sábado, 22 de agosto de 2015

Abade de Baçal – um valioso contributo de divulgação cultural



Retrato do Abade do Baçal
Henrique Tavares (Óleo sobre tela)

Ao "folhear" as Novidades Bibliográficas de Agosto de 2015 da Livraria do Adro do meu prezado amigo Miguel de Carvalho, deparei com uma vasta bibliografia do Abade de Baçal, figura ímpar no estudo e divulgação da história transmontana.

Quem foi afinal o Abade de Baçal?

Francisco Manuel Alves, mais conhecido como Abade de Baçal, nasceu em Baçal a 9 de Abril de 1865 e aí faleceu em 13 de Novembro de 1947.

Foi um arqueólogo, historiador e genealogista português.

Nascido numa aldeia do concelho de Bragança (Baçal), onde nasceram também seus pais Francisco Alves Barnabé e sua mulher Francisca Vicente, foi ordenado sacerdote em 13 de Junho de 1889, desde então, até a sua morte, tornou-se pároco da sua aldeia natal.

Dedicou a sua vida a recolher testemunhos arqueológicos, etnológicos e históricos respeitantes à região de Trás-os-Montes e, especialmente ao distrito de Bragança.
Autodidacta erudito, rústico e pitoresco.

A sua obra principal são as Memórias arqueológicas-históricas do distrito de Bragança (1909-1947), em onze volumes.

Em 1925 foi nomeado director-conservador do Museu Regional de Bragança, que desde 1935 é designado por Museu do Abade de Baçal (1) em sua homenagem.


Abade de Baçal

No quinto volume da sua obra-prima, dedicado aos Judeus, constam os seus títulos:

“Reitor de Baçal, Antigo Vereador da Câmara Municipal de Bragança, Antigo Vogal à Junta Geral do Distrito do mesmo nome, Sócio da Associação dos Arqueólogos Portugueses, da Sociedade Portuguesa de Estudos Históricos, do Instituto de Coimbra, da Academia das Ciências de Lisboa, do Instituto Etnológico da Beira, do Instituto Histórico do Minho, Presidente Honorário do Instituto Científico-Literário de Trás os Montes, Comendador da Antiga, Nobilíssima e Esclarecida Ordem de S. Tiago do Mérito Científico, Literário e Artístico, em atenção às suas qualidades de escritor reveladas na obra "Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança", distinguido pelo Clero Bragançano com a oferta dum cálix de valor artístico, com uma pena de ouro e um tinteiro no mesmo metal de alto valor artístico por oferta do Distrito de Bragança em reconhecimento dos seus trabalhos de investigação histórica em prol do mesmo, e ainda, ultimamente, Director-Conservador do Museu Regional de Bragança.”

Encontra-se colaboração da sua autoria no semanário Branco e Negro (2) (1896-1898).


Branco e Negro N.º 1


Vejamos então os títulos disponibilizados:



ALVES, Francisco Manuel (Abade de Baçal)NO ARQUIVO DE SIMANCAS - Memórias Arqueológico-Historicas no Distrito de Bragança (tomo VIII). Tipografia Académica [Reedição do Museu do Abade de Baçal], Bragança,1980. In-8º de  130-(2) págs. Brochura.

Observações:
 
“Por iniciativa da trilogia regionalista Raúl-Quintela-Montanha fui, em junho de 1931, subsidiado pela Junta de Educação Nacional, estudar no Arquivo de Simancas (Espanha) a documentação histórica referente ao distrito de Bragança. Aproveitei a viagem, embora rodeando algo, para visitar terra relacionadas com o mesmo districto (...)”.

Referência: 12290
Preço:   17,00€



ALVES, Francisco Manuel(Abade de Baçal) – ARQUEOLOGIA E ETNOGRAFIA - Memorias Arqueológico-Historicas no Distrito de Bragança (tomo XI). Tipografia Académica [Reedição do Museu do Abade de Baçal], Bragança,1981. In-8º de  804 págs. Brochura. Cadernos por abrir.

