"Se não te agradar o estylo,e o methodo, que sigo, terás paciência, porque não posso saber o teu génio, mas se lendo encontrares alguns erros, (como pode suceder, que encontres) ficar-tehey em grande obrigação se delles me advertires, para que emendando-os fique o teu gosto mais satisfeito"
Bento Morganti - Nummismologia. Lisboa, 1737. no Prólogo «A Quem Ler»

sábado, 27 de setembro de 2014

Pedro de Azevedo – Leilões de Livros e Manuscritos – Leilão 61: Biblioteca Carolina Michaëlis | Joaquim de Vasconcelos & outras proveniências




Pedro de Azevedo anunciou o seu próximo leilão de livros e manuscritos – o Leilão 61 que decorrerá, como é habitual, no Amazónia Lisboa Hotel, Travessa Fábrica dos Pentes, 12/20 (ao Jardim das Amoreiras), em Lisboa.

O Leilão decorrerá na:
Segunda-feira, 6 de Outubro, às 19.30 h.

A Exposição dos lotes está agendada para o mesmo local a:

Domingo, 5 de Outubro, das 14.30 h. às 19.30 h.
Segunda-feira, 6 de Outubro, 14.30 h. às 17.30 h.



Mas melhor do que eu para fazer a sua descrição, transcrevo a  Apresentação do catálogo elaborado pela leiloeira para este importante evento, que demonstra bem a sua qualidade e a grande raridade de alguns dos lotes em praça.

Apresentação

O presente leilão inclui um conjunto de lotes de diversas proveniências que aparentemente poderiam originar alguma diversidade de temas, mas que, na realidade, em grande parte se completam.

O primeiro núcleo é o que provem das bibliotecas de Carolina Michaëlis de Vasconcelos (1851-1925) e de seu marido Joaquim de Vasconcelos (1849-1936). É constituído por mais de 70 espécies, das quais 33 foram impressas no século XVI e 29 no século XVII. Neste grupo, quase todos os exemplares conservam as encadernações da época, sendo a maioria de pergaminho.

D. Carolina anotava por vezes as obras que estudava, mas sempre a lápis. Já o seu marido, tinha por hábito utilizar a tinta para anotações nas guardas e alguns exemplares apresentam mesmo a sua pequena rubrica nas páginas de rosto.

Do conjunto, ressalta necessariamente a terceira edição castelhana de Os Lusíadas (lote 51), impressa em Madrid, em 1591, que mereceu por parte de Joaquim de Vasconcelos a seguinte anotação na folha de guarda: Trad. hoje muito rara. Exemplar perfeito. Mas outras espécies são de assinalar, entre as quais: o relato da viagem do infante D. Felipe de Espanha, filho de Carlos V, aos estados do Brabante e da Flandres (lote 49), na sua edição original (Antuérpia, 1552); a edição quinhentista lisboeta (1595), do Passionário de Fr. Estêvão de Lisboa (lote 126), com elaborado grafismo a preto e vermelho e notação musical quadrada; a descrição dos funerais de Estado de Felipe IV de Espanha (Madrid, 1666), por Pedro Rodriguez de Monforte (lote 289); o delicioso exemplar da descrição da conquista do Reino do Pegú (lote 227), da pena do Pe. Manuel de Abreu Mouzinho (Lisboa, 1617), encadernado em vélin doré; e o exemplar de trabalho da erudita professora, da edição das poesias de Sá de Miranda (Halle, 1885), repleto de anotações manuscritas a lápis pelo punho da própria autora (lote 217).

Um segundo núcleo, com mais de uma centena de espécies, teve a sua origem em dois proprietários distintos, cuja descendência viria a reunir-se, no nosso tempo, numa única família. Referimo-nos, em primeiro lugar, ao médico e professor José Frutuoso Aires de Gouveia Osório (1827-1887) que chegou a ser presidente da Câmara Municipal do Porto entre 1886 e 1887, proprietário do famoso Erário mineral, do Dr. Luís Gomes Ferreira (lote 133), assistente nas minas [de Minas Gerais, no Brasil] do ouro por discurso de vinte annos (Lisboa, 1735) e de outras obras de Medicina.

O outro coleccionador foi o Dr. José Bento da Rocha e Mello, provavelmente jurista ou advogado no século XIX, a ajuizar pelas temáticas predominantes na sua biblioteca. São dele os dois volumes do chamado Código Brasiliense, que encerram legislação produzida, pelo menos parcialmente, na Imprensa Régia do Rio de Janeiro entre os anos de 1808 e 1818 (lotes 43 e 44) e, seguramente, a edição original do De Gloria, de D. Jerónimo Osório (lote 236), impressa em Lisboa, em 1549, para além dos oito volumes de leis, decretos e alvarás, dos séculos XVIII e XIX (lotes 77 a 84).

