Luís Moutinho da Candelabro – Livraria Alfarrabista
elaborou a sua montra de Setembro e como nela figuram dois exemplares de Elogios
dos Reis de Portugal de Frei
Bernardo Brito, bem conhecido nas andanças bibliófilas pela sua Monarchia Lusitana, decidi investigar um
pouco mais sobre este autor para se ficar a conhecer melhor o homem que por vezes é menos
conhecido do que a sua obra.
Frei Bernardo de Brito, [entre 1600 e 1650?]
Autor Desconhecido - Biblioteca Nacional de Portugal
Frei Bernardo de Brito foi cronista-geral da Ordem de Cister e
cronista-mor do Reino.
Chamava-se na vida civil (ou vida
secular, como então se dizia) Baltasar
de Brito de Andrade. Nasceu em Almeida em 20 de Agosto de 1569, sendo filho de Baltazar Freire de
Andrade e Maria Da Ponte.
Placa evocativa do local de nascimento de Frei
Bernardo Brito
O seu pai destinava-o para a
carreira das armas, pelo que o enviou para Itália, Roma e Florença, onde
estudou e permaneceu durante alguns anos.
Ingressou no Mosteiro de
Alcobaça (1)
em 23 de Fevereiro de 1585, onde fez os seus estudos. Tornou-se notado pelos seus
conhecimentos de latim, italiano, francês e espanhol. Daqui foi para a Universidade de Coimbra onde se
doutorou em Teologia a 12 de Abril
de 1606.
Mosteiro de Alcobaça
(Fachada principal)
Como cronista-geral da Ordem de
Cister publicou a Primeira Parte da Cronica de
Cister (Lisboa, 1602). Como resultado do seu interesse pela história
de Portugal e seu estudo publicou Primeira Parte da Monarchia Lusitana (1597)
e os Elogios dos Reis de Portugal
(1603).
Primeira Parte da Cronica de Cister
Lisboa: Pedro Crasbeek, 1602
Após o falecimento de Francisco de Andrada, cronista-mor de
Portugal, foi nomeado como seu sucessor no cargo em 12 de Julho de 1614.
Já tinha saído a segunda parte da
Monarchia Lusitana (1609), constituindo
a nomeação régia de Filipe II (III
de Espanha) e na altura também rei de Portugal, o reconhecimento oficial da
obra realizada.
Filipe III de Espanha
e II de Portugal a cavalo
(Pintura a óleo de
Velasquez)
Principal discípulo de Paulo
Orósio no âmbito da cultura portuguesa, foi o primeiro a tentar superar os
limites fragmentários da crónica.
Neste contexto, Frei Bernardo de Brito iniciou um projeto para redigir
uma monumental História de Portugal em oito volumes, desde as suas origens até
à sua época (a Monarchia Lusitana), do
qual publicou o primeiro volume em 1597 e o segundo em 1609.
Após a sua morte, a obra foi continuada até ao quarto volume por Frei António Brandão.
A Monarchia
Lusitana è um projecto ambicioso, que começa com o grande dilúvio,
passa pelo nascimento de Cristo e segue até à fundação da Ordem de Cister em 1098.
(2)
Monarchia Lusitana – Parte Primeira
Frontispicio (3)
Sem entrar na origem e formação
de Portugal o autor regista lendas e mitos, a que a fé dera veracidasde, com o intuito
declarado de glorificar a nação portuguesa e de despertar os seus compatriotas
da apatia em que haviam caído, desde 1580, sob o dominio filipino.
Deste modo a sua história ficou
condenada a ser um repositório de mitos, não hesitando Frei Bernardo de Brito
em falsificar documentos para fundamentar as suas asserções.
Monarchia Lusitana – Segunda Parte
O seu principal crítico foi Diogo de Paiva de Andrade, que,
ressentido por não ter sido nomeado cronista-mor do Reino (sucedendo assim a
seu pai, Francisco de Andrade) publicou Exame
d'antiguidades composto por Diogo de Payva d'Andrada. Parte
primeyra. Repartida em doze tratados, Lisboa, na oficina de Jorge Rodrigues,
1616, onde o critica asperamente. Limitou-se apenas a visar o livro I da
Primeira parte. Frei Bernardo de Brito não quis, ou não teve tempo de lhe
responder, pelo que Diogo de Paiva de Andrade não prosseguiu a sua obra.
Contra Diogo de Paiva de Andrade,
veio a público defendê-lo o seu confrade Fr.
Bernardino da Silva que publicou a Defensam da
monarchia lusitana, pelo Doutor Fr. Bernardino da Silva - 1.ª parte,
na oficina de Nicolau Carvalho, Coimbra, 1620; 2.ª parte, por Pedro Craesbeeck,
Lisboa, 1627, obra muito apreciada pelos críticos, pois está bem escrita em “linguagem correcta e elegante, quanto o
permite o assunto; e que o autor advogou a sua causa do melhor modo que lhe era
possível” (Inocêncio Francisco da Silva in Diccionario bibliographico portuguez e estudos applicaveis a Portugal e
ao Brasil).
