segunda-feira, 28 de abril de 2014

5.º Aniversário da “Tertúlia Bibliófila” – Um apontamento a propósito do Catálogo da Cólofon - Livros Antigos de Abril.



Norman Rockwell, Boy Reading Adventure Story
© 1923 SEPS: Licensed by Curtis Publishing, Indpls, IN. All rights reserved.

Passa hoje mais um aniversário deste espaço de conversas em torno dos livros – o 5.º – pelo que, e antes de mais, quero agradecer todo o apoio que me tem sido dado, quer de maneira silenciosa, ao constatar o número de páginas lidas diariamente, quer de modo mais activo, pelos comentários aqui deixados ou pelos apontamentos publicados noutros espaços.

Mais do que o número de seguidores, que apesar de representarem para mim um motivo de orgulho, não quero deixar de referir todos aqueles que por aqui passaram em busca de uma informação escrita ou de uma simples pista para uma consulta mais aprofundada … se o tiver conseguido foi precisamente esse o meu objectivo.

Só esse vosso apoio me leva a continuar este meu modesto contributo para a divulgação do livro e da bibliofilia.

A ilustração que abre este apontamento simboliza toda a beleza da literatura – como ao ler um livro uma criança (neste caso … pois que isso se aplica a qualquer um de nós) consegue imaginar todo um mundo repleto de aventuras.

Mas voltemos à nossa “aventura”.

O Catálogo da Cólofon – Livros Antigos que me foi enviado recentemente veio mesmo a propósito.



Nele vamos encontrar alguns opúsculos que se integram numa polémica famosa que “fez correr muito tinta” na época pelo que vieram a lume muitas e variadas publicações –  refiro-me à polémica “Eu e o Clero” que envolveu Alexandre Herculano.

Já aqui se deu notícia deste escritor em Alexandre Herculano – II Centenário do seu nascimento: um esboço biobibliográfico e onde escrevi sobre esta polémica:

O seu objectivo era descobrir as raízes de Portugal. "Ele encarava a História como uma missão". E encontrar as raízes do seu país era a sua. Precisava de ter resposta à questão: "Portugal é um país viável ou não?"
O objectivo seguinte passava por "dotar a Historiografia de uma aplicação cívica. Teve resultados geniais", comenta ainda Luís Amaral. Herculano não procurava soluções antigas para problemas do seu tempo, antes conhecimento para fundamentar a sua intervenção social e política.
Contudo, mesmo acedendo à informação de forma especial, exigia-se tempo, muito tempo, para organizá-la e analisá-la. E a dúvida persiste: Como pôde criar uma obra "genial" em tão pouco tempo e repartindo-se por tantas actividades? Talvez o facto de ser "profundamente inteligente, lúcido e muito rigoroso consigo próprio" lhe garantisse uma disciplina invulgar para dedicar-se tanto a uma paixão, que fosse capaz de a revolucionar.


Alexandre Herculano

e mais adiante:

Foi precisamente por essa altura que se envolveu numa polémica com o clero, ao questionar o milagre de Ourique.
Atacado do púlpito, o historiador viu-se obrigado a defender a sua posição em opúsculos que ficaram célebres pelo rigor lógico da argumentação, pelo seu saber e pelo vigor polémico: «Eu e o Clero» e «Solemnia Verba» (1850).

Neste espaço os textos e a referência a livros não surgem desfasados uns dos outros. Procuro sempre dar uma sequência que permita compreender melhor o contexto em que surgiu a obra ao se conhecer um pouco melhor o seu autor.

Neste novo Catálogo de Livros, Periódicos e Ephemera de índole política (as datas extremas para os lotes apresentados vão de 1 de Janeiro de 1822 a 26 de Abril de 1974) vamos encontrar duas obras que se integram nesta temática:



9 – RECREIO (FRANCISCO), - A BATALHA DE OURIQUE E A HISTÓRIA DE PORTUGAL DE A. HERCULANO. CONTRPOSIÇÃO CRITICO-HISTÓRICA. Lisboa. Na Typographia da G.M. Martins. 1854 – 1856. 6 vol (com 67, 78, 79, 64, 55 e 65 págs). 20cm. B.

Quando Alexandre Herculano, na sua “História de Portugal”, retira a intervenção divina (o aparecimento de Cristo) da Batalha de Ourique, inicia-se uma nova batalha que, desta feita, opõe Herculano ao Clero e que dá origem a uma nova guerra que ficaria conhecida como “Eu e o Clero”.
É no contexto desta polémica, e como resposta a Herculano, que são dados à estampa estes seis opúsculos da autoria do Padre Francisco Recreio. Sobre a sua qualidade e natureza diz-nos Innocêncio Francisco da Silva, no seu “Diccionário Bilbliográphico Portuguez”: “Seria para desejar, por honra das letras, e por dignidade própria do auctor, que n'estes escriptos elle guardasse um termo mais decoroso, e não se transviasse a cada passo em manifestações de ódio e resentimento pessoal contra o seu contendor. Se tivesse poupado uma infinidade de epithetos injuriosos, e evitado a inconveniência da fôrma que empregou, em assumptos que pediam maior decência, e discussão mais pausada e serena, conseguiria sustentar melhor a sua causa, reforçando com vantagem os seus argumentos e provas. No modo como obrou, bem longe de convencer os adversários, tornou-se indesculpável alé áquelles de sua parcialidade, que por mais sisudos avaliavam devidamente o perigo de collocar a questão sob condições tão desfavoráveis.”
Todos os exemplares se encontram em perfeito estado de conservação, com a excepção do quinto, que apresenta uma pequena falha na parte superior da lombada. Miolo em irrepreensível (os livros estão por abrir).

10 – HERCULANO, (ALEXANDRE) – A REACÇÃO ULTRAMONTANA EM PORTUGAL OU A CONCORDATA DE 21 DE FEVEREIRO. Lisboa. Na Typ. de José Baptista Morando. 1857. 56 págs. 22cm. B.

Neste opúsculo Herculano trata da problemática relacionada com a Concordata de 21 de Fevereiro, celebrada entre Portugal e a Santa Sé na qual, na opinião do autor e como se veio a verificar continha “disposições altamente desvantajosas para Portugal e até offensivas das doutrinas disciplinares da igreja”.
De acordo com os estudos da Doutora Maria de Fátima Bonifácio (ver Análise Social nº XXXV), “Herculano, velho liberal e velho católico, chocado e revoltado com a prepotência da cúria romana, que ele interpretava como o sintoma de um imperialismo papal destinado a subjugar as igrejas nacionais e a restabelecer o domínio clerical sobre a sociedade, deu largas à sua indignação num opúsculo intitulado “A Reacção ultramontana em Portugal ou a concordata de 21 de Fevereiro de 1857 A imprensa histórica, fazendo-se eco das acusações lavradas pelo erudito historiador e eminente liberal, contribuiu para atiçar um clima de exaltado nacionalismo anti-romano que tornou problemática a aprovação parlamentar da concordata”. Apesar de toda a polémica e dos esforços de Herculano, a Concordata seria aprovada. As suas consequências políticas marcaram a História de Portugal neste período.
Exemplar em bom estado de conservação. Falha na parte inferior da lombada. Capas de brochura em bom estado de conservação

Mas poderemos ainda encontrar no mercado bibliófilo:



FRANCISCO RECREIO – Justa Desaffronta em Defeza do Clero, ou Refutação Analytica do Impresso Eu e o Clero, Carta ao Em.º Cardeal-Patriarcha por A. Herculano. Lisboa, Typographia de Antonio José da Rocha, 1850. 1.ª edição. 20,5 cm x 13,2 cm. 128 págs.