O pequeno acervo de 34 títulos provenientes da colecção de José Maria Gonçalves (1907-1998) compreende tão somente 14 espécies impressas no século XVI (e outras tantas no século XVII), de entre as quais salientamos o notável conjunto de sete leis avulsas quinhentistas portuguesas (lotes 253 a 258), bem como a edição de 1598 dos Regimentos do Auditório Eclesiático do Arcebispado de Évora (lote 277) e a História da Igreja Tripartida, baseada na obra do historiador romano Eusébio de Cesareia (lote 128), na edição de Coimbra, de 1554.

Finalmente, assinalamos as 63 espécies que pertenceram ao conhecido bibliófilo Emílio Monteiro (1905-1971), livraria por nós leiloada, em colaboração com Silva’s Leiloeiros, em Maio de 1990, onde se inclui a primeira edição do Só, de António Nobre, com dedicatória do autor (lote 230). E ainda os 47 lotes da biblioteca de D. Diogo de Bragança, Marquês de Marialva (1930-2012), que encerra alguns dos títulos mais significativos do primeiro modernismo literário português.
                                                                                                             
                                                                                                                   A Organização

Vejamos alguns destes lotes:



51. CAMÕES, Luís de.- LOS LVSIADAS | DE LVYS DE CAMOES, | Traducidos de Portugues en Castellano | por Henrique Garces. | DIRIGIDOS A PHILIPPO | Monarcha primero de las Españas, | y de las Indias. | [armas de Filipe II Espanha e I de Portugal].- En Madrid: Impresso con licencia en casa de Guillermo Drouy, impressor de libros, Año 1591.- [4], 851 (aliás 185),
[1] f.; 20 cm.- E.

Terceira tradução e edição em língua castelhana, da responsabilidade de Henrique Garcez, tendo as duas primeiras sido impressas em 1580, uma em Alcalá de Henares (trad. De Bento Caldera) e a outra em Salamanca (trad. de Luis Gomez de Tapia). Passamos a descrever o conteúdo das quatro folhas preliminares: folha [¶1]: rosto e taxa (verso), datada de 5 de Setembro de 1591, subscrita por Miguel Ondarça Çauala; folhas ¶2 e ¶3 (frente): El Rey - licença datada de 31 de Janeiro de 1591, subscrita Por mandado del Rey nuestro señor Iuan Vasques e aprovação do Conselho Real, subscrita por Fray Pedro de Padilla; folha ¶3 (verso) até à folha ¶4 (verso): quatro sonetos apologéticos. Os 10 cantos do poema ocupam as 184 folhas seguintes e a frente da folha 185. No verso da penúltima folha, um soneto do tradutor, Henrique Garcez; última folha com errata (frente) e cólofon (verso): En Madrid | En casa de Guillermo Druy | Impressor de libros. | Año 1591. Erro de foliação: f. 851 por 185. Exemplar um pouco aparado e com alguma acidez, mas sólido e completo.



Pequenas falhas de suporte no canto superior externo da folha A2 e na margem superior da folha Z3, com prejuízo do título corrente, dos dois lados da folha. Últimas folhas com algumas manchas de água e de maré; as três finais manuseadas; a última (Aa2) com restauro no verso, sem afectar o texto. Inscrição a tinta na guarda volante, pelo punho de Joaquim de Vasconcelos: Trad. hoje muito rara. Exemplar perfeito. No catalogo de Vindel de Madrid de 1905 (em Maio) vem cotado em 125 pesetas (pag. 326). J. de Vas[conce]los. Outras inscrições na guarda fixa. Encadernação inteira de pergaminho flexível, com falta dos atilhos, apresentando a seguinte inscrição na lombada: GARCES Lusiadas DE Camoens. Proveniência: Biblioteca CMV & JV. José do Canto, nº 185. Palau, 41052. Biblioteca de D. Manuel II, 557.



59. CARLOS DE BRAGANÇA, D. (Rei de Portugal).- Catalogo illustrado das aves de Portugal: sedentarias, de arribação e accidentaes.- Lisboa: S. P. N., 1903-1907.- 2 vols.: il.; 31 cm.- B.