Silva, Bernardino da – Defensam da monarchia lusitana /
pelo Doutor Fr. Bernardino da Silva.
Em Coimbra: Na Officina de Nicolao
Carualho, 1620-1627. 2 vol.;in 4º.
(Exemplar digitalizado da Biblioteca Digital da UCFC
acessível aqui)
Embora a sua escrita fosse perfeita, como historiador a sua obra foi
muito criticada, o que não admira, dada a falta de documentos históricos.
Entretanto, é acusado por
historiógrafos e historiadores, principalmente a partir de Alexandre Herculano, de ter interpretado os fatos históricos à luz
do misticismo e da lenda, e mesmo de ter falsificado documentos à época.
Frei Bernardo de Brito – Gravura
Até finais do século XIX, a Primeiro Parte da Monarquia Lusitana foi
a principal fonte histórica em português a informar com bastantes pormenores
sobre o período da pré-fundação de Portugal. Alexandre Herculano fez tábua rasa desse período histórico,
considerando os fundamentos do país com a doação do condado Portucalense a D.
Henrique.
António Quadros refere que “Um
Garrett, um Teófilo Braga, um Oliveira Martins reagiram contra a crítica de Herculano
a Frei Bernardo de Brito, se bem que não atingindo ainda onde se situava
exactamente a injustiça do autor dos Opúsculos. Para o primeiro, a positividade
de Herculano aniquilaria a poesia da nossa história; para o segundo, é preciso
entender o valor etnológico dos mitos, expressões vivas da personalidade
nacional; para o terceiro, não se faz história sem imaginação, faculdade capaz
de discernir arcanos mentais e espirituais a que a razão discursiva não acede”
(pp. 38-39).
Como nota final podemos seguramente afirmar que: “Por muito apreciável que seja o seu patriotismo, não há dúvida de que
o método adoptado prejudicou seriamente a qualidade dos estudos históricos em
Portugal.” (Eugénio Lisboa in Dicionário
Cronológico de Autores Portugueses).
Frei Bernardo de Brito veio
a falecer na sua terra natal em 27 de Fevereiro de 1617.
Leiam-se ainda Vida de Fr. Bernardo de Brito, Monge Cirterciense e
Cronista-Mor do Reino, escrita de ordem da Academia Real das
Ciências de Lisboa, por D. António da
Visitação Freire (1769-1804), Cónego Regular de S. Vicente de Fora, Lente
de Geografia e História Universal nas suas Reais Escolas, Correspondente do
Número da Academia Real das Ciências e Sócio da Sociedade Real Marítima, para
servir de Preliminar à reimpressão (em 1806) da Monarchia Lusitana na versão
digitalizada da Biblioteca Virtual
Miguel de Cervantes aqui:
e o Elogio
do Doutor Frey Bernardo de Brito, Religioso de Cister e Chronista Mor de
Portugal, em Notícias de
Portugal, escritas por Manuel
Severim de Faria, acrescentadas pelo Padre
D. José Barboza, na Oficina de António Isidoro da Fonseca, Lisboa, 1740.
(págs. 430-440) na versão digitalizada da Biblioteca
Nacional de Portugal/Biblioteca Nacional Digital aqui:
Bibliografia:
Sílvia de Lisardo [obra
poética] (Lisboa, 1597)
Monarchia Lusitana (1597
e 1609)
Primeira Parte da Crónica de Cister
(Lisboa, 1602)
Elogio dos Reis de Portugal
(Lisboa, 1603)
BRITO, Bernardo de – Siluia de Lysardo em que ha varios
sonetos & rimas : com a segunda parte do sonho de Chrisfal. - Agora
nouamente impressa & posta em ordem.
Em Lisboa: por Alexandre de Siqueira, 1597. - [4], 76 f.;
in 8º
Vejamos então o que a Candelabro – Livraria Alfarrabista nos
propõe:
3267. BRITO (FR. BERNARDO DE) - ELOGIOS HISTORICOS// DOS// SENHORES
REIS// DE PORTUGAL,// Escritos// Por Fr. BERNARDO DE BRITO,// Chronista Geral,
e Monge da Ordem// de S. Bernardo,// e modernamente addicionados// pelo PADRE
D. JOSÉ BARBOSA,// (...)// Nova ediçaõ. LISBOA. Na Typographia Rollandiana.
1825. In-8º de 159-IX págs. Enc.
Obra muito estimada de Fr. Bernardo de Brito (1569-1617) e publicada
pela primeira vez por Pedro Craesbeeck em 1603. A presente edição foi
acrescentada pelo padre D. José Barbosa (1674-1750), passando a incluir os
monarcas desde o Conde D. Henrique até D. João V.