Observações:   

“Sai agora o volume XI das Memórias Arqueológico-Históricas do distrito de Bragança, embora já se devesse considerar o XII, visto ter-se publicado o XI em 1940 por ocasião das Festas Centenárias da Fundação da Nacionalidade Portuguesa pela Academia Portuguesa da História, mas quem mandava ordenou  o seguinte, que se lê no Ao Leitor, a servir de prefácio ao referido volume: ‘Por deliberação da Comissão Executiva dos Centenários de 1939-1940, do Distrito de Bragança, resolveu-se publicar a matéria constante deste volume e encorporá-lo nas Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, de que seria o tômo XI, mas, apresentado o assunto ao Senhor Ministro da Educação Nacional, ele mandou inclui-lo entre as obras comemorativas do Duplo Centenário, que a Academia Portuguesa da História tinha em publicação, visto o autor a ele pertencer.’ (...)”.

Referência: 12289
Preço:   30,00€



ALVES, Francisco Manuel (Abade de Baçal) – ARQUEOLOGIA, ETNOGRAFIA E ARTE - Memórias Arqueológico – Históricas do Distrito de Bragança (tomo X). Tipografia Académica [Reedição do Museu do Abade de Baçal], Bragança,1978. In-8º de  843-(27) págs. Brochura. Ilustrado ao longo do texto. Cadernos por abrir.

Observações:   

Reedição do X dos XI Tomos que constituem esta monumental obra referente à região brigantina, este tomo é a continuação do tomo anterior, onde se inventaria, por localidade, os monumentos,  vestígios arqueológicos e os costumes.

Referência: 12288
Preço:   30,00€



ALVES, Francisco Manuel (Abade de Baçal) – ARQUEOLOGIA, ETNOGRAFIA E ARTE - Memórias Arqueológico – Históricas do Distrito de Bragança (tomo IX).  Tipografia Académica [Reedição do Museu do Abade de Baçal], Bragança,s.d. In-8º de 718- (32) págs. Brochura. Profusamente ilustrado ao longo do texto.

Observações:   

“Mais um canto talhado para o monumento ao nosso ricão transmontano, célula do nosso Portugal, que não pode ser amado sem achegas monográficas elucidativas da sua História. Trata da sua Arqueologia, Etnografia e Arte, com muitas notícias inéditas, capítulos inteiros mesmo, auridas, não còmodamente em trabalhos de gabinete, mas por montes e vales, sem temor de frio, calor, chuva e mil outros incómodos inerentes às excursões, só avaliadas por quem a elas se dedica (...)”

São feitas referências, entre muitas outras,  a Abreiro (Capela de Santa Catarina, Arcã e Cruzeiro), a Aguieiras (Ermida de Nª Srª do Cruzeiro, castelo e esculturas rupestres), a Avidagos (sepulturas romanas), a castelos e afins em Aguieiras, Caravelas, Mascarenhas, Milhais, Mirandela, Regodeiro, Suçães, Vale de Gouvinhas, Vale de Juncal, Vale da Sancha e Vale de Madeiro e a castros em Abreiro, Ferradosa e Mascarenhas (Cidade), a Freixeda (mina, casarão e muralhas) e a Lamas de Orelhão (muro, poço e moedas romanas, ibéricas e visigóticas).

Referência: 12287
Preço:   30,00€



ALVES, Francisco Manuel (Abade de Baçal) – OS FIDALGOS - Memorias Arqueológico-Historicas no Distrito de Bragança (tomo VI). Tipografia Académica [Reedição do Museu do Abade de Baçal], Bragança,1981. In-8º de 806- (2) págs. Brochura. Ilustrado com.com 162 desenhos, reprodução de pedras-de-armas (brasões) de casas do Distrito de Bragança, pelo professor Domingos Vinhas. Cadernos por abrir.

Observações:   

Tomo dedicado às famílias nobres da região brigantina, inserida na colecção das "Memorias Arqueológico-Historicas no Distrito de Bragança ", monumental e fundamental obra sobre esta região.

Referência: 12286
Preço:   30,00€



ALVES, Francisco Manuel (Abade de Baçal) – OS NOTÁVEIS -Memorias Arqueológico-Historicas no Distrito de Bragança (tomo VII). Tipografia Académica [Reedição do Museu do Abade de Baçal], Bragança,1981. In-8º de 820 págs. Brochura. Ilustrado com epigrafia ao longo do texto e quadros de dados genealógicos desdobráveis em extra texto.

Observações:   

Nesta obra dedicada aos Notáveis o Abade de Baçal compilou referências biográficas e bibliográficas dos mais ilustres e destacados naturais do distrito de Bragança,e daqueles que,tendo outras proveniências geográficas,na região exerceram alguma actividade de relevo ou sobre ela produziram algum tipo de estudo.Este estuda  abarca um longo período cronológico,desde os finais da Idade Média até à contemporaneidade,reportando-se a maioria dos registos a esta última e à epoca moderna,como facilmente se compreende.