Exemplar em bom estado de conservação; miolo irrepreensível.
É a primeira peça de vulto no conjunto de autores que contestaram as posições históricas de Alexandre Herculano relativamente ao dito “milagre” de Ourique. Anunciada na imprensa periódica da época como obra de génio destinando-se a rebater ponto por ponto o historiador, afinal não passou de «[...] um grande bluff. A obra nada tinha de científico, apenas camuflava erudição e saber [...]» de um padre (ver Jorge Custódio / José Manuel Garcia, Opúsculos IV, Editorial Presença, Lisboa, 1985).



A.[LEXANDRE] HERCULANO. [Miscelânea]. Lisboa, 1850-1851 Imprensa Nacional.1.ª edição [excepto a primeira brochura (2.ª edição)]. 5 brochuras em 1 volume. 20 cm x 13,5 cm. 20 págs. + 18 págs. + 68 págs. + 32 págs. + 36 págs.




Títulos individuais:
[1] Eu e o Clero – Carta ao Em.º Cardeal-Patriarca
[2] Considerações Pacificas sobre o opúsculo Eu e o Clero – Carta ao redactor do periodico A Nação
[3] Solemnia Verba – Cartas ao Senhor A. L. Magessi Tavares sobre a questão actual entre a verdade e uma parte do clero
[4] A Batalha d’Ourique e a Sciencia Arabico-Academica – Carta ao redactor da Semana
[5] Da Propriedade Litteraria e da recente convenção com França – Carta ao Senhor Visconde d’Almeida-Garrett



Encadernação da época, meia-inglesa em pele e papel de fantasia com gravação a ouro na lombada pouco aparado, sem as capas de brochura
Exemplar bem conservado; miolo limpo
Peça de colecção.

Estão aqui reunidas num único volume as peças essenciais de uma vastíssima polémica em torno da rejeição, por parte de Herculano, dos fundamentos milagreiros da batalha que, em 1139, travou D. Afonso Henriques nos campos de Ourique contra os sarracenos. Evento este tão estrondosamente vitorioso, de um grupo minúsculo de tropas contra um imenso exército inimigo, que levou o nosso monarca a autoproclamar-se, logo ali, rei de Portugal. José Custódio e José Manuel Garcia (Opúsculos IV, Editorial Presença, Lisboa, 1985) contextualizam o sucedido após a publicação, em 1846, do primeiro volume da História de Portugal de Herculano:
«[...] Quanto ao milagre, cavalo de batalha da questão de Ourique, Herculano afirma friamente que não há qualquer referência em que o historiador se possa estribar. O espírito positivo era adverso ao maravilhoso e ao metafísico e via nos “contadores de histórias” falsários e embusteiros que forjavam inclusive documentos para aduzir provas. Por isso “discutir todas as fábulas que se prendem à jornada de Ourique fora processo infinito”. A da aparição de Cristo ao príncipe Ibn Erick antes da batalha fundamentava-se num documento tão mal forjado “que o aluno instruído de diplomática – a ciência por excelência da crítica histórica – o rejeitaria como falso”.
Ora todos estes argumentos foram lenha para a fogueira. Podia um homem, mesmo que fosse um historiador, rejeitar assim, de um momento para o outro, todas as motivações pátrias, toda a origem sacra da realeza (e da nação), toda a fundamentação clara e inequívoca do 5.º Império? Seria possível permitir que um “ateu” mascarado viesse abalar os alicerces da afectividade pública e as esperanças mais recônditas da protecção divina?
O país em 1846 já havia mudado. A mentalidade, no entanto, ainda estava presa às forças anímicas do inconsciente colectivo. A segurança, a razão cartesiana, a clareza das ideias, a organização científica da sua fundamentação, não podiam esperar outra coisa senão uma reacção visceral de todos aqueles que viam agora no campo das letras e da cultura científica uma ruptura, digamos, epistemológica, com aquilo que lhes era mais caro: as prerrogativas intelectuais, os privilégios de influência, os ídolos do saber.
Era uma controvérsia de facto bizantina e Herculano soubera vê-la no contexto como um nada científico: “parece, na verdade, impossível que tão grosseira falsidade servisse de assunto a discussões graves” [...]
A Solemnia Verba constitui o mais importante documento da polémica de Ourique quer pela sua argumentação sólida, quer, sobretudo, pelo seu carácter teórico-metodológico. Herculano explica a situação actual da crítica histórica e analisa a sua evolução desde que ela fora fundada pela Congregação de Saint-Maur, no séc. XVII, avançando na determinação das principais regras da crítica em relação às fontes históricas. [...]»
Fora da referida polémica encontra-se a notável brochura Da Propriedade Literária, que nos mostra um intelectual contra a «literatura-mercadoria» ou «literatura-agiotagem». Ainda José Custódio e José Manuel Garcia (Opúsculos I, Editorial Presença, Lisboa, 1982):
«[...] Herculano era um escritor romântico e, ao contrário do que se pensa amiudadas vezes, o romantismo não era apenas um estilo literário. Era acima de tudo um comportamento social profundamente enraizado na função cultural do homem liberal. A literatura tem pois um lugar próprio no comportamento do intelectual como na condução formativa das novas gerações em termos de língua, de história e de valores nacionais, sociais e morais. [...]»

Como se viu um simples catálogo – e isto não é uma afirmação desprestigiante, pois se não o poderemos considerar como um repositório de grandes raridades ele é seguramente um conjunto excelente de obras fundamentais para o conhecimento da nossa História dos séc. XIX-XX – nos pode conduzir ao aprofundar dos nossos conhecimentos e estudar sempre um pouco mais.


"Uma prateleira da nossa biblioteca"

Só com estes conhecimentos se poderá delinear um conceito daquilo que nos interessa ler/coleccionar e de como adquirir, o mais correctamente possível, os livros que formarão a nosso biblioteca pessoal.

Resta-me agradecer, mais uma vez, a paciência pela vossa leitura e deixar-vos a promessa de continuar com o mesmo empenho em vos trazer estes pequenos apontamentos que poderão interessar a quem se inicie no estudo destes temas.