Edição original, constituída por 40 litografias representando as espécies ornitológicas, cada uma das quais acompanhadas por duas folhas com as respectivas legendas em português e francês. As estampas 1 a 9 e 11 a 13, do fascículo I e 21 a 23, do fascículo II, são aguareladas à mão; as restantes são impressas em cromolitografia. Ex-libris de Victor d’Avila Perez (nos dois fascículos) e de D. Diogo de Bragança (no fascículo I). Os dois fascículos muito limpos, conservando intactas as capas de brochura, acondicionados em caixa com formato de livro, revestida de meia-encadernação de chagrin, com casas fechadas a ouro na lombada.




133. FERREIRA, Luís Gomes.- Erario mineral dividido em doze tratados...- Lisboa Occidental: Na Officina de Miguel Rodrigues, 1735.- [44], 548 p.; 27 cm.- E.

Um dos primeiros tratados de medicina brasileira, da autoria do cirurgião Luís Gomes Ferreira (1686-1764), natural de S. Pedro de Rates (Póvoa de Varzim) que foi assistente nas minas do ouro por discurso de vinte annos, segundo consta do rosto. De facto, aos 22 anos, o autor partiu para o Brasil de onde regressou apenas em 1731. A obra, que teve segunda edição em 1755, resulta da observação directa das condições de vida dos escravos nas minas da Capitania de Minas-Gerais e apresenta a seguinte estrutura interna: Rosto (f. [1], verso em branco); dedicatória a Nossa Senhora da Conceição (f. [2]); prólogo ao leitor (f. [3 e 4]); licenças (f. [5 e 6, verso em branco]); 11 poesias dedicadas ao livro e ao seu autor (f. 7 a 13, verso em branco]); index (f. [14 a 20f]); divisão da obra (f. [20v]); proémio (f. 21 e 22, verso em branco]); seguem-se os seguintes 12 tratados (p. 1 a 488): I - Da cura das pontadas pleuriticas, e suas observaçoens; II - Das obstrucçoens; III - Da miscellania de varios remedios, assim experimentados, e inventados pelo autor...; IV - Das deslocaçoens, fracturas, e suas observaçoens; V - Da rara virtude do oleo de ouro...; VI - Dos segredos, ou remedios particulares...; VII - Dos formigueyros e outras doenças commuas nestas minas; VIII - Da enfermidade, a que chamaõ corrupçaõ do bicho...; IX - Dos resfriamentos; X - Dos danos que faz o leyte, mellado, aguardente de cana...; XI - Dos venenos e mordeduras venenosas; XII - Do escorbuto ou mal de Loanda; protestação do autor (p. [489 (seguinte em branco)]); index das cousas mais notaveis... (p. 491 a 548). Inscrição de oferta (delida) na página de rosto: Offerecido ao meu particular amigo Dr. José Fructuoso [Aires de Gouveia Osório]. Visconde de (ilegível). Exemplar levemente manuseado, com ocasionais manchas menores. Encadernação da época, inteira de carneira, cansada e com falta das guardas volantes. Inocêncio, V, p. 293. Borba de Moraes, O bibliófilo aprendiz (São Paulo, 1965), p. 18 (Grande livro é o Erário Mineral, e raríssimo!). Borba de Moraes, Bibliografia brasiliana, I, p. 307 (Much information about the daily life of the common people of the period, the maltreatment of slaves, etc., cannot be found elsewhere than this book. It is a very rare work).



173. KIRCHER, Athanasius.- ATANASII KIRCHERI | E SOC. JESU | CHINA | MONUMENTIS, | QUA | Sacris quà Profanis, | Nec non variis | NATURÆ & ARTIS | SPECTACULIS, | Aliarumque rerum memorabilium | Argumentis | ILLUSTRATA, | AUSPICIIS | LEOPOLDI PRIMI, | ROMAN. IMPER. SEMPER AUGUSTI, | Munificentissimi Mecænatis.- Amstelodami: Apud Jacobum à Meurs, in fossa vulgò de Keysersgracht, 1667.- [16], 237, [11] p.: il.; 31 cm.- E.



