É um enredo que não saindo da temática principal – fanatismo religioso e cangaceiros – podemos ver uma galeria de personagens e histórias paralelas que nos prendem a atenção de tão bem descrita e interligada. A obra é tão valiosa que até os personagens secundários aparecem, psicologicamente, bem desenvolvidos e trabalhados.
Padre Amâncio que foi jovem para Açu, com sonhos de tudo mudar, é o personagem central que dava lugar, algumas vezes à Antônio Bento Vieira, ajudante do padre que a mãe deixou para que o mesmo se fizesse padre também, mas que não houve dinheiro para que tal se concretizasse. Aliás, quem tinha dinheiro em Açu era só Clarimundo, além do comércio, o algodão também lhe dava lucros.
O Major Evangelista, um fiscal que perdeu a esposa e vivia com a sua filha Dona Fausta, uma personagem psicológica de solteirona, que vivia de fazer bordados para fora de Açu e que tinha ataques por falta de sexo/homem. Há também uma descrição sexual, bem atrevida para a época. quando Dona Fausta passa a sonhar e a desejar Antônio Bento, cena em que ela o pega de jeito, mas que não se repete. Aliás Bentinho não era de mulheres, nem o seu irmão Domício.
Açu conhecia a maldição de Pedra Bonita, uma cidade onde homens milagrosos queriam ser como Jesus e Padre Cícero, que levavam o povo às alucinações e fanatismo, a ponto de largar tudo na vida e ir para lá. Cidade com duas pedras enormes como se fossem duas torres de igreja. Açu rejeitava todos os moradores de Pedra Bonita.
A temática sacra é sem dúvida uma das principais, com referência ao fanatismo das religiões incluindo o catolicismo: Ainda que exalte o Padre Cícero por enfrentar bispos e continuar a realizar os seus milagres, exalta também, a figura do padre comum, mas santo, que vive para os pobres, sem vaidade e sem ambição.
Açu era o lugarejo onde despejavam o que se dizia ser o lixo da sociedade. Ali, nem o caminho de ferro conseguiu chegar, pois no dia em que os engenheiros ali apareceram foram destroçados pelo chefe dos cangaceiros, irmão de Bentinho – Aparício.
Pedra Bonita do Araticum com sua lenda da mulher linda que chama os homens para o abismo, também era a pedra dos milagres e dos fanáticos que matavam. Num todo, o romance é a descrição de um mundo rural Nordestino, onde cidades são esquecidas pelo Governo, um mundo de contínua fuga voltando sempre para suas raízes: a religião.
Num discurso indirecto são muitas e muitas cenas diferentes e tantos personagens que não se pode de todos falar.
No sertão são três as vozes de comando, o padre, os cangaceiros e o governo quando sente necessidade de intervir, no mais é uma injustiça sem fim e um morrer sem pedir.
A repetição de cenas descritas é um recurso relevante do autor para que o leitor não se perca e o narrador omnisciente fala por todos e a moda viola, os repentes, as canções que narram as histórias tristes do cangaço, são os atavios que dão ao romance o uso da meta-linguagem com uma grande riqueza descritiva.
José Lins do Rego – “Riacho Doce”. Romance.
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1939. 1ª edição. Capa de Santa Rosa. Encadernação original brochura. 372 pp. (R$ 100,00/145,00)
Tiragem especial, fora do comércio, de 10 exemplares em papel Royal E. F., numerados e assinados pelo autor.
Riacho Doce não repete nenhuma das obras anteriores do seu autor, mas mantém todas as características do escritor com a sua linguagem saborosa e colorida no seu estilo de possante contador de estórias; o documentador profundo e essencial da civilização e da mentalidade nordestina; o mais fecundo inventor de casos e de almas.
O estilo de José Lins do Rego neste romance é uma manifestação soberba de naturalidade e de intimidade com a natureza ou integração na própria natureza exterior. E há que se salientar o processo de análise psicológica, que consiste na repetição sistemática de certos dados. A figura da Mãe Aninha é perfeita como observação da psicologia supersticiosa. Esta e Nô saltam diante dos nossos olhos como criações exactas, inesquecíveis.
Há aqui um fundo lirismo tropical, um instintivismo, um calor humano, um sopro de poesia genuína que faz deste romance de 1939 uma afirmação plena de maturidade artística.