Saudações bibliófilas.


sexta-feira, 25 de abril de 2014

40.º Aniversário do 25 de Abril: As palavras silenciadas – uma memória.


Passados que são 40 anos sobre o 25 de Abril já existem novas gerações que não viveram o período da ditadura salazarista/marcelista, pelo que a memória de alguns dos acontecimentos mais dramáticos deste longo período se vai perdendo ao longo do tempo.




40.º Aniversário do 25 de Abril 

Pretendo com este apontamento deixar aqui o registo do que a Censura tentou amordaçar / silenciar na palavra escrita, pelo que me vou socorrer desta página criada pela in-libris propositadamente para esta data – *** Letras de Liberdade***.



Escrever livre em ditadura sempre foi muito difícil e, por mais voltas que se dessem ou se tentasse deixar a mensagem subentendida nas entrelinhas, o censor era sempre bastante activo e na dúvida (raramente as tinha...) cortava.


Carimbo de Exame Prévio
(Censura)

Vejamos alguns exemplos de obras de escritores na sua grande maioria bem conhecidos tanto como homens das letras bem como exemplos de cidadania responsável e espírito democrático.



ALEGRE (Manuel).— UM BARCO PARA ÍTACA. 1971. [Águeda. 1971]. 11,5x17 cm. 64 págs. B.
Primeira edição desta obra poético-dramática, evocando o poema Odisseia, de Homero. Integrado na colecção “Nosso Tempo”.

Consta no rol de livros proibidos pela censura.



ALEGRE (Manuel).— O CANTO E AS ARMAS. 1970. [Tipografia Camões. Póvoa de Varzim]. 11,5x19 cm. 140-IV págs. B.

“Se neste nosso país houver um mínimo de consciência dos valores nacionais e sobretudo da escassês daquilo que se realiza a tal nível de depuração que se torna necessário a quem quer que seja, estes poemas de Manuel Alegre deverão figurar imediatamente em antologias escolares e ser decoradas como expressão mais actual de uma saudade portuguesa que (como pretendia Pascoaes) é também, se não sobretudo, esperança.”
Livro cujos exemplares da 1ª edição foram apreendidos pela censura.



BRANDÃO (Raul).— OS PESCADORES. Prefácio de Manuel Mendes. Editorial Estúdios Cor. Lisboa. (1957). 19x25.5 cm. 194-VI págs. B.

Rara edição de muito cuidada orientação gráfica de Manuel Correia, ilustrada com fotografias de “alguns amadores fotográficos”  de grande qualidade artística e documental, muito bem impressas em sépia.
Tiragem limitada a mil exemplares numerados.


(Documento retirado de Ephemera, Biblioteca e Arquivo de José Pacheco Pereira)

Uma das mais importantes obras do autor e um dos mais belos livros que sobre este tema possui a literatura portuguesa. Com referências às praias da Foz do Douro, Ria de Aveiro, Palheiros de Mira, Berlengas, Nazaré, Lisboa, Setúbal, Sezimbra, Costa da Caparica, Olhão, Tavira, Sagres e a muitas outras praias pesqueiras, tipos de pesca, etc.
O livro, na sua primeira edição de 1923, foi alvo das investidas da censura, que acabou por autorizar a sua publicação. Vinte e três anos mais tarde, faz os reparos, que se mostram no relatório.
Exemplar com alguns picos de acidez  na folha de guarda.



CORREIA (Romeu).— SÁBADO SEM SOL. Contos. Edição do autor. 1947. 13x19,5 cm.  151-VII págs. B.

Primeiro livro de contos de Romeu Correia e um dos mais raros da sua bibliografia, por ter sido proibido pela censura.
Capa de brochura ilustrada por Fernando Camarinha.
Capa da brochura com sinais de manuseamento. Assinatura de posse nas páginas preliminares e folha de rosto.



FERREIRA (José Gomes).— AVENTURAS MARAVILHOSAS DE JOÃO SEM MEDO. Romance. Portugália Editora. (Lisboa. 1963). 13,5x19 cm. 254-VIII págs. B.

Primeira edição  da publicação em volume que colige e refunde, em 1963, alguns dos episódios vividos por João Sem Medo, um herói "fala-barato de imprecações e graçolas populares, desprezador dos tiranetes e dos poderosos e, sobretudo, cheio de alegria de existir, de respirar, de acreditar nos bons sentimentos e de inventar monstros para os destruir e vencer"
Em 1933, havia sido escrita pelo autor, em 26 folhetins,  para uma gazeta juvenil, O Senhor Doutor, sob o pseudónimo de Avô do Cachimbo, nascidas da ideia de criar um herói que "desmistificasse os Gigantes, os Príncipes, as Princesas, as Fadas" e "permitisse criar novos mitos, tornar mágicos os objetos vulgares da vida diária e dar contorno às minhas verdades mais profundas numa linguagem de acção poética"
Ainda segundo o autor, esta obra é “... Um romance irónico passado num mundo fantástico de símbolos, sonhos e pesadelos, e escrito por um homem bem acordado.”
Capa ilustrada a cores por Câmara Leme.
Capa da brochura amarelecida.



FERREIRA (Vergílio).— MANHÃ SUBMERSA. Romance. Lisboa. 1954. 12,5x19,5 cm. 234-VI págs. B.
Inicialmente intitulado Cavalo Degolado, foi proibido pela censura em Ofício datado de Maio de 1953 e enviado a Vergílio Ferreira, para Évora, cidade onde então leccionava. Na margem do mesmo ofício pode ler-se a lápis: “Teve mais tarde o título de Manhã Submersa”.



Um dos mais importantes romances do século XX português aqui apresentado na sua rara primeira edição ilustrada com os magníficos linóleos de António Charrua.



FERREIRA (Vergílio).— ANDRÉ MALRAUX (INTERROGAÇÃO AO DESTINO). Editorial Presença. Lisboa. 1963. 11,5x18,5 cm 243-I págs. B.

“(...) Ora, Vergílio Ferreira, neste magnífico e original ensaio que uma vez mais evidencia a sua rara vocação para o ensaísmo, dá-nos precisamente essa diferenciação de planos, ao abordar a personalidade de Malraux, para seguidamente se deter na parte que mais nos importa — a obra do grande escritor francês. E fá-lo de um modo notável, equilibrando um penetrante poder de análise com uma profunda sensibilidade em relação ao fenómeno estético e, sobretudo, à mensagem humana que ele encerra, de tal modo que nos deixa nesta obra mais uma marca da sua excepcional capacidade criadora e... quiça a sugestão de que, tal como Malraux, essa capacidade venha a encontrar fora do ficcionismo o seu futuro campo de expressão”.
Ilustrado com várias reproduções de fotografias.
Obra que foi posta fora de circulação pela censura  aquando desta sua primeira edição em 1963.