Edição publicada na mesma cidade e no mesmo ano da primeira (impressa por Joannem Janssonium a Waesberge & Elizeum Weyerstraet) de uma das obras emblemáticas e graficamente mais aparatosas, do célebre jesuíta alemão Athanasius Kircher (1601-1680). O autor, matemático, físico, orientalista, linguísta e alquimista, na realidade nunca viajou para fora da Europa, tendo vivido a maior parte da sua vida em Itália, onde foi professor na Universidade de Roma; só durante os seis anos que viveu em Roma, Kircher publicou nada menos do que 44 obras, versando temáticas tão diferenciadas como egiptologia, matemática, óptica, magnetismo, física, medicina, astronomia, arqueologia, etc. A edição apresenta a seguinte estrutura interna: frontispício alegórico gravado; rosto tipografado, com vinheta da Companhia de Jesus; verso com licença do Superior da Companhia, Giovanni Paolo Oliva, datada de 14 de Novembro de 1664; dedicatória ao mesmo, nas cinco páginas seguintes (f. *3, *4 e **1f); Prooemium ad lectorem (f. **1v e 2); Index capitum, quæ hoc opere continentur (f. **3 e **4f); Index figurarum (f. **4v); retrato do autor, inscrito em oval; o texto decorre de p. 1 (f. A1f) a p. 237 (f. Gg3f); Index rerum locorum memorabilium (8 p., f. Gg3v a Hh3f); Typographi lectori salutem (f. Hh3v); Elenchus librorum... (f. Hh4 f&v). O texto é intercalado com dois mapas desdobráveis e 23 gravuras a talhe-doce (duas desdobráveis) em separado, cuja colocação corresponde exactamente ao Index figurorum acima mencionado; integra ainda 59 ilustrações, igualmente a talhe-doce, a maioria de meia-página. Exemplar com ligeira acidez e leve manuseamento, mas com boas margens (corte das folhas carminado). Corte de traça afectando cerca de 25 folhas (p. 1 a 50), grande gravura desdobrável (p. 13), as duas gravuras seguintes (p. 42 e 43) e o mapa (p. 46); outros sinais de trabalho de traça afectando a encadernação e as folhas de guarda (com vestígios junto ao festo dos cadernos); manchas em cerca de 10 folhas (p. 30 a 50) e respectivas gravuras; outros restauros menores. Encadernação da época, inteira de carneira, com a lombada cansada e dano na coifa superior; decoração a seco nos planos e florões nos entrenervos. Proveniência: Biblioteca CMV & JV. Cordier (Sinica), I, 27. Sommervogel, IV, 1064.



217. MIRANDA, Francisco de Sá de.- Poesias.- Edição feita sobre cinco manuscritos ineditos e todas as edições impressas, acompanhada de um estudo sobre o poeta, variantes, notas, glossario e um retrato / por Carolina Michaëlis de Vasconcellos.- Halle: Max Niemeyer, 1885.- [2 vols.] 16, CXXXVI, 949 p., 1 f. desdobr.; 23 cm.- E.

Edição crítica, apreciada por investigadores e bibliófilos, ilustrada com um retrato do poeta. Exemplar notável por ter pertencido à autora e se encontrar repleto de correcções e anotações manuscritas (a lápis e a tinta) pelo seu punho. Inclui ainda, soltos, um postal de Carlos França, dois bilhetes-cartas de Agostinho de Campos, diversas pagelas e um recorte de jornal (colado na contracapa). Exemplar manuseado, com alguns restauros grosseiros e uma folha de índice solta. Encadernação da época, inteira de marroquim, com multipla cercadura nos planos, casas fechadas na lombada e roda nas seixas. Samodães, 2934.



230. NOBRE, António.- Só.- Paris: Léon Vanier, 1892.- [8], 157, [2] p.; 23 cm.- E.

Edição original de um dos mais emblemáticos livros da poesia portuguesa do século XIX, cuja tiragem foi limitada a 230 exemplares, impressos em papel de linho. António Nobre (1867-1900), poeta ultra-romântico e decadentista, natural do Porto, foi igualmente influenciado pelo simbolismo francês do qual foi um dos percursores em Portugal. Único livro de poesia publicado durante a curta vida autor que viria a morrer de tuberculose aos 32 anos. Exemplar com dedicatória do autor na guarda volante: Ao Sr. Doutor Antonio Candido homenagem de Antonio Nobre. Pariz, 12 de Abril, 1897. 21. rue Valette. Inclui ainda duas folhas de provas tipográficas (granel) com correcções que tudo leva a crer possam ser da mão do autor, correspondento a parte das pág. 5 e 6 (Corujas piando... — Entre herva sedenta...) e do final da pág. 8 até à 2ª linha da pág. 10 (Uzava uma bluza... — Aos tristes cazaes!).