Os Notáveis abordam grande variedade de indivíduos,nobres e artistas,militares e eclesiásticos, escritores,políticos e santos, empresários.Este livro é não só um dicionário dos brigantinos ilustrem como também um repositório de informações de carácter histórico, bibliográfico, patrimonial, económico, político, científico, eclesiástico, heráldico-genealógico, etnográfico,e até anedótico.

A maioria das entradas estão ordenadas por ordem alfabética porém,as entradas onomásticas alterna com outras de índole temática (exemplos: deputados, governadores civis, etc)

Referência: 12285
Preço:   30,00€

Evidentemente que o Miguel de Carvalho apresenta, nesta sua selecção para Agosto, muitas obras, em minha opinião de maior raridade e procura, no entanto nunca devemos esquecer estes contributos valiosíssimos para a compreensão da nossa identidade nacional e cultural.

A título de exemplo saliento este belo exemplar:



MORAES, Wenceslau de – O CULTO DO CHÁ.   Typographia do "Kobe Herald", Kobe, 1905. In-8º de 46 págs. Brochado. Selo de livraria antiga coeva no canto inferior da primeira página. Uma folha com ligeiro corte na dobra. Restantes folhas estão intactas como no estado primitivo. Capas em exelente estado conservando parcial fita de seda verde original da brochura. Capa de brochura ilustrada a cores  e a prata, sem sinais maiores de manuseamento. Nestas condições um excelente exemplar e PEÇA DE COLECÇÃO.












Observações:   

É a MUITO RARA PRIMEIRA EDIÇÃO deste belo livro, em nossa opinião dos mais belos livros impressos em língua portuguesa no século XX. É porventura o mais raro, impresso em papel de Japão à maneira tradicional do país, ou seja, numa só face do papel e depois de dobrados, cozidos à margem. As ilustrações são de Yoshiaki e as gravuras de Gotô Seikodô, impressas a várias cores ao longo do texto.

Referência:12280
Preço:   1.150,00€

Mais uma vez quero expressar o meu elogio pela forma como a página da livraria é agora apresentada…parabéns Miguel pelos aperfeiçoamentos!

Saudações bibliófilas.


Notas:

Museu do Abade de Baçal em Bragança

(1) O Museu do Abade de Baçal: http://www.mabadebacal.com/#/HOME-01-00/


Rita Correia (01 de Fevereiro de 2012).
Ficha histórica: Branco e Negro : semanario illustrado (1896-1898) (pdf)
Hemeroteca Municipal de Lisboa

(2) BRANCO E NEGRO. SEMANÁRIO ILUSTRADO – Começou a publicar-se em Lisboa a 5 de Abril de 1896, sob a chancela da Livraria e casa editora António Maria Pereira (Livraria AMP), sedeada na Rua Augusta n.º 50 a 54. A redação e a administração do jornal estavam instaladas no n.º 49 do mesmo arruamento no coração da cidade. Manteve-se até 27 Março de 1898, totalizando 104 números. O seu fim, não anunciado terá ficado a dever-se à doença do editor, António Maria Pereira (AMP), que acabou por falecer a 27 de Julho de 1898. 

sábado, 15 de agosto de 2015

A poesia de Mário de Sá-Carneiro


Como estamos no Verão e apetece mais a praia...

Como estamos no Verão e apetece mais a praia ou passear pelo campo para fugir do calor (que por estes lados não tem sido tanto assim …) deixo este apontamento ligeiro para assinalar que a Tertúlia ainda não morreu…está a saborear umas férias, que infelizmente o seu autor não consegue ter!

… ou passear pelo campo. 
Mas sempre vou lendo ou relendo alguns dos meus livros.
Neste momento estou a reler o Mário de Sá-Carneiro (1), de quem recomendo vivamente a leitura da sua obra.

Caricatura de Mário de Sá-Carneiro por Almada Negreiros
Mário de Sá-Carneiro nascido em Lisboa a 19 de Maio de 1890 e que se suicidou em Paris a 26 de Abril de 1916, foi um dos grandes expoentes do modernismo em Portugal e um dos mais reputados membros da Geração d’Orpheu (2) (de que se comemora este ano o centenário do seu lançamento). Foi um poeta, contista e ficcionista.