FILIPE (Daniel).— PÁTRIA, LUGAR DE EXÍLIO. Poesia em tempo de guerra. (S.d. 1963?). Composto e Impresso na Gráfica Boa Nova, Ldª. Lisboa. 13x19,5 cm. 78-II págs. B.

Poeta com merecido lugar na história da Literatura Portuguesa do século XX, não apenas pela obra que nos deixou mas pela sua grande intervenção na vida cultural e política do nosso país, tendo sofrido na pele a prisão e a censura, da qual este seu livro de poesia integrado na Colecção Forma, é disso exemplo.



FILIPE (Daniel).— O MANUSCRITO NA GARRAFA. Novela. Guimarães Editora. Lisboa. (1960). 11,5x16,5 cm. 156-II págs. B.

“O Manuscrito na Garrafa prova que a criação poética não é incompatível com a criação novelística. Poeta e cronista de viva originalidade, Daniel Filipe, pôde encontrar e apurar um meio de expressão que nesta sua primeira novela ganha uma significativa aplicação à actualidade portuguesa (...)”


(Documento retirado de Ephemera, Biblioteca e Arquivo de José Pacheco Pereira)

Daniel Filipe, foi colaborador, entre outras publicações literárias, das revistas Seara Nova e Távola Redonda. Combateu a ditadura salazarista, tendo sido perseguido e torturado pela P.I.D.E.
Viu alguns dos seus livros serem proibidos, nomeadamente esta curiosa novela, cuja primeira e única edição agora se apresenta.
Capa da brochura algo escurecida e com pequena mancha.



FONSECA (Manuel da).— SEARA DE VENTO. Colecção Atlântida. (Lisboa. 1958). 13x20 cm. 171-V págs. B.



Primeira edição deste excelente livro de Manuel da Fonseca, autor muito vigiado pelo regime, tendo este livro sido autorizado a publicar após apreciação da Direcção dos Serviços de Censura, como se pode ver em anexo. Capa da brochura ilustrada por Vespeira.



GOMES (Soeiro Pereira).— ENGRENAGEM. Romance. Edições SEN Porto. 1951. 15x21 cm. 261-III págs. B.

Obra importante no moderno panorama da literatura portuguesa, integrada no movimento neo-realista, movimento de que o autor foi um dos mais notáveis cultores.
Primeira edição, póstuma, apreendida pela censura aquando do seu aparecimento no mercado o que justifica a sua raridade.
Inclui o “Último retrato de Soeiro Pereira Gomes.”



GOMES (Soeiro Pereira).— ESTEIROS. Edições "Sirius". 1941. (Lisboa. Oficinas de Severo, Freitas, Mega & Cª). 13x19,5 cm. 298-VI págs. B.
Primeira edição de uma das obras que abre o movimento neo-realista português. Capa e desenhos de Álvaro Cunhal.


(Documento retirado de Ephemera, Biblioteca e Arquivo de José Pacheco Pereira)

Vinte e cinco anos após a sua publicação, no relatório de censura de 1966, à quinta edição, que abaixo se mostra, pode ler-se: “Julgo por isso que este livro deveria ter sido proibido quando apareceu, mas agora, só servia à sua propaganda no nosso meio, que o poderia ignorar. No entanto a Ex ma. Direcção resolverá.”

Capa da brochura denotando alguma sujidade e um pouco cansada.



JUNQUEIRO (Guerra).— PÁTRIA. Esta é a ditosa patria minha amada. Camões. s.d. Livraria Chardron. Porto. 13,5x19,5 cm. 224 págs. E.

Terceira edição desta obra que retrata à lupa Portugal num texto do brilhante pensador Guerra Junqueiro. No final, naquilo a que o autor define como Balanço Patriótico, pode ler-se:
“(...) “Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de miséria, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia de um coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, - reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta; (...) Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; (…) A Justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara a ponto de fazer dela um saca-rolhas; (…) Instrução miserável, marinha mercante nula, indústria infantil, agricultura rudimentar; (…) Um regime económico baseado na inscrição e no Brasil, perda de gente e perda de capital, autofagia colectiva, organismo vivendo e morrendo do parasitismo de si próprio; (...) O português , apático e fatalista, ajusta-se pela maleabilidade da indolência a qualquer condição. (...)”



Peça que foi proibida de ser representada pela Comissão de Censura conforme relatório datado de 16 de Maio de 1955, (já na sua sétima edição).



NAMORA (Fernando).— O TRIGO E O JOIO. Romance. Guimarães Editores. Lisboa. (1954). 12,5x19 cm. 295-V págs. B.
Primeira edição de um dos mais emblemáticos textos de Fernando Namora, com capa da autoria de Cambraia e desenhos de António Charrua.



O livro, foi levado à Direcção dos Serviços de Censura, cujo relatório de 1957, termina desta foram: “(...) Atendendo à obra que é e ao seu autor e também a que está publicada e à venda desde 1954 não vejo agora, razão para proibir, tanto mais que até hoje não houve nenhuma reclamação.”
Em 1965, este livro foi objecto de uma adaptação cinematográfica, realizada por Manuel Guimarães interpretado por Eunice Muñoz, Igrejas Caeiro, Manuel da Fonseca, Lídia Franco, entre outros.



PIRES (José Cardoso).— O HÓSPEDE DE JOB. Romance. Arcádia. (Lisboa. 1963). 11,5x19 cm. 254-IV págs. E.
Uma das mais notáveis obras do autor, valorizada com um autógrafo. Primeira edição, Rara.
Encadernação editorial.



QUENTAL (Antero de).— CAUSAS DA DECADÊNCIA DOS POVOS PENINSULARES. 2ª edição. (Edição do coordenador, impresso por Prensa). (Lisboa. 1971). 11x18 cm. 70 pags. B.

“Este texto foi extraído do livro Prosas (vol II), editado pela Imprensa da Universidade, Coimbra, 1926). "Obra inserida na colecção Cadernos Peninsulares. De salientar o facto de ser uma edição do coordenador (José Antunes Ribeiro).

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(Documento retirado de Ephemera, Biblioteca e Arquivo de José Pacheco Pereira)

Esta segunda edição foi levada aos Serviços de Censura, acabando por ser autorizada, como pode ler-se no despacho que aqui se mostra.



REDOL (Alves).— A BARCA DOS SETE LEMES. Romance. Publicações Europa-América. Lisboa. (1958). 14x19 cm. 516 págs. B.

"A Barca dos Sete Lemes é um grande romance e assinala uma fase culminante de domínio da criação romanesca na obra do grande escritor português que, em romance, iniciou a ficção neo-realista.”.
Este livro consta do rol de livros censurados pelo regime.
Capa da brochura de Sebastião Rodrigues.



REDOL (Alves).— GAIBÉUS. Romance. 6ª edição refundida. Publicações Europa-América. (Lisboa. 1965). 14,5x21 cm.322-VI págs. B.



