rede de “sebos” do Brasil. Claro que outras fontes foram estudadas, mas esta foi a principal.

Tomei como referência os descritivos elaborados pelos diversos “sebos”, confrontando-os com os da Biblioteca Nacional do Brasil mas procedi a uma homogeneização dos diversos critérios para dar a informação mais detalhada possível.

Os preços aqui referidos reflectem os que aqui se praticam, mas quando há grande disparidade coloquei os valores mínimo e máximo.

Estas disparidades nem sempre correspondem ao estado do livro, pelo que se deverá pensar em critérios específicos dos seus vendedores ou a procura mais intensa em certos Estados no Brasil. (a resposta pertence-vos...)

Uma palavra muito especial para “O Buquineiro” (categoria: Livreiros virtuais) pelo seu grande acervo em livros deste autor e, do qual, utilizei algumas das suas fotografias das capas dos livros, em 1ª edição, pelo que deixo aqui o meu agradecimento especial.