Chen Hongshou: Magnólia e pedra, Dinastia Ming
Melhor do que responder pessoalmente a cada um dos meus leitores, que publica ou anonimamente, me incentivaram a continuar o meu trabalho, será retribuir-lhes a sua confiança com a publicação de um pequeno post sobre um tema que julgo ser pouco divulgado/conhecido – o livro e a encadernação chinesa.
Wang Hui: Paisagem, Dinastia Qing
Apesar de todo o fascínio que a cultura milenar chinesa nos suscita desde há muitos séculos o livro e a literatura chinesas continuam a ser um pouco desconhecidos para nós europeus, pese embora os Nóbeis da Literatura que recentemente têm sido atribuidos a escritores desde imenso país (caso de Gao Xingjian e este ano a Mo Yan).
Claro que as razões serão por demais óbvias, para além do chinês/mandarim não ser uma língua “muito vulgarizada” no exterior da China e este país ter sempre vivido um pouco encerrado sobre si mesmo, criou como que uma “redoma” que se impedia a divulgação da sua cultura, por outro lado, qual “fruto proibido”, aumentava o desejo de desvendar os seus mistérios.
XINGJIAN, Gao – Buying a Fishing Rod for My Grandfather
(colectânea de contos escritos entre 1983 e 1990 que li com muito agrado)
Deste modo, o que se conhece da sua literatura é através das poucas traduções que nos vão chegando.
(Exceptuem-se aqui a grande divulgação/exportação das traduções, em quase todas as línguas, dos escritos do “camarada” Mao Tsé-Tung – era assim que então se escrevia – nos anos da Revolução Cultural entre os esquerdistas da época)
Mas textos muito mais antigos são hoje cobiçados por bibliófilos/coleccionadores pela sua raridade e, atrevo-me a dizer, igualmente pela sua beleza.
(o mercado americano tem alguma predileção por esta temática)
E já agora deixo aqui três exemplos que me parecem bem elucidativos das qualidades que referi acima.
Veja-se este manuscrito em rolo:
A Dunhuang manuscript scroll that contains three fragments of Buddhist sutras was initially appraised by the UChicago Library and determined to date back to the ninth century. An expert from the National Library of China, who has studied numerous similar pieces at his own institution, examined the manuscript during the conference. He has suggested the piece dates back to the seventh century. (Photo by Michael Kenny)
©The University of Chicago Library
E que se poderá dizer deste livro e das suas ilustrações?
E por ultimo este exemplar mais recente com toda a sua delicada beleza orientalista.
Four 20th Century Chinese picture books - "The Story of Chinese Old Farming", "The Story of Chinese Fashion", "The Story of Tea" and "The Story of Silk", all contained within stained wood covers each with a character to front. (lote 421)
©The CANTERBURY AUCTION Galleries
Igualmente nos ocorre a imagem de Confucio e dos seus princípios filosóficos.
Confúcio
Claro que a cultura chinesa e o seu espiritualismo não se prendem só com este grande filósofo.
Convirá não esquecer essa obra intemporal que é o Tao Te Ching atribuído a Laozi , um dos fundamentos do taoismo, que continua a ser uma óptima fonte para meditação.
Laozi, retratado como um líder taoísta.
Mas voltemos àquilo de que me propus falar.
(como podem ver é extremamente fácil divagar neste mundo fascinante da cultura chinesa e mal nos apercebemos já perdemos o “fio à meada”)
Vejam-se então algumas das técnicas de encadernação chinesa pela leitura deste documento: Bookbinding – Some characteristics of the Dunhuang booklets by Colin Chinnery, que me parece ser bastante elucidativo.
Bookbinding – Some characteristics of the Dunhuang booklets
by Colin Chinnery
Não posso deixar passar esta oportunidade sem referir que este documento me foi enviado como presente de aniversário por um dos muitos leitores com quem vou trocando impressões e que contribuem largamente para o enriqueciomento dos meus escassos conhecimentos.
Neste caso foi o meu estimado amigo Johnson Brito de Lima a quem publicamente agradeço a sua lembrança.
(se calhar só por isto valerá a pena manter o blogue…)
Camilo Pessanha
Fotografia com dedicatória a Luís Nolasco
Já aqui deixei notícia sobre Camilo Pessanha e a sua Clepsydra, o qual passou a maior parte da sua vida em Macau, onde se tornou um grande admirador, e mais tarde conhecedor, da arte e da literatura chinesas.