 “No magnífico prefácio que antecede esta 6ª edição, que historia o nascimento do escritor e a gestação do seu primeiro romance, escreve Alves Redol: ‘Gaibéus seria um compromisso deliberado da reportagem com o romance, em favor dos homens olvidados e também da literatura aviltada... Mas, perante a ameaça que depois tão tràgicamente todos provaram na consciência, ou na carne, Gaibéus quis ser, e foi, um dos gritos exactos de um drama colectivo e privado.’ “.


(Documento retirado de Ephemera, Biblioteca e Arquivo de José Pacheco Pereira)

Livro cuja primeira edição foi proíbida pelo regime, conforme relatório Nº 1214 (15 DE FEVEREIRO DE 1940), da Direcção dos Serviços de Censura.
Dedicatória do autor a Alfredo Guisado.



RIBEIRO (Afonso).— POVO. Contos. Editorial Ibérica. Porto. (1947). 13x19,5 cm. 268-IV págs. B.

"De um humanismo profundo, os contos de Povo estão escritos de maneira a fazer-nos sentir os sofrimentos e a ansiedade dos seus personagens, produtos de uma amarga e miserável existência", motivos que determinaram a sua apreensão pela censura. Primeira edição.



Capa ilustrada por Júlio Pomar.
Capa da brochura e lombada muito cansadas.



RIBEIRO (Aquilino).— QUANDO OS LOBOS UIVAM. Livraria Bertrand. Lisboa. (1958). 15,5x20,5 cm. 412 págs. B.

Primeira edição desta importante obra de Aquilino que, pela sua ousada temática social para a época, esteve proibida de circular em Portugal o que justifica o seu escasso aparecimento no mercado.


(Documento retirado de Ephemera, Biblioteca e Arquivo de José Pacheco Pereira)

No relatório que se anexa abaixo pode ler-se escrito à mão: “1.º Não autorizada a reedição. 2.ª Não permitir críticas em impressão. 3.ª Apreender os poucos exemplar que, possivelmente...”



RODRIGUES (Urbano Tavares).— NUS E SUPLICANTES. Novelas. Livraria Bertrand. [Lisboa. 1960.] 13x19 cm. 147-V págs. B.

Uma das obras mais lidas do autor, que como tantos outros, foi afastado do ensino universitário durante a ditadura de Salazar e Caetano, tendo participado activamente na resistência e preso inúmeras vezes.







Livro proibido pela censura, embora tenha suscitado pareceres diferentes entre os censores.
Números escritos na folha de guarda. Pequeno carimbo a óleo na folha de rosto.



SANTARENO (Bernardo).— O DUELO. Peça em 3 Actos e 3 Quadros. Edições Ática. Lisboa. (1961). 14,5x19,5 cm. 206-II págs. B.

Segundo Luís Francisco Rebelo: “Oscilando entre os pólos (de sinal contrário, mas de força equivalente) de uma fascinação do mal e de uma obsessão de angelismo, o seu teatro realiza a inesperada fusão de temas de raíz popular com as preocupações existenciais mais fundamente sentidas na carne e no espírito do homem seu e nosso contemporâneo”. Primeira edição de uma das mais notáveis peças de Santareno, pseudónimo literário de António Martinho do Rosário.
Peça que consta do rol de livros proibidos do antigo regime.



SANTARENO (Bernardo).— O INFERNO. Peça-julgamento em 3 audiências e 8 retrospectivas. Edições Ática. Lisboa. S.d.18x20 cm. 228 págs. B.  

Peça baseada num dos "processos mais atrozes da história", ocorrido em Inglaterra.
Primeira edição, proibida pela Comissão de Censura.
Exemplar com carimbos a óleo na folha de rosto.



SANTARENO (Bernardo).— ANUNCIAÇÃO. Peça em 3 actos. Edições Ática. Lisboa. (1962). 14,5x19,5 cm. 240-IV págs. B.

Disse José Régio no Diário de Lisboa da época: “... a mais poderosa e original revelação do teatro português dos nossos dias...”
Primeira edição de uma das melhores obras de Bernardo Santareno.
Capa e ilustrações da autoria de Francisco Relógio.
Consta do rol de livros proibidos pela Comissão de Censura.



STTAU MONTEIRO (Luís de).— TODOS OS ANOS PELA PRIMAVERA. 2ª edição. Guimarães Editores. Lisboa. (1963). 12,5x19 cm. 107-III págs. B.

“Dedico esta peça — sem espírito de camaradagem, mas com uma fortíssima gargalhada — a todos os que, pela própria natureza do regime prisional a que estejam, ou venham a estar sujeitos, se considerem, em consciência, obrigados a proibi-la.”
Obra, obviamente proibida pela censura.



TORGA (Miguel).— MONTANHA. Contos. Coimbra. 1941. (Impresso nas Oficinas da tip. da “Atlântida”). 14x20,5 cm. VI-181-I págs. B.



Primeira edição, de grande raridade no mercado, uma vez que foi imediatamente apreendido aquando da sua publicação.
Posteriormente viu o seu título modificado para “Contos da Montanha”.



TORGA (Miguel).— BICHOS. Contos. 3ª edição revista. Coimbra. 1943. (Composto e impresso nas oficinas da «Atlântida»). 13x19 cm. 128 págs. B.

Terceira edição revista.
Dedicatória na folha de guarda.


(Documento retirado de Ephemera, Biblioteca e Arquivo de José Pacheco Pereira)

Livro proibido pelo regime, conforme RELATÓRIO Nº 5069 (29 DE OUTUBRO DE 1953), da Direcção dos Serviços de Censura.



TORGA (Miguel).— A CRIAÇÃO DO MUNDO (O Terceiro Dia). Coimbra. 1948. [«Coimbra Editora, Limitada»]. 13,5x19cm. 218-II págs. B.

Muito invulgar segunda edição, refundida, de parte de uma das mais importantes obras do Autor.
Livro cuja primeira edição foi censurada pelo regime, conforme relatório nº 5057, onde se pode ler: 



“ (...) Escritor de forte poder de aceitação por leitores deficientes recursos espirituais. Procura motivos sugestivos, em prol da descrença, fomentando o desrespeito social. O humilde é sempre vitima das injustiças sociais. As obras deste autor não devem ser consentidas em agremiações operárias, por razões óbvias.”



TORGA (Miguel).— VINDIMA. Romance.  Coimbra 1945. 13,5x20 cm. 266-II págs. E.

Primeira edição deste romance, que tem como cenário a paisagem duriense.

Encadernação em sintético. Conserva as capas da brochura. Carminado à cabeça.



TORGA (Miguel).— VINDIMA. Romance. 4ª edição revista. Coimbra [1971]. 13,5x20 cm. 271-I págs. B.

Reedição deste notável romance, que tem como cenário a paisagem duriense.
De assinalar que este foi um dos muitos livros apreendidos pela censura.
Encadernação com lombada e cantos em pele. Conserva as capas da brochura.