Em Riacho Doce, José Lins une amor e petróleo. Um casal de suecos vem para o Brasil, para Alagoas, e a loura Edna/Eduarda se extasia com a força tropical do Brasil, que ela descobre. Apaixona-se por um mestiço nordestino, Nô, uma das figuras mais empolgantes de toda a ficção de Lins do Rego. O amor de Edna e Nô é o núcleo deste romance. A sueca misteriosa vem descobrir sensualmente a força telúrica do Nordeste rústico, o ritmo popular, os sabores e os cheiros, as formas, as cores, a vida intensa de uma região que é o mundo perene desse grande narrador em contacto amoroso com a vida.
José Lins do Rego dá-nos nesta obra a sua visão possante dos desequilíbrios sociais e dos dramas humanos individuais e colectivos, provocados pelo problema do petróleo em Alagoas. Tudo decorre deste trágico problema da vida contemporânea no Brasil dessa época.. As marés sucessivas de entusiasmo, de desapego às tradições, provocadas pelo engodo da riqueza, e das desconfianças supersticiosas e as cóleras nascidas das desilusões naquela mansa terra de pescadores, são descrições de psicologia colectiva das mais vivas e reais que o romancista fez.
E páginas como a descrição dos primeiros tempos de Edna no Riacho Doce ou capítulos como o do estouro da Mãe Aninha, em que a maldição é criada com uma intensidade trágica maravilhosa, são verdadeiramente trechos geniais.
José Lins do Rego – “Água Mãe”. Romance.
Rio de Janeiro, Organização Simões, 1941. 1ª edição. Introdução de Álvaro Lins e Roberto Alvim Corrêa, com ilustrações em preto e branco de Luis Jardim. 345 pp. (R$ 90,00/100,00)
Prémio Felipe d’Oliveira (1941).
Este é o primeiro romance de José Lins do Rego, que não tem como cenário o Nordeste, e sim Cabo Frio, no Rio de Janeiro. Apresenta a história de três famílias, que seriam a representação de três camadas sociais diferentes: a família rica, a família média e a família pobre e de criaturas que desejam fugir das suas condições naturais, que procuram desligar-se dos seus círculos sociais.
José Lins do Rego – “Fogo Morto”. Romance.
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1943. 1ª edição. Prefácio de Otto Maria Carpeaux. 363 pp. (R$ 90,00 / 250,00)
Como romance de feição realista, esse livro procura penetrar a superfície das coisas e revelar o processo de mudanças sociais por que passa o Nordeste brasileiro, num largo período que vai desde o Segundo Reinado, incluindo a Revolução Praieira e a Abolição, até as primeiras décadas do século XX.
O tema central de Fogo Morto é o desajuste das pessoas com a realidade resultante do declínio do esclavagismo nos engenhos nordestinos, nas primeiras décadas do século XX. O romance conta a história de um poderoso engenho – Engenho Santa Fé localizado na zona da Mata da Paraíba – desde a sua fundação até o declínio, quando se transforma em "fogo morto", expressão com que, no Nordeste, se designam os engenhos inactivos.
É considerado a obra-prima de José Lins do Rego.
José Lins do Rego – “Pedro Américo”. Conferências.
Rio de Janeiro, CEB – Livraria Editora da Casa do Estudante do Brasil, 1943. Coleção Conferências – Série Maná . 1ª edição.
(nenhum exemplar encontrado)
José Lins do Rego – “Gordos e Magros”. Artigos.
Rio de Janeiro, Livraria Editora da Casa do Estudo, 1943. Coleção Ensaios.1ª edição. Encadernação original brochura. 351 pp.(R$ 175,00 / 350,00)
José Lins do Rego – “Poesia e Vida”. Ensaios.
Rio de Janeiro, Editora Universal, 1945. 1ª edição. Capa de Geraldo de Castro. Encadernação original brochura. 261 pp.(R$ 350,00)
Trata-se de um dos livros mais difíceis da bibliografia do autor.
José Lins do Rego – “Conferência no Prata: tendências do romance brasileiro – Raul Pompeia e Machado de Assis”. Conferências.
Rio de Janeiro, CEB – Livraria Editora da Casa do Estudante do Brasil, 1946. Coleção Conferências – Série Maná n.º 17. 1ª edição. Encadernação original brochura. 105 (2) pp.(R$ 45,00)
Edição das conferências lidas no Colégio Livre de Estudos Superiores, de Buenos Aires, em Outubro de 1943. Contem referências interessantes para a história da literatura brasileira.
José Lins do Rego – “Euridice”. Romance.