Exemplar sem capas de brochura e levemente aparado, com prejuízo tangencial de uma letra da dedicatória. Ex-libris de Emílio Monteiro (Silva’s/Pedro de Azevedo, Maio de 1990, lote nº 1016, o mesmo exemplar) e selo branco heráldico da Casa da Calçada, em Amarante, no anterrosto. Encadernação recente, inteira de chagrin vermelho, com etiqueta de A. David (Lisboa); planos profusamente trabalhados a ouro, com cercaduras concêntricas, título gravado a ouro ao centro do plano superior (florão no posterior), roda nas seixas e na espessura das pastas e corte das folhas dourado.



297. SANTA ANA, Frei Joaquim José de, O.S.P.- Elementos de cirurgia ocular.- Lisboa: Na Officina de Simão Thaddeo Ferreira, 1793.- VIII, 279 p.: [3] gravuras desdobr.; 20 cm.- E.



 Primeiro tratado de oftalmologia e cirurgia ocular publicado em Portugal, cujo autor (1720- 1783), primeiro eremita da Ordem de São Paulo, foi lente oculista do Hospital de Real São José, em Lisboa, na primeira cadeira da especialidade criada em Portugal que veio a ser extinta após a sua morte. A base do seu trabalho, como ele próprio indica no seu prólogo, com grande isenção, foram as obras de Joseph Jacob Plenck, Doctrina de morbis oculorum (Viena, 1777) e de Louis Florent Deshais Gendron, Traité des maladies des yeux (Paris, 1770), as quais corrigiu e supriu com o que nos outros li e a minha prática me tem ensinado. A edição é ilustrada com três gravuras desdobráveis, a talhe-doce, a primeira das quais apresenta a subscrição Silva delin. — Queiroz Sculp. (Ernesto Soares, História, 1626). Primeira gravura solta, com margem exterior muito aparada, sem afectar a imagem; pertence riscado (da época) na margem inferior da página de rosto. De resto, um exemplar levemente aparado, mas limpo, revestido de encadernação inteira de carneira. Inocêncio, IV, p. 91 (indica a data de 1794, certamente por lapso). Mark Athias (Faculdade de Medicina), p. 269. Ferreira de Mira (História da Medicina Portuguesa), p. 281 (reproduz uma estampa).



365. SILVA, Alberto José Gomes da.- Regras de acompanhar para cravo, ou orgão, e ainda tambem para qualquer outro instrumento de vozes, reduzidas a  breve methodo e facil percepção.- Lisboa: na Officina de Francisco Luiz Ameno, 1758.- [8], 39, [3] p.: il., 6 gravuras, notação musical; 16 cm.- E.

Única obra impressa conhecida do autor (†1795), compositor, pedagogo, cravista e organista, de quem pouco se sabe. Segundo o Dicionário biográfico Caravelas, do Núcleo de Estudos de História da Música Luso-Brasileira (consultado em www.caravelas.com.pt), a obra [...] distingue-se no panorama setecentista da teoria musical, por ser a única publicação conhecida em Portugal dedicada exclusivamente ao baixo contínuo, e igualmente por ser a primeira obra impressa em Portugal a apresentar a regra da oitava completa. A edição é ilustrada com diversos exemplos com notação musical: seis folhas gravadas dos dois lados a talhe-doce, impressas em separado, cinco gravuras, igualmente a talhe-doce, impressas junto ao texto (p. 6, 8, 11, 12 e 14), e três exemplos compostos em tipografia (p. 2, 3 e 4). Exemplar levemente manuseado, com um rasgão reparado, sem falta de suporte, na penúltima gravura. Rosácea da p. 6 (roda dos intervalos) com falta de um círculo central móvel (volvelle). Inscrições de posse, delidas, nas folhas de guarda.

Encadernação notável, da época, inteira de chagrin vermelho, com duplas cercaduras a ouro nos planos e rectângulos centrais a ferros soltos, com florões aos cantos e ao centro; roda na espessura das pastas e corte das folhas dourado. Joaquim de Vasconcelos (Músicos), II, p. 167. Inocêncio, I, p. 24 e VIII, p. 23.



Falta agora a vossa consulta e leitura atenta deste catálogo com elevada qualidade gráfica e com descritivos bastante informativos.

Fica igualmente o convite para a vossa participação activa neste evento bibliófilo … com votos de boa sorte.


Saudações bibliófilas.


sábado, 6 de setembro de 2014

Frei Bernardo de Brito – um apontamento de “rentrée”.



Luís Moutinho da Candelabro – Livraria Alfarrabista elaborou a sua montra de Setembro e como nela figuram dois exemplares de Elogios dos Reis de Portugal de Frei Bernardo Brito, bem conhecido nas andanças bibliófilas pela sua Monarchia Lusitana, decidi investigar um pouco mais sobre este autor para se ficar a conhecer melhor o homem que por vezes é menos conhecido do que a sua obra.