TORGA (Miguel).— RUA. Novelas e contos. Coimbra - 1942. (Oficinas da “Atlântida”). 12,5x19,5 cm. 198-II págs. E.
Invulgar livro de contos e novelas, sendo esta a primeira das várias edições que a obra já conta.


(Documento retirado de Ephemera, Biblioteca e Arquivo de José Pacheco Pereira)

Obra que passou pelas mãos da censura, que no seu relatório nº5058 refere a perigosidade de Torga advertindo que :”(...) As obras deste autor não devem ser consentidas em gremiações operárias, por razões obvias.”
Encadernação sóbria em tela reproduzindo a capa original. Exemplar com alguma acidez caracteristica do papel. Conserva capas de brochura e encontrando-se levemente aparado à cabeça.

Mas se estes autores são por demais conhecidos, convirá não esquecer muitos vultos da intelectualidade portuguesa da época, que não partilhavam das opiniões oficiais, e que ao tentarem editar algumas das suas obras também sofreram com as arbitrariedades da Censura – proibição ou cortes significativos das mesmas. Senão vejamos:



BACELAR (José).— ARTE POLÍTICA E LIBERDADE. Editorial “Inquérito”, Lda. Lisboa. (1941). 76-IV págs. B.

José Bacelar foi um brilhante crítico, pensador e ensaísta da sua geração. Colaborou em revistas como Seara Nova, Revista de Portugal ou Presença. Na sua opinião há uma cisão profunda entre a arte e a política, e é precisamente esta opinião que vemos neste ensaio.
“(...) Seja como for, não é ao político que incumbe estabelecer o ‘valor’ da arte sob o ponto de vista do mesmo (o largo ponto de vista do espírito livre) dos altos ‘interêsses’ da Humanidade, decretar o seu banimento ou a sua exaltação. diz-no-lo a pura lógica das coisas: o político é uma parte — não é o todo. Menos lógico ainda, porém, sobretudo muito mais hipócrita, é que, sob o pretexto de beneficiar a arte, ou pelo menos não confessando a sua indiferença perante o aniquilamento dela, o político, mantendo-se inamovível no seu ponto de vista de político, pretenda impor uma orientação, uma ‘moral’ (a sua, naturalmente) à arte, e intervenha com leviandade e sem-cerimónia nos seus problemas íntimos (...).”
Obra proibida pela censura.



CARAÇA (Bento de Jesus).— CULTURA INTEGRAL DO INDIVÍDUO. Problema central do nosso tempo. 3ª edição. Lisboa. Seara Nova. 1941. 12x19cm. 49-III págs. B.

Na nota explicativa  da 2ª edição, pode ler-se: “As páginas que vão ler-se conteem a matéria de uma conferência que o autor realizou em 1933 (25 de Maio) a convite duma organização de novos — a União Cultural “Mocidade Livre” — para inauguração da sua actividade. Viviam-se nessa altura horas inquietas e fecundas (...)” As ilusões nunca são perdidas. Elas significam o que há de melhor na vida dos homens e dos povos. Perdidos são os cépticos que escondem sob uma ironia fácil a sua impotência para compreender e agir (...) Bemditas as ilusões, a adesão firme e total a qualquer coisa de grande, que nos ultrapassa e nos requere. Sem ilusão, nada de sublime teria sido realizado, nem a catedral de Strasburgo, nem as sinfonias de Beethoven. Nem a obra imortal de Galileo.”



Obra da secção de Estudos Políticos e Sociais, integrada nos Cadernos da Seara Nova.
Proibição desta obra, como pode ler-se no despacho de 14 de Fevereiro de 1951.
Assinatura de posse na folha de rosto.



PEREIRA (José Pacheco).— LUTAS OPERÁRIAS CONTRA A CARESTIA DE VIDA EM PORTUGAL. A GREVE GERAL DE NOVEMBRO DE 1918. (Portucalense Editora. 1971) 11,5x18,5 cm. 199-I págs. B.


(Documento retirado de Ephemera, Biblioteca e Arquivo de José Pacheco Pereira)

Livro apreendido e proibido de circular pela PIDE, tendo valido um processo ao autor, sob a direcção de António Rosa Casaco.
Valorizado pela dedicatória do autor.



SARAIVA (António José).— A INQUISIÇÃO PORTUGUESA. Publicações Europa-América. Lisboa. (1956).12x18 cm. 122-IV págs. B.








(Documento retirado de Ephemera, Biblioteca e Arquivo de José Pacheco Pereira)

"Este livro é uma contribuição para a necessária revisão das ideias correntes acerca das causas, função e consequências da Inquisição portuguesa. As suas conclusões estão sujeitas a riscos inerentes a tudo o que sobre a Inquisição se diga enquanto não se fizer o estudo sistemático do material da Torre do Tombo." Primeira edição, integrada na "Colecção Saber". A capa retrata S. Domingos com uma espada na mão esquerda e um ramo de oliveira na direita, tendo a seus pés um cão que segura nos dentes uma vela acesa, cuja chama toca numa esfera redonda com uma cruz. Por cima da cabeça pode ler-se: "Misericordia et Justitia."

Livro muito analisado pelo regime, conforme relatórios n.º 7603 (20 de Dezembro de 1965) e n.º 8527 (Julho de 1969) da Direcção dos Serviços de Censura.



SÉRGIO (António).— EDUCAÇÃO CÍVICA. (2ª edição). 1954. Editorial Inquérito Limitada. Lisboa. 12,5x19 cm. 86-II págs. B.




(Documento retirado de Ephemera, Biblioteca e Arquivo de José Pacheco Pereira)

“Nesta segunda edições, que aparece trinta e nove anos depois da primeira, fizeram-se as modificações seguintes: suprimiu-se a longa advertência da primeira; traduziram-se as transcrições que na primeira se tinham dado em francês, inglês e espanhol; e desapareceram (como não podia deixar de ser) as notas relativas às partes do texto que foram agora eliminadas.”
A primeira edição esteve proibida pela censura.



SÉRGIO (António).— ALOCUÇÃO AOS SOCIALISTAS. No Banquete do Primeiro de Maio de 1947. Editorial Inquérito Limitada. Lisboa. [S.d.]. 14,5x21 cm. 32 págs. B.



Texto bem ao estilo sergiano, numa explanação concisa mas reveladora da sua clareza de raciocínio.
Livro proibido pelo regime, conforme relatório  Nº 3028 (S.D.), da Direcção dos Serviços de Censura.



SÉRGIO (António).— HISTÓRIA DE PORTUGAL. Tomo I — Introdução Geográfica. Livraria Portugália. Lisboa. 1941. 16x22 cm. 253 - V págs. B.

