"Se não te agradar o estylo,e o methodo, que sigo, terás paciência, porque não posso saber o teu génio, mas se lendo encontrares alguns erros, (como pode suceder, que encontres) ficar-tehey em grande obrigação se delles me advertires, para que emendando-os fique o teu gosto mais satisfeito"
Bento Morganti - Nummismologia. Lisboa, 1737. no Prólogo «A Quem Ler»

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Conversa bibliófila – Um pequeno desafio



MARIN, Juan Antonio. Executoria de Hidalguia en Forma.
Arroyo el Puerco, September 18, 1770.
(Fotografia: Bauman Rare Books)

Tem-se falado aqui de tantos leilões, que nos apresentam belos livros e manuscritos, encadernações artísticas, inteiras ou meias em pele, de época – pergaminho e couro – mas também aparecem muitos livros brochados.


Encadernações

Estes livros, como gosto de dizer: no seu “estado natural”, ou melhor, como “vieram ao mundo dos leitores”, constituem sempre um desafio para cada um de nós.

Devemos encaderná-los ou mantê-los no seu “estado natural” – em brochura?

Pessoalmente sou dos que defende a opinião de que o livro deve ser preservado, nas nossas bibliotecas, o mais próximo da forma como conseguiu chegar até aos nossos dias – apesar de ser um grande apaixonado pela encadernação.


Regulamento para Exercícios e Disciplina dos Exércitos (1816)
(Encadernação de Marco Pedrosa)

Quero com isto dizer que se o livro estiver numa encadernação de origem – esta deverá ser mantida – se estiver brochado – deverá ser conservado assim. Opinião que parece ser consensual, mas…e existe sempre um mas! Que fazer quando o livro apresenta alguma fragilidade ou pretendemos resguardá-lo o melhor possível?

Foram-me enviadas algumas notícias, por um bom amigo, e dentre elas precisamente esta da http://www.llar-llibre.com/ que nos propõe, na forma de ficheiro PowerPoint, um “Guia para a confecção de uma caixa de protecção para livros segundo o método CALCACO”.



E é este, precisamente o desafio que vos proponho – vamos tentar aprender a confeccionar as nossas caixas protectoras para livros.

Claro que não se trata de fazer concorrência aos encadernadores nem promover nenhum “curso por correspondência” – nem para isso tenho conhecimentos – mas muito simplesmente propor uma solução relativamente fácil e segura para preservar um livro, sobretudo em brochura ou encadernado, mas já com algum cansaço, e que desta maneira ficará muito mais protegido, permitindo até a sua procura e manuseamento muito mais segura.

Sou igualmente de opinião que haverá obras merecedores de caixas-estojos de protecção idealizados e confeccionados por esses grandes artistas que são os encadernadores; esta medida que vos proponho, será uma solução intermédia: “não quero encadernar, mas quero defendê-lo o melhor que possa” e, para além disso, será um belo exercício de trabalhos manuais!




Vinicius de Moraes - Cinco Elegias
Caixa-estojo
(Encasdernação Marco Pedrosa)

Mas quantos de nós não têm livros, que pela acção do tempo, começam a ficar com as lombadas, as capas de brochura e mesmo o próprio livro com sinais de amarelecimento e deposição do malfadado pó.

Cada um terá a sua habilidade – em maior ou menor grau – mas como não vamos mexer ou manusear os nossos livros não estragaremos nada! Vamos arriscar um pouco de paciência, descobrir algumas capacidades desconhecidas e, na pior das hipóteses, ter um pequeno insucesso … mas só o será se experimentarmos, portanto mãos à obra!

Estou certo de que irão ter muitos sucessos.

Ainda na sequência deste “bloco de notícias” que me foi enviado, quero compartilhar convosco este vídeo sobre os trabalhos de restauro de livros em Florença. Trata-se de um filme baseado nos trabalhos efectuados na Biblioteca Nacional de Florença, resultantes das inundações em 4 de Novembro de 1966.


A film by Roger Hill; restoration consultant, Peter Waters ;
sponsored by the Italian Art and Archives Rescue Fund.
University of Utah Library, 2006

Saudações bibliófilas com votos de um bom fim-de-semana, que será bem frio… pelo menos para os europeus.


8 comentários:

Galderich disse...

El problema de los libros es que muchas veces vale más la conservación (cajas, restauraciones...) que el mismo libro. Ahora se ha pueto de moda en los libros pequeños y modernos conservarlos dentro de bolsas transparentes. Muchos libreros tienen los libros así, como si de un bocadillo se tratase.
Sea como sea hay que preservar estos tesoros tipográficos con uno de los soportes més débiles, el papel.

Fernanda Rocha Mesquita disse...