Recordo de novo as duas obras que nos legou fruto da sua paixão por esta cultura: China: estudos e traduções e Leituras Chinesas – Kuok Man Kau Fo Shü.
Camilo Pessanha – China : estudos e traduções
Lisboa, Agência Geral das Colónias, 1944
1ª ed. XII, 131, [4] p.
Camilo Pessanha teve um mestre de língua chinesa e um amigo, o sinólogo José Vicente Jorge, tradutor da Embaixada de Portugal em Pequim, Chefe da Repartição de Expediente Sínico em Macau, grande coleccionador de Arte Chinesa e autor do livro Notas sobre a Arte Chinesa, que o introduziu no conhecimento da Arte e da Literatura chinesas e com quem publicou um livro de Leituras Chinesas – Kuok Man Kau Fo Shü.
Camilo Pessanha
Leituras Chinesas – Kuok Man Kau Fo Shü
Espero que esta minha divagação, pois mais não é do que isso, tenha sido do vosso agrado.
Saudações bibliófilas.
Nota:
Veja-se a este propósito ainda este artigo: Stanford acquires a cache of ancient Chinese books .
The volumes represent the four traditional realms of Chinese knowledge:
history, philosophy, literature and classics.
6 comentários:
Es curioso como a los bibliófilos nos atrae la belleza de los libros orientales con su caligrafía y sus ilustraciones por no hablar de su delicada encuadernación debida a la transparencia de sus papeles...
Todo un mundo estético de una delicadeza y sutilidad que no se nos escapa.
Rui, realmente falta para a literatura chinesa no ocidente alcançar um grau um pouco maior de penetração. Por outro lado, a literatura japonesa tem gozado de certo prestígio nestas terras brasileiras, com várias edições de livros clássicos e contemporâneos de escritores como Haruki Murakami, Yasunari Kawabata, Natsume Soseki e Eiji Yoshikawa.
Abraços.
Galderich,
Penso compartilharmos o gosto pelo livro chinês.
Ainda que sejam ilegíveis para mim, não me conseguem deixar de seduzir pela sua estética, a sua fragilidade e sobretudo a beleza do traço finamente elaborado das suas ilustrações, que fazem dele um objecto de uma delicada beleza que, para mim, só é ultrapassada pela porcelana chinesa. (curiosamente as duas grandes paixões de Camilo do Pessanha)
Entretanto preparo um artigo inovador que penso te irá agradar…”marcha” é um pouco lentamente, pois ainda não decidi qual a melhor forma de enquadrar os dois temas envolvidos.
(escrevo-o quase como uma homenagem ao teu precioso apoio desde a primeira hora)
Um forte abraço
Angelo,
Antes de mais o meu obrigado pelas tuas palavras de incentivo e de apoio.
Com este artigo procurei iniciar uma mudança no blogue (trabalho sempre difícil): falando do livro mais como objecto de arte e cultura do que tendo em atenção o seu valor comercial/coleccionistico.
Aqui em Portugal a literatura japonesa também é muito mais divulgada.
(repara que do Gao Xingjian eu apresentei a tradução inglesa que foi a que descobri numa livraria, do Mo Yan só existe um livro traduzido!)
Conheço bem o Haruki Murakami, gostei muito de ler “A crónica do pássaro de corda”(sou um bibliómano inveterado)
Um forte abraço
Rui, agradou-me muito o novo formato que pretendes imprimir ao seu blog. Aos que gostam de leitura, sempre vai muito bem algumas dicas de boas obras a ler, associadas à história do livro e ao livro enquanto objeto, principalmente vindo de alguém que tanto conhece.
caros bibliófilos
com uma dor no coração, estou começando a me desfazer da coleção herdada a partir da morte de meu pai. um aficcionado. uma pequena parte, com o tema rio de janeiro, será provavelmente leiloada de imediato pela livraria rio antigo. mantenho-os informados caso haja interesse. ainda tenho portugueses, modernistas, machado de assis e drummond. muitas obras raras. nosso contato é em bauru pelo e mail mafuadohpa@gmail.com
abraços da ana beatriz
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