“Êste ensáio histórico-social (que se poderia intitular, com suficiente propriedade, ‘problemas de interpretação da nossa história’) é como que um apêlo à erudição futura para que nos dê aquilo de que êle é um germe — uma mancha, digamos, uma veleidade, um esquema;(...)”
Do índice: Capítulo I - A “Ocidental praia” do continente europeu; Capítulo II - O ambiente geográfico e as regiões naturais-sociais: 1 - Portugal na península ibérica; 2 - O regime das águas e os seus problemas; 3 - As regiões geográfico-sociais; Capítulo III - A orla marítima; Capítulo IV - O clima e os planos actuais para a correcção do ambiente físico; Capítulo V - Entradas geográficas; Capítulo VI - A população.
Primeiro e único volume publicado, proibido aquando do seu aparecimento no mercado, o que explica a sua invulgaridade. Ilustrado nas páginas de texto. Primeira edição.
Capa da brochura com algum cansaço.



SILVA (Agostinho da).— VIAGENS DE LIVINGSTONE. (Publicação Quinzenal. Edição do autor: Agostinho da Silva.). Lisboa. 1944. 16,5x24 cm. 30 págs. B.

Cadernos de Informação Cultural, foi uma publicação quinzenal, criada por Agostinho da Silva em 1940, que consiste em pequenos fascículos, dedicados a um tema, arte, biografia, literatura, história, ciência, curiosidades, etc. Este, fala-nos das viagens de Livingstone, médico missionário escocês, e explorador em África.



O fascículo, acabou por ser autorizado com cortes, pois julga “ser inconveniente varias alusões que o autor faz à prática da escravatura por portugueses (...)”.

Outras obras pela sua índole marcadamente política tiveram o mesmo destino – a supressão pela Censura omnipotente e omnipresente na vida cultural de então.

É o caso deste opúsculo editado por alturas das “eleições livres” de 1969 pela Oposição maioritariamente reunida na CDE (Comissão Democrática Eleitoral).
Partidos? Esse era único – Acção Nacional Popular (ANP) a versão marcelista da União Nacional.



VÁRIOS.— NOVA CARTILHA DO POVO. (edição dos autores). Braga. 1969. 11,5x17 cm. 29-I págs. B.

“Em Jeito de explicação, CARTILHA DO POVO — foi o título de um opúsculo publicado em 1884. O seu autor, José Falcão, contribuiu através dele para a propaganda republicana, despertando o Povo para a consciencialização política. E alcançou o objectivo pretendido, pois o opúsculo logo teve mais de cinco edições, com uma tiragem total de algumas dezenas de milhares de exemplares. A NOVA CARTILHA DO POVO inspira-se no opúsculo de José Falcão. Mas, embora através de um esquema necessàriamente simples, adopta por temas, como é natural, os problemas portugueses do nosso tempo presente. (...) seguindo o seu exemplo, pretendemos também suscitar a reflexão e efectiva consciencialização política e, por consequência, ajudá-lo a mais rapidamente tomar conta do destino do País, que é a Pátria de todos nós.”
São autores deste opúsculo: António Pereira Marinho Dias, Humberto Trindade Soeiro, Joaquim António dos Santos Simões, Joaquim Victor Baptista Gomes de Sá, Lino Carvalho de Lima e Maria Margarida Braga Malvar.
De raro aparecimento no marcado alfarrabista, não só por se tratar de um opúsculo político facilmente descartável, mas por haver sido proibido pela censura.



CARTA ABERTA AO SENHOR PRESIDENTE DA COMISSÃO PROVINCIAL DA UNIÃO NACIONAL. S.d. 21x28cm. 3 ff.

Cópia dactilografada, cujo primeiro parágrafo transcrevemos: “Os signatários figuram, como V.ºxa sabe - até porque nunca fizeram segredo disso - entre os que, em Moçambique, têm afirmado, no passado em todas as eleições, uma posição intransigente de desacordo com o Governo sobre problemas internos.
“Houve por bem V.ªxa, na sua alocução aos portugueses de Moçambique, que a rádio e a imprensa amplamente difundiram, interpretar a abstenção dos oposicionistas moçambicanos, em face do acto eleitoral em curso como manifestação de “falta de solidariedade”, por motivos superiores, com essa escassa minoria que, em Lisboa publicou o chamado manifesto da Oposição Democrática.”
“Acrescentou V. Ex.ªxa que “nesta Provincia, hoje os portugueses, no que respeita à Defesa Nacional e à Política de manutenção  do Ultramar, estão de acordo com o Governo”, e acabou V. Exa. por nos prestar homenagens.
“Ao proceder assim, não se acautelou V. Exa. concedendo-nos, ao menos, o beneficio da dúvida em matéria de tanto melindre. “Apertis Verbis”, Vªxa. julgou-se habilitado a afirmar que a nossa abstenção - e dizemos nossa porque, infelizmente, não podemos julgar-nos alheios às afirmações de V. Exa. - só tem como explicação ”aquela pretensa falta de solidariedade. E afirmando, não curou de considerar que bem podia acontecer sermos nós tão zelozos da nossa lealdade, para com os ideais que defendemos, e para aqueles que connosco os defendem como, por certo, V. Exa, é raro da lealdade que dispensa ao seu Governo.
“Daí a necessidade deste esclarecimento que, como V.Exa. será o primeiro a reconhecer, não poderá deixar de ter publicidade semelhante à que V.ªxa deu à causa que o determinou. (...) Silenciosos ou não, a nossa divisa será sempre a mesma: “libertas quaesera tamem” - liberdade, ainda que tarde”. Os seguintes nomes responsabilizam: António Almeida Santos, Carlos Adrião Rodrigues, Henrique Vasco Soares de Melo e José Santa Rita.



LEAL (Cunha).— CARTA DO SR. ENGENHEIRO CUNHA LEAL, AO SR. DR. CASTRO FERNANDES. Lisboa, 3 de Novembro de 1965. 21x29cm. 4 ff.

Extensa, rara e polémica carta policopiada a propósito da eleição para Presidente da República em que participou o General Norton de Matos. Dada a sua extensão e os numerosos temas tratados, dela reproduzimos apenas o início: “Ouso dirigir-me a V. Ex. sem ser da sua privança ou sequer das suas relações sociais.
“Sucede, porém, que V. Exª ocupa lugar de tal relevo na mecânica do sistema político vigente entre nós, que lhe foi cometida nesta emergência a superior orientação do fenómeno eleitoral (...)”. Seguem-se contundentes considerações que tocam em muitos aspectos da política portuguesa colonial e metropolitana, à censura, etc., terminando do seguinte modo: “Volto a dizer que esta carta é um protesto da minha consciência, e, reservando-me o direito de fazer dela o uso que entender, não tentarei publicá-la em jornais do meu país, para poupar aos senhores censores o seu trabalho negativo. Autorizo, porém, V. Exª a substituir-se a mim para este efeito, com a expressa condição de que dela não seja eliminada nem sequer uma vírgula, sob pena de se lhe não dar publicidade.
“Creia V. Ex. que me dói ver criaturas terem necessidade de procurarem enaltecer o seu patriotismo com atitudes similares.
“Apesar de tudo, persisto em subscrever-me, com muita consideração”, etc

Como sempre também existiram episódios de quem se quisesse servir da Censura para calar outras opiniões que consideravam lesar as suas pessoas.