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1947. 1ª edição. Capa de Santa Rosa. Encadernação capa dura com sobrecapa. 284 pp.(R$ 75,00)
Prémio Fábio Prado (1947).
José Lins do Rego – “Bota das Sete Léguas”. Viagens.
Rio de Janeiro, Editora A Noite, 1947. 1ª edição. Encadernação capa dura com sobrecapa. 194 pp. (R$ 60,00/80,00)
José Lins do Rego – “Homens, Seres e Coisas”
Rio de Janeiro, Ministério Educação Saúde, 1952. Os Cadernos de Cultura. 1ª edição. Encadernação capa dura.. 77 pp. (R$ 8,00)
José Lins do Rego – “Cangaceiros”.
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1953 1ª edição. Romance. Capa de Santa Rosa. Encadernação original brochura com sobrecapa.. 315 pp. (R$ 40,00 / 100,00)
O romance Cangaceiros dá continuidade a história da família de Bento, da obra Pedra Bonita, depois que os beatos são dizimados pelas tropas.
"Volto hoje às minhas criaturas, aos rudes homens do cangaço, às mulheres, aos sertanejos castigados, às terras tostadas de sol e tintas de sangue, ao mundo fabuloso do meu romance, já no meio do caminho.".
A história desenvolve-se entre a vida de Bento, a sua amizade com os vizinhos, o seu namoro com Alice, a notícia das aventuras do irmão, as pragas da mãe que enlouquece, e a esperança de Custódio em ter vingada a morte do filho pelos cangaceiros.
A angústia brasileira determinada pela queda do colonialismo, a industrialização incipiente, a ânsia de renovação. Esses são os temas centrais desta obra que completa o ciclo "O Cangaço" de José Lins do Rego.
José Lins do Rego – “A Casa e o Homem”.
Rio de Janeiro, Organização Simões, 1954 1ª edição Colecção Rex vol. 4 . Brochura com sobrecapa. 230 pp. (R$ 50,00)
José Lins do Rego – “Meus Verdes Anos”. Memórias.
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1956, 1ª edição. Encadernação original brochura. Ilustrações de Luís Jardim. 351 pp. (R$ 90,00)
José Lins do Rego – “Gregos e Troianos”.
Rio de Janeiro, Livraria São José, 1957. 1 ª edição. Encadernação original brochura. 182 pp. (R$ 40,00 / 65,00)
José Lins do Rego – “Presença do Nordeste na Literatura Brasileira”.
Rio de Janeiro, Ministério Educação Saúde, 1957. Os Cadernos de Cultura. 1ª edição.. (R$ 180,00)
José Lins do Rego – “O Vulcão e a Fonte”. Crónicas, ensaios e notas de viagem.
Rio de Janeiro, Edições O Cruzeiro, 1958. 1ª edição. Encadernação original da editora. 315 pp. (R$ 75,00)
José Lins do Rego – “Dias Idos e Vividos”.
Rio de Janeiro, Editora Nova Fronteira, 1981. 1 ª edição. Encadernação original brochura. 460 pp. (R$ 40,00)
Com este artigo completo o ciclo sobre José Lins do Rego, escritor brasileiro com uma vasta produção literária na qual traça o retrato de uma das páginas importantes da própria história do Brasil.
Merece ser lido, para isso basta uma edição qualquer, mas para os apreciadores justifica ser coleccionado, aqui sim as 1ª edições são fundamentais.
Saudações bibliófilas
(1) Fiz uma busca exaustiva na
Estante Virtual para ajuizar da oferta das 1ª edições dos livros de José Lido Rego, visto esta ser a maior rede de “sebos” do Brasil. Claro que outras fontes foram estudadas, mas esta foi a principal.
Tomei como referência os descritivos elaborados pelos diversos “sebos”, confrontando-os com os da Biblioteca Nacional do Brasil mas procedi a uma homogeneização dos diversos critérios para dar a informação mais detalhada possível.
Os preços aqui referidos reflectem os que aqui se praticam, mas quando há grande disparidade coloquei os valores mínimo e máximo.
Estas disparidades nem sempre correspondem ao estado do livro, pelo que se deverá pensar em critérios específicos dos seus vendedores ou a procura mais intensa em certos Estados no Brasil. (a resposta pertence-vos...)
Uma palavra muito especial para “O Buquineiro” (categoria: Livreiros virtuais) pelo seu grande acervo em livros deste autor e, do qual, utilizei algumas das suas fotografias das capas dos livros, em 1ª edição, pelo que deixo aqui o meu agradecimento especial.