Portugal conhece a Imprensa em 1487.
Durante muito tempo foi considerado com o primeiro livro impresso em português a «Vita Christi», em 1495, até que V. Pina Martins, em 1965, dava a conhecer o «Tratado da Confissom», impresso em Chaves.
Rosemarie Erika Horch, do Brasil, tenta provar que afinal foi o «Sacramental» de Clemente Sanchez Vercial, uma vez que se poderia reconstituir o seu colófon, por informação bibliográfica posterior, e atribuindo-lhe a data de impressão em Chaves a 18 de Abril de 1488.
O «Sacramental», obra pastoral redigida entre 1421 e 1425 em língua castelhana, trata da forma como deve viver o homem medieval, abordando a alimentação, as relações familiares, as relações sociais, a relação com Deus, o trabalho, o descanso, a saúde, a doença e a sexualidade, faz dele um documento indispensável para o estudo da sociedade medieval portuguesa, foi um dos livros mais lidos durante o século XV.
Foi proibido pela Inquisição no século XVI e consequentemente queimado. Teve várias edições impressas em língua castelhana e portuguesa.
O «Sacramental» de Clemente Sánchez de Vercial, obra pastoral redigida entre 1421 e 1425 em língua castelhana, depois dos livros destinados ao ofício religioso, foi o livro mais impresso na Península Ibérica, desde a introdução da imprensa até meados do século XVI.
Das edições em português, duas foram impressas no século XV (Chaves, 1488 (?); e Braga (?), ca. 1494-1500 e duas no século XVI (Lisboa, 1502; e Braga, 1539).
Mas já antes se conhecia o «Pentateuco», de Faro, impresso por Samuel Porteira Gacon em 1487.
«Sacramental» de Clemente Sánchez de Vercial (edição de 1539)
Frontíspicio
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«Sacramental» de Clemente Sánchez de Vercial (edição de 1539)
Página interior
Não existe qualquer dúvida de que os hebreus foram os primeiros impressores em Portugal.
Desde 1487, quando se imprimiu, em Faro, o «Pentateuco» hebraico, até à expulsão dos judeus por D. Manuel, I em Dezembro de 1496, imprimiram-se vários livros hebraicos.
O primeiro judeu a fugir de Espanha foi Samuel Gacon que se fixa em, Faro. E a razão é fácil de descobrir. Em Espanha, após a publicação do Manual inquisitorial de Torquemada (1484), advinhou-se a perseguição aos judeus.
Um judeu atento deveria pôr-se a caminho ... e foi o que Gacon fez!
De Sevilha, no sul de Espanha, romou a Faro, no sul de Portugal. Faro era então a primeira povoação portuguesa importante, quase na fronteira, e porto de mar movimentado quer para o comércio com Espanha e o Mediterrâneo quer para o norte de África. Foi por aqui que entraram os impressores judeus, os quais, depois avançaram para Lisboa e Leiria.
Eles procuraram, sobretudo, cimentar a sobrevivência da sua religião e da sua cultura ameaçadas. O tempo de perseguições, que se desenhava no horizonte, não lhes permitiu abrir-se com interesses económicos, facilmente previsíveis, à impressão de obras pragmático-funcionais em latim e em português. A tipografia aparecia como um instrumento de defesa na prática judaizante e de propaganda proselitista; ela funcionava como um talismã esotérico para consumo interno e fortalecimento dos judeus.
No que se refere a Chaves é difícil de se entender. Chaves era e é povoação fronteiriça, mas não foi sede primeira de imprensa em português por ser lugar de passagem e albergaria de peregrinos para Compostela. De facto, o arcebispo de Braga, D. João Peculiar (c.a de 1175) ali construíra uma albergaria para peregrinos de São Tiago. Ora se os livros se destinavam ao clero e não aos peregrinos, tal impressão só se entende pela acção dos arcebispos de Braga. A razão da sua impressão em Chaves dever-se-ia à facilidade de fazer vir ali, mesmo na fronteira, impressores itinerantes de Espanha. Portanto nada custa a aceitar que o arcebispo de Braga por meio dos clérigos da Colegiada de Chaves, criada em 1434 pelo arcebispo D. Fernando Guerra, se tenha servido de impressores de Oviedo (conforme opina o Prof. Dr. José Marques) fazendo-os vir à cidade fronteiriça de Chaves. Deste modo a maior e melhor diocese de Portugal fazia a descoberta da imprensa que, no ano anterior, chegara a Faro, e punha-a, desde logo, ao serviço da religião e da pastoral da fé.
Como já foi dito, os impressores judeus estavam distribuídos por três centros:
Faro(1487-1492):
Samuel Porteira Gacon – «Pentateuco» (1487) e «Talmud» (1492?)