ARCHER (Maria).— ARISTOCRATAS. Romance. Editorial Aviz. Lisboa. 2ª edição. 15x20,5 cm. 437-III págs. B.

Segunda edição do segundo e bastante invulgar romance de Maria Archer, destacada figura da literatura portuguesa.



Segundo o relatório de censura: “Este livro foi presente à censura em virtude dum requerimento assinado por uma irmã da autora, a qual protesta pelo facto do livro descrever deturpadamente, segundo a requerente, cenas da vida da família, apresentando os paes, e principalmente a mãe, sob um prisma falso e ofensivo (...)”. O livro, acabaria por ser autorizado pois o censor, não encontra “no livro matéria em que a Censura possa intervir sob o ponto de vista moral e politico (...) ”.
Capa da brochura apresentando algumas manchas de acidez, próprias do papel. Assinatura de posse na folha de rosto.

Alguns autores estrangeiros e nomeadamente brasileiros também tiveram problemas com a Censura.



AMADO (Jorge).— JUBIABÁ. Romance. 2ª edição. Martins. Edição Livros do Brasil. Lisboa. 14,5x21,5 cm. 332-IV págs. E.

“Com Jubiabá, alcançou Jorge Amado a notabilidade e a categoria dum dos maiores romancistas do mundo. O livro esgotou no Brasil sucessivas edições e logo se negociaram os direitos para a sua publicação em francês, russo, inglês alemão, sueco dinamarquês e espanhol; fizeram-se contratos especiais para adaptar ao teatro e à rádio, ultimando-se negociações que levarão ao cinema as páginas vibrantes desse famoso livro. Ali estava pois, na obra culminante de Jorge Amado, um verdadeiro “best-seller” a que a crítica mundial prestou os mais justos elogios”
Livro que em Portugal foi censurado pelo regime.
Encadernação com lombada e cantos em percalina conservando as capas de brochura. Pequena assinatura antiga na folha de anterrosto.



SIENKIEWICZ (Henrik).— QUO VADIS. Europa-America. Lisboa. 1952 12x18,5 cm. 387-I págs. B.

“(...) O leitor encontrará nas páginas de Quo Vadis os mais belos e horríveis espectáculos da Roma de Nero: o incêncio da cidade, os cristãos ardendo nos jardins, os espectáculos do circo em que  os homens, mulheres e crianças são lançados às feras. Evocando uma época terrível da História da Civilização, o romance de Henryk Sienkiewicz deu lugar ao filme em ‘tecnicolor’ da M.G.M., que ficará na história do cinema pela sua deslumbrante grandiosidade”.
Edição cuidada, que assinalou a estreia do filme Quo Vadis em Portugal.
Ilustrada com reproduções de fotografias do filme, “amavelmente cedidas pela M.G.M.”
O livro foi proibido de circular, pela censura.
Lombada com sinais de manuseamento.

Claro que todas as obras que “atentassem contra a moral e os bons costumes” tão afanosamente defendidos (mas por vezes não praticados) pelo Estado Novo teriam de ser proibidos.



CORREIA (Natália).— O ENCOBERTO. (Lisboa. 1969). 13,5x21 cm. 122-IV págs. B.
Peça de teatro, invulgar nesta sua primeira e cremos que ainda não repetida edição.


(Documento retirado de Ephemera, Biblioteca e Arquivo de José Pacheco Pereira)

Livro que foi apreendido pela censura que na conclusão do seu relatório afirma o seguinte: “ (...) Julgo ser de proibir por inconveniência política e ser pornografica.”



CORREIA (Natália).— O VINHO E A LIRA. Edição de Fernando Ribeiro de Mello. (Lisboa. S. d.). I12x19 cm. 99-V págs. B.

Edição primeira e única, cuja circulação esteve proibida na época, conforme se pode ver no RELATÓRIO Nº 7782 (6 DE JUNHO DE 1966) da Direcção dos Serviços de Censura.


(Documento retirado de Ephemera, Biblioteca e Arquivo de José Pacheco Pereira)

Integrado na Colecção Sagir.
Capa em veludo vermelho própria da edição. Dedicatória da autora.



SADE (Marquês de).— A FILOSOFIA NA ALCOVA. Edições Afrodite. Fernando Ribeiro de Mello. S.d. 14,5x19 cm.359-V págs. B.



Com tradução de Manuel João Gomes e capa e excelentes ilustrações de Martim Avillez. Esta edição tem como posfácio o tema “A 1ª edição portuguesa ou Sade no Tribunal Plenário de Lisboa — documentos para uma reflexão exemplar sobre política-cultura-moral-ditadura” , onde se podem ver facsimiles dos autos de declarações, despacho de pronuncia contestações dos réus : Fernando Ribeiro Bento de Melo; António Manuel Calado Trindade; Herberto Helder de Oliveira; Luiz José Machado Gomes Guerreiro Pacheco e João Batista Martins Rodrigues, do processo “de abuso de liberdade de expressão”que decorreu em Lisboa aquando a publicação da primeira edição desta obra. Os advogados que defenderam os réus, foram respectivamente: Dr. Manuel João da Palma Carlos, Dr. Jorge Sampaio, Dr. Luis Francisco Rebelo, Dr. Fernando da Rocha Calisto e João Lopes Alves. Como testemunhas também se encontram nomes sonantes como por exemplo o de David Mourão Ferreira, José Augusto França, Palma Carlos, José Blanc de Portugal, a Alexandre O’Neill entre outros.




Para conclusão proponho a leitura deste artigo publicado na Tertúlia de in-libris: OS LIVROS E A CENSURA EM PORTUGAL de José Brandão.

O texto começa deste modo: “Não se sabe bem ao certo quanto tempo a cultura portuguesa pôde viver livre da implacável repressão dos censores e seus mandantes.”

Convirá nunca esquecer o valor da liberdade de expressão com uma das formas de defesa do património cultural de uma nação.

Antes de terminar não posso deixar de louvar esta selecção de obras feita pela in-libris de que aqui deixei estes apontamentos como uma sincera homenagem aos seus autores … bem hajam!

Optei por inserir os descritivos de todas as obras, seleccionadas por mim, na sua íntegra por fornecerem um detalhe muito maior sobre o seu conteúdo bem como sobre o estado em que surgem no mercado bibliófilo.

Não pude deixar de constatar que muitos dos títulos se encontravam já "Indisponível" o que atesta da sua qualidade/raridade e do interesse e procura que este tipo de obras desperta.

Apetece-me terminar com uma das frases bem conhecidas do Maio de 68 que tanto marcaria a minha geração:

É proibido proibir!

Saudações bibliófilas.