José Pacheco (1885-1934), capa de Orpheu
Fascículo n.º 1, Janeiro - Fevereiro - Março de 1915

Embora tivesse adiado por alguns dias o dramático desfecho da sua vida, numa «cart de despedida» para Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro revela as suas razões para se suicidar que aqui se transcreve.

Retrato de Fernando Pessoa em 1914

Meu querido Amigo.
A menos de um milagre na próxima segunda-feira, 3 (ou mesmo na véspera), o seu Mário de Sá-Carneiro tomará uma forte dose de estricnina e desaparecerá deste mundo. É assim tal equal – mas custa-me tanto a escrever esta carta pelo ridículo que sempre encontrei nas «cartas de despedida»... Não vale a pena lastimar-me, meu querido Fernando: afinal tenho o que quero: o que tanto sempre quis – e eu, em verdade, já não fazia nada por aqui... Já dera o que tinha a dar. Eu não me mato por coisa nenhuma: eu mato-me porque me coloquei pelas circunstâncias – ou melhor: fui colocado por elas, numa áurea temeridade – numa situação para a qual, a meus olhos, não há outra saída. Antes assim. É a única maneira de fazer o que devo fazer. Vivo há quinze dias uma vida como sempre sonhei: tive tudo durante eles: realizada a parte sexual, enfim, da minha obra – vivido o histerismo do seu ópio, as luas zebradas, os mosqueiros roxos da sua Ilusão. Podia ser feliz mais tempo, tudo me corre, psicologicamente, às mil maravilhas, mas não tenho dinheiro. [...]
Mário de Sá-Carneiro, carta para Fernando Pessoa, 31 de Março de 1916.

Assinatura de Mário de Sá-Carneiro
Mas vejamos como esta personagem tão complexa nos deixou alguns dos nossos poemas mais sublimes:

Distante melodia
Num sonho d´Íris morto a oiro e brasa,
Vêm-me lembranças doutro Tempo azul
Que me oscilava entre véus de tule -
Um tempo esguio e leve, um tempo-Asa.

Então os meus sentidos eram cores,
Nasciam num jardim as minhas Ânsias,
Havia na minha alma Outras Distâncias -
Distâncias que o segui-las era flores...

Caía Oiro se pensava Estrelas,
O luar batia sobre o meu alhear-me...
– Noites-lagoas, como éreis belas
Sob terraços-lis de recordar-Me...

Idade acorde d´Inter-sonho e Lua,
Onde as horas corriam sempre jade,
Onde a neblina era uma saudade,
E a luz – anseios de Princesa nua...

Balaústres de som, arcos de Amar,
Pontes de brilho, ogivas de perfume...
Domínio inexprimível d´Ópio e lume
Que nunca mais, em cor, hei-de habitar...

Tapetes de outras Pérsias mais Oriente...
Cortinados de Chinas mais marfim...
Áureos Templos de ritos de cetim...
Fontes correndo sombra, mansamente...

Zimbórios-panteões de nostalgias,
Catedrais de ser-Eu por sobre o mar...
Escadas de honra, escadas só, ao ar...
Novas Bizâncios-Alma, outras Turquias...

Lembranças fluidas... cinza de brocado...
Irrealidade anil que em mim ondeia...
– Ao meu redor eu sou Rei exilado,
Vagabundo dum sonho de sereia...

Paris 1914 - Junho 30

Último soneto
Que rosas fugitivas foste ali:
Requeriam-te os tapetes – e vieste...
– Se me dói hoje o bem que me fizeste,
É justo, porque muito te devi.

Em que seda de afagos me envolvi
Quando entraste, nas tardes que apareceste –
Como fui de percal quando me deste
Tua boca a beijar, que remordi...

Pensei que fosse o meu o teu cansaço –
Que seria entre nós um longo abraço
O tédio que, tão esbelta, te curvava...

E fugiste... Que importa ? Se deixaste
A lembrança violeta que animaste,
Onde a minha saudade a Cor se trava?...

Paris - Dezembro 1915

Fim
Quando eu morrer batam em latas,
Rompam aos saltos e aos pinotes,
Façam estalar no ar chicotes,
Chamem palhaços e acrobatas!

Que o meu caixão vá sobre um burro
Ajaezado à andaluza…
A um morto nada se recusa,
Eu quero por força