Do "Prologo do Editor": "Quasi todas as Nações tem o
costume de reimprimir aquellas Obras de que se possa tirar fructo, e utilidade.
Animado deste zelo intentei reimprimir estes Elogios Historicos dos Senhores
Reis de Portugal; porque em tão pequeno Volume se acha em resumo quasi toda a
nossa Historia Portuguesa; serve este Compendio de muita utilidade; porque quem
naõ pode abranger toda a nossa Historia pelos numerosos Volumes em que está
escrita, (posto que modernamente se acha mais methodica na de Mr. La Clede, e a
de nosso incansavel Portuguez Damiaõ de Lemos Faria, e Castro) achará neste
livro com que possa conhecer o que nós somos, e poderemos ser, se imitarmos as
Virtudes, e Façanhas, que nos ditos Elogios se louvaõ, e narraõ."
Boa encadernação, recente, com lombada e cantos em pele.
Exemplar em bom estado de conservação, com alguma natural acidez devido
à qualidade do papel e à idade da obra. Sem qualquer assinatura de posse,
humidades ou vestígios de xilófagos.
Bastante invulgar.
3522. BRITO (FR. BERNARDO DE) - ELOGIOS// DOS REYS DE PORTUGAL// COM OS
MAIS VERDADEYROS RETRATOS, QUE SE PUDERAÕ ACHAR. Ordenados por// Fr. BERNARDO
DE BRITO// Chronista geral, e Monge da Ordem de S. Bernardo.// Agora novamente
addicionados// pelo// P. D. Joseph Barbosa// Clerigo Regular da Divina
Providencia, Chronista da Serenis-// sima Caza de Bragança.// (...) LISBOA
ORIENTAL.// Na Officina FERREYRIANA.// M.DCC.XXVI.// Com todas as licenças
necessarias. In-8º de X-246 págs. de texto + 25 gravuras em folhas à parte.
Enc.
Obra muito estimada de Fr. Bernardo de Brito (1569-1617) e publicada
pela primeira vez por Pedro Craesbeeck em 1603. A presente edição foi
acrescentada pelo padre D. José Barbosa (1674-1750), passando a incluir os
monarcas desde o Conde D. Henrique até D. João V.
Ilustrado com 25 belas gravuras relativas aos 25 primeiros monarcas
portugueses.
Exemplar em bom estado de conservação, com o papel ainda firme e sem vestígios
de humidades, sublinhados e assinaturas de posse. Tem 2 ínfimos furos de traça
que trespassam todo o volume, mas sem nunca ofender a mancha tipográfica. A
encadernação e as folhas de guarda estão em sofrível estado de conservação, já
algo atacadas pela traça.
Encadernação setecentista, inteira em pele, com gravados a ouro.
FREI BERNARDO DE BRITO (E OUTROS) - MONARCHIA | LVSYTANA |
[...] | PARTE PRIMEIRA | que contem as historias de Portugal desde a cria- |
ção do mundo te o nacimento de nosso sñor | IESV CHRISTO | [gravura] | DIRIGIDA
AO CATHOLICO REI DÕ PHILIPPE * | II DO NOME REI DE… (3)
Espero ter-vos traçado um esboço bio-bibliográfico
deste historiador português, que embora muito justamente criticado, iniciou
um trabalho que se poderá considerar pioneiro entre nós.
Saudações bibliófilas.
Notas:
(1) Mosteiro de Alcobaça.
(2) Dentro
desta perspectiva, a Primeira Parte da Monarquia Lusitana, contém as histórias
de Portugal desde a criação do mundo até o nascimento de nosso senhor Jesus
Cristo e a Segunda Parte da Monarquia Lusitana em que se continuam as histórias
de Portugal desde o nascimento do nosso salvador Jesus Cristo até ser dado em
dote ao Conde Dom Henrique.
(3)
Lote 348 do leilão de Antiguidades e
Obras de Arte realizado em 27 e 28 de Maio de 2013 por Cabral Moncada Leilões e que pode ser consultado aqui.
Fontes consultadas:
Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes
Dicionário Cronológico de Autores Portugueses. Volume I. [Coordenação
de Eugénio Lisboa]. Mem Martins, Publicações Europa-América/Instituto Português
do Livro e da Leitura, s.d.[1989]. 2ª edição. in 8º. 648 (2) páginas.
Frei Bernardo de Brito – Projecto Vercial
Frei Bernardo de Brito – Wikipedia:
1 comentário:
Muito obrigada por este esclarecedor e esclarecido artigo sobre Frei Bernardo de Brito.
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