Frei Bernardo de Brito, [entre 1600 e 1650?]
Autor Desconhecido - Biblioteca Nacional de Portugal

Frei Bernardo de Brito foi cronista-geral da Ordem de Cister e cronista-mor do Reino.

Chamava-se na vida civil (ou vida secular, como então se dizia) Baltasar de Brito de Andrade. Nasceu em Almeida em 20 de Agosto de 1569, sendo filho de Baltazar Freire de Andrade e Maria Da Ponte.


Placa evocativa do local de nascimento de Frei Bernardo Brito

O seu pai destinava-o para a carreira das armas, pelo que o enviou para Itália, Roma e Florença, onde estudou e permaneceu durante alguns anos.

Ingressou no Mosteiro de Alcobaça (1) em 23 de Fevereiro de 1585, onde fez os seus estudos. Tornou-se notado pelos seus conhecimentos de latim, italiano, francês e espanhol. Daqui foi para a Universidade de Coimbra onde se doutorou em Teologia a 12 de Abril de 1606.


Mosteiro de Alcobaça
(Fachada principal)

Como cronista-geral da Ordem de Cister publicou a Primeira Parte da Cronica de Cister (Lisboa, 1602). Como resultado do seu interesse pela história de Portugal e seu estudo publicou Primeira Parte da Monarchia Lusitana (1597) e os Elogios dos Reis de Portugal (1603).


Primeira Parte da Cronica de Cister
Lisboa: Pedro Crasbeek, 1602

Após o falecimento de Francisco de Andrada, cronista-mor de Portugal, foi nomeado como seu sucessor no cargo em 12 de Julho de 1614.
Já tinha saído a segunda parte da Monarchia Lusitana (1609), constituindo a nomeação régia de Filipe II (III de Espanha) e na altura também rei de Portugal, o reconhecimento oficial da obra realizada.


Filipe III de Espanha e II de Portugal a cavalo
(Pintura a óleo de Velasquez)

Principal discípulo de Paulo Orósio no âmbito da cultura portuguesa, foi o primeiro a tentar superar os limites fragmentários da crónica.

Neste contexto, Frei Bernardo de Brito iniciou um projeto para redigir uma monumental História de Portugal em oito volumes, desde as suas origens até à sua época (a Monarchia Lusitana), do qual publicou o primeiro volume em 1597 e o segundo em 1609.
Após a sua morte, a obra foi continuada até ao quarto volume por Frei António Brandão.

A Monarchia Lusitana è um projecto ambicioso, que começa com o grande dilúvio, passa pelo nascimento de Cristo e segue até à fundação da Ordem de Cister em 1098. (2)



Monarchia Lusitana – Parte Primeira
Frontispicio (3)

Sem entrar na origem e formação de Portugal o autor regista lendas e mitos, a que a fé dera veracidasde, com o intuito declarado de glorificar a nação portuguesa e de despertar os seus compatriotas da apatia em que haviam caído, desde 1580, sob o dominio filipino.
Deste modo a sua história ficou condenada a ser um repositório de mitos, não hesitando Frei Bernardo de Brito em falsificar documentos para fundamentar as suas asserções.



Monarchia Lusitana – Segunda Parte
(Exemplar da BNP/BND acessível em http://purl.pt/14094/3/#/0)

O seu principal crítico foi Diogo de Paiva de Andrade, que, ressentido por não ter sido nomeado cronista-mor do Reino (sucedendo assim a seu pai, Francisco de Andrade) publicou Exame d'antiguidades composto por Diogo de Payva d'Andrada. Parte primeyra. Repartida em doze tratados, Lisboa, na oficina de Jorge Rodrigues, 1616, onde o critica asperamente. Limitou-se apenas a visar o livro I da Primeira parte. Frei Bernardo de Brito não quis, ou não teve tempo de lhe responder, pelo que Diogo de Paiva de Andrade não prosseguiu a sua obra.
Contra Diogo de Paiva de Andrade, veio a público defendê-lo o seu confrade Fr. Bernardino da Silva que publicou a Defensam da monarchia lusitana, pelo Doutor Fr. Bernardino da Silva - 1.ª parte, na oficina de Nicolau Carvalho, Coimbra, 1620; 2.ª parte, por Pedro Craesbeeck, Lisboa, 1627, obra muito apreciada pelos críticos, pois está bem escrita em “linguagem correcta e elegante, quanto o permite o assunto; e que o autor advogou a sua causa do melhor modo que lhe era possível” (Inocêncio Francisco da Silva in Diccionario bibliographico portuguez e estudos applicaveis a Portugal e ao Brasil).