Bem, tentei ver o filme mas nao consegui ( talvez burrice minha ), mas quanto a encadernacao dos livros, respeitando todas as ideias ( e' para isso que aqui estamos) a caixa podera ser boa ideia, mas eu escolheria sempre se fosse possivel, fazer uma copia da capa original e integrar sempre todo o livro incluindo a capa antiga, nessa capa nova , mas igual. parece esquisito, mas eu acho que o livro nao perderia tanto a alma dele. Ei, sera que me fiz entender? os livros apara mim, sao sentimentos, toques, aromas, sonhos e se for o original,tanto melhor...
gostei do artigo
fernanda

Rui Martins disse...

Galderich,

Estou de acordo contigo quando dizes que um estojo protector para um livro, ou o seu restauro, é habitualmente sempre mais caro do que o próprio livro. Quanto às “bolsas” de facto parecem-me mais adequadas para um produto numa prateleira de um supermercado do que para o objecto de que tanto gostamos de sentir quando o manuseamos.

E aqui reside o problema da sua fragilidade – o papel – que se deteriora com facilidade. Basta reparares na má qualidade do mesmo nas edições do séc. XIX, por exemplo, mesmo de autores consagrados.

Quanto à caixa estojo que mostrei, sendo cara, o livro pela sua elevada raridade pode justificá-la, quanto ao seu estilo será sempre uma questão de gosto pessoal.

Um abraço

Rui Martins disse...

Fernanda,

Quanto ao filme, como tem direitos de autor, fiz uma hiperligação para acesso à página da Web, assim para o visualizar, e julgo que merece perder o tempo (cerca de 40 minutos) pois é bastante interessante, faça clique no título por baixo da imagem para abrir a referida hiperligação.

De facto a sua sugestão vem de encontro à ideia de muitos bibliófilos que mandam fazer caixas protectoras que sendo por vezes em pele reproduzem o mais fielmente possível a capa original (mas atenção que estas são muito caras), quanto à minha sugestão (e nem sempre estou de acordo com o que escrevo, pois pretendo apenas lançar ideias para discussão ou pistas para investigação posterior) poderá perfeitamente ser realizada de acordo com a sua perspectiva; para tanto bastará fazer, como diz, uma cópia fac-similada da capa e aplicá-la no caixa-protectora.

Mas é obvio que nada disso é o mesmo que a sensação de um pergaminho ou de um marroquim de época, ou mesmo uma simples capa de papel colorido num livro do século XVIII-XIX, depois vem o sentir e ouvir o crepitar do papel nas nossas mãos e o aroma que daí se desprende – a nossa imaginação poderá pintar tantos quadros e idealizar tantos percursos, pelos quais este passou, conforme lhe dermos liberdade.

O meu obrigado... volte sempre.

Marco Fabrizio Ramírez Padilla disse...

Rui.

Muy buena aportación la alternativa que nos presentas de construir y usar la caja para preservar los libros en su estado original.

Para algunos libros se justificará el gasto, en algunos otros quizá no, pero lo importante es agotar todas las posibilidades.

Aunque al observar las encuadernaciones que realiza Marcos Pedrosa, es difícil no caer en la tentación de vestir al libro con tan hermoso traje.
Gracias por el apunte.
Saludos.

Saludos

Rui Martins disse...

Estimado Marco Fabrizio,

Este apontamento teve como objectivo principal lançar o tema para discussão e não propriamente defender uma posição pessoal.

Ainda que eu entenda que se deve defender o melhor possível “os nossos” livros para que eles possam enriquecer um dia mais tarde outras bibliotecas e defender assim um património que é de todos.

Quanto às encadernações do Marco Pedrosa, são de uma qualidade e técnica tão boa que é muito difícil resistir-lhe.

Assim como quem não ficará enamorado de um Bauzonnet, um Charles-François Capé, um René Simier, um Jean-Claude Bozerian, um Marius Michel, um Chambolle-Duru, um Georges Trautz (que ficaria conhecido como Trautz-Bauzonnet ) ou um René Kieffer , só para citar alguns dos franceses mais conhecidos.

E já que falei de enamorado, e como isto de bibliofilia é uma questão de amor, cada um amará à sua maneira e vestirá o objecto da sua paixão como entender!

Um abraço

Anónimo disse...

Rui, muito interessante o texto. Pena que eu seja desajeitado por natureza, não tendo nenhuma aptidão para construir, por mim mesmo, a mais simples caixa ou estojo.

Abraços,

Angelo

Rui Martins disse...

Angelo,

Nada melhor que tentares…só precisas, como disse, de paciência e calma. Se não sair bem à primeira sairá à segunda.

Não é tão complicado como o restauro que viste no vídeo e nem precisas tantos apetrechos!

Um grande abraço