Lisboa (1489-1492):
Elieser Toledano (judeu vindo de Toledo) – «Comentário ao Pentateuco» (1489); «Comentário à Ordem das Orações» (1490?); «Caminhos do Mundo», «Livro do Temor», «Segredos da Penitência» (1490?): «Pentateuvco» (7 de Agosto de 1491); «Provérbios de Salomão» (1492?) «Isaías e Jeremias» (1492) «Leis da Matança» (1492?)
Leiria (1492-1496):
Samuel d’Ortas (provavelmente oriundo de França) e seus filhos – «Provérbios de Salomão» (25 de Julho de 1497), «Profetas Primeiros» (26 de Janeiro de 1497) e «Caminho da Vida» (12 de Junho de 1495)
Todos estes judeus vêm certamente de Espanha fugidos à Inquisição de Fr. Tomás de Torquemada.(1486) que já em 1484 publicara o 1º código inquisitorial de claro pendor anti-judeu. Aliás, o acontecimento decisivo para a sua vinda para Portugal deve ter sido a perseguição dos Reis Católicos (1487).
O rabi Elieser Toledano foi o tipografo que mais livros imprimiu em Portugal e trás no sobrenome a matriz da sua proveniência. Parece mesmo que estava, desde 1485, ligado aos impressores de Hijar (Aragão).
Todos imprimiram em hebraico e só Abraão d’Ortas imprimiu em latim o «Almanach perpetuum» (1496) do judeu Abraão Zacuto.
É evidente a temática religiosa dos livros impressos em hebraico.
Nos primórdios da imprensa predomina na Europa os incunábulos latinos. Este predomínio do latim explica-se facilmente pelo gosto clássico do Renascimento e pela influência da Igreja que fazia do latim a sua língua oficial. As línguas vernáculas europeias ainda estavam no período de formação e afirmação pelo que não se prestavam para divulgação das ciências do tempo.
Neste capítulo, destacam-se dois impressores alemães, que já imprimiam em latim, João Gherline era um tipografo itinerante que trabalhou em sucessivamente Barcelona 1496, Galiza, Braga, 1492-1494 e Salamanca.
Valentim Fernandes de Morávia, veio de Sevilha (1493) e demorou-se longamente em Portugal. Ao seu serviço terá ido a África e morreu em 1519. Foi o único alemão que adaptou o seu nome ao idioma português. A ele se deve «Vita Christi» de Ludolfo da Saxónia, impresso a expensas da rainha D.ª Leonor, viúva do rei D. João II. É considerado o mais belo incunábulo em língua portuguesa. Em 1512 imprimiu as «Ordenações» do rei D. Manuel I.
«Vita Christi» de Ludolfo da Saxónia
É aqui que nos aparece o primeiro impressor português, Rodrigo Alvares, natural de Vila Real, mas a exercer na cidade do Porto.
A 4 de Janeiro é publicado, no Porto, o primeiro livro totalmente português. Trata-se das «Constituições que fez o Senhor Dom Diogo de Sousa, Bispo do Porto» livro produzido pelo primeiro impressor português: Rodrigo Álvares.
«As Constituições que fez ho Senhor dom Diogo de Sousa», acabadas pelo «mestre de emprentar livros» em 4 de Janeiro de 1497, são uma impressão com 32 fólios.
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«Constituições que fez o Senhor Dom Diogo de Sousa, Bispo do Porto»
Os incunábulos portugueses e latinos têm, mais uma vez se deve realçar, um caracter religioso: devocional, litúrgico, moral e jurídico. Só o «Almanach perpetuum» de Abraão Zacuto podia apresentar algum interesse para o espírito geográfico-cientifico que então animava os portugueses.
Quanto aos patrocinadores das edições aparecem bispos diocesanos, os Estudos Gerais e particulares; o rei e a coroa mal aparecem.
A ideologia religiosa promoveu a Imprensa em Portugal, mas também a ideologia religiosa a limitou e cerceou.
No entanto, são deste período, alguns dos exemplares de melhor aspecto e qualidades gráficas que se produziram em Portugal.
Nos finais do século XVI e início do século XVII a Imprensa vai conhecer um período menos opulento.
Bibliografia:BESSA, Paula Virgínia de Azevedo – «Pintura Mural na Igreja de Nossa Senhora da Piedade de Meijin»
DIAS, Geraldo A. J. Coelho – «A Ideologia Religiosa e os Começos da Imprensa em Portugal»
Veja-se como complemento e documentação gráfica:
http://tipografos.net/historia/imprensa-em-portugal.html
Saudações bibliófilas.