Silva, Bernardino da – Defensam da monarchia lusitana / pelo Doutor Fr. Bernardino da Silva. 
Em Coimbra: Na Officina de Nicolao Carualho, 1620-1627. 2 vol.;in  4º.
(Exemplar digitalizado da Biblioteca Digital da UCFC acessível aqui)

Embora a sua escrita fosse perfeita, como historiador a sua obra foi muito criticada, o que não admira, dada a falta de documentos históricos.

Entretanto, é acusado por historiógrafos e historiadores, principalmente a partir de Alexandre Herculano, de ter interpretado os fatos históricos à luz do misticismo e da lenda, e mesmo de ter falsificado documentos à época.


Frei Bernardo de Brito – Gravura

Até finais do século XIX, a Primeiro Parte da Monarquia Lusitana foi a principal fonte histórica em português a informar com bastantes pormenores sobre o período da pré-fundação de Portugal. Alexandre Herculano fez tábua rasa desse período histórico, considerando os fundamentos do país com a doação do condado Portucalense a D. Henrique.

António Quadros refere que “Um Garrett, um Teófilo Braga, um Oliveira Martins reagiram contra a crítica de Herculano a Frei Bernardo de Brito, se bem que não atingindo ainda onde se situava exactamente a injustiça do autor dos Opúsculos. Para o primeiro, a positividade de Herculano aniquilaria a poesia da nossa história; para o segundo, é preciso entender o valor etnológico dos mitos, expressões vivas da personalidade nacional; para o terceiro, não se faz história sem imaginação, faculdade capaz de discernir arcanos mentais e espirituais a que a razão discursiva não acede” (pp. 38-39).

Como nota final podemos seguramente afirmar que: “Por muito apreciável que seja o seu patriotismo, não há dúvida de que o método adoptado prejudicou seriamente a qualidade dos estudos históricos em Portugal.” (Eugénio Lisboa in Dicionário Cronológico de Autores Portugueses).

Frei Bernardo de Brito veio a falecer na sua terra natal em 27 de Fevereiro de 1617.

Leiam-se ainda Vida de Fr. Bernardo de Brito, Monge Cirterciense e Cronista-Mor do Reino, escrita de ordem da Academia Real das Ciências de Lisboa, por D. António da Visitação Freire (1769-1804), Cónego Regular de S. Vicente de Fora, Lente de Geografia e História Universal nas suas Reais Escolas, Correspondente do Número da Academia Real das Ciências e Sócio da Sociedade Real Marítima, para servir de Preliminar à reimpressão (em 1806) da Monarchia Lusitana na versão digitalizada da Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes aqui:



e o Elogio do Doutor Frey Bernardo de Brito, Religioso de Cister e Chronista Mor de Portugal, em Notícias de Portugal, escritas por Manuel Severim de Faria, acrescentadas pelo Padre D. José Barboza, na Oficina de António Isidoro da Fonseca, Lisboa, 1740. (págs. 430-440) na versão digitalizada da Biblioteca Nacional de Portugal/Biblioteca Nacional Digital aqui:




Bibliografia:

Sílvia de Lisardo [obra poética] (Lisboa, 1597)
Monarchia Lusitana (1597 e 1609)
Primeira Parte da Crónica de Cister (Lisboa, 1602)
Elogio dos Reis de Portugal (Lisboa, 1603)



BRITO, Bernardo de – Siluia de Lysardo em que ha varios sonetos & rimas : com a segunda parte do sonho de Chrisfal. - Agora nouamente impressa & posta em ordem.
Em Lisboa: por Alexandre de Siqueira, 1597. - [4], 76 f.; in 8º
(Exemplar da BNP/BND acessível em http://purl.pt/15116/3/#/0)


Vejamos então o que a Candelabro – Livraria Alfarrabista nos propõe:



3267. BRITO (FR. BERNARDO DE) - ELOGIOS HISTORICOS// DOS// SENHORES REIS// DE PORTUGAL,// Escritos// Por Fr. BERNARDO DE BRITO,// Chronista Geral, e Monge da Ordem// de S. Bernardo,// e modernamente addicionados// pelo PADRE D. JOSÉ BARBOSA,// (...)// Nova ediçaõ. LISBOA. Na Typographia Rollandiana. 1825. In-8º de 159-IX págs. Enc.

Obra muito estimada de Fr. Bernardo de Brito (1569-1617) e publicada pela primeira vez por Pedro Craesbeeck em 1603. A presente edição foi acrescentada pelo padre D. José Barbosa (1674-1750), passando a incluir os monarcas desde o Conde D. Henrique até D. João V.
Do "Prologo do Editor": "Quasi todas as Nações tem o costume de reimprimir aquellas Obras de que se possa tirar fructo, e utilidade. Animado deste zelo intentei reimprimir estes Elogios Historicos dos Senhores Reis de Portugal; porque em tão pequeno Volume se acha em resumo quasi toda a nossa Historia Portuguesa; serve este Compendio de muita utilidade; porque quem naõ pode abranger toda a nossa Historia pelos numerosos Volumes em que está escrita, (posto que modernamente se acha mais methodica na de Mr. La Clede, e a de nosso incansavel Portuguez Damiaõ de Lemos Faria, e Castro) achará neste livro com que possa conhecer o que nós somos, e poderemos ser, se imitarmos as Virtudes, e Façanhas, que nos ditos Elogios se louvaõ, e narraõ."
Boa encadernação, recente, com lombada e cantos em pele.
Exemplar em bom estado de conservação, com alguma natural acidez devido à qualidade do papel e à idade da obra. Sem qualquer assinatura de posse, humidades ou vestígios de xilófagos.
Bastante invulgar.



3522. BRITO (FR. BERNARDO DE) - ELOGIOS// DOS REYS DE PORTUGAL// COM OS MAIS VERDADEYROS RETRATOS, QUE SE PUDERAÕ ACHAR. Ordenados por// Fr. BERNARDO DE BRITO// Chronista geral, e Monge da Ordem de S. Bernardo.// Agora novamente addicionados// pelo// P. D. Joseph Barbosa// Clerigo Regular da Divina Providencia, Chronista da Serenis-// sima Caza de Bragança.// (...) LISBOA ORIENTAL.// Na Officina FERREYRIANA.// M.DCC.XXVI.// Com todas as licenças necessarias. In-8º de X-246 págs. de texto + 25 gravuras em folhas à parte. Enc.

Obra muito estimada de Fr. Bernardo de Brito (1569-1617) e publicada pela primeira vez por Pedro Craesbeeck em 1603. A presente edição foi acrescentada pelo padre D. José Barbosa (1674-1750), passando a incluir os monarcas desde o Conde D. Henrique até D. João V.
Ilustrado com 25 belas gravuras relativas aos 25 primeiros monarcas portugueses.
Exemplar em bom estado de conservação, com o papel ainda firme e sem vestígios de humidades, sublinhados e assinaturas de posse. Tem 2 ínfimos furos de traça que trespassam todo o volume, mas sem nunca ofender a mancha tipográfica. A encadernação e as folhas de guarda estão em sofrível estado de conservação, já algo atacadas pela traça.
Encadernação setecentista, inteira em pele, com gravados a ouro.



FREI BERNARDO DE BRITO (E OUTROS) - MONARCHIA | LVSYTANA | [...] | PARTE PRIMEIRA | que contem as historias de Portugal desde a cria- | ção do mundo te o nacimento de nosso sñor | IESV CHRISTO | [gravura] | DIRIGIDA AO CATHOLICO REI DÕ PHILIPPE * | II DO NOME REI DE… (3)

Espero ter-vos traçado um esboço bio-bibliográfico deste historiador português, que embora muito justamente criticado, iniciou um trabalho que se poderá considerar pioneiro entre nós.

Saudações bibliófilas.


Notas:

(2) Dentro desta perspectiva, a Primeira Parte da Monarquia Lusitana, contém as histórias de Portugal desde a criação do mundo até o nascimento de nosso senhor Jesus Cristo e a Segunda Parte da Monarquia Lusitana em que se continuam as histórias de Portugal desde o nascimento do nosso salvador Jesus Cristo até ser dado em dote ao Conde Dom Henrique.
(3) Lote 348 do leilão de Antiguidades e Obras de Arte realizado em 27 e 28 de Maio de 2013 por Cabral Moncada Leilões e que pode ser consultado aqui.


Fontes consultadas:

Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes

Dicionário Cronológico de Autores Portugueses. Volume I. [Coordenação de Eugénio Lisboa]. Mem Martins, Publicações Europa-América/Instituto Português do Livro e da Leitura, s.d.[1989]. 2ª edição. in 8º. 648 (2) páginas.

Frei Bernardo de Brito – Projecto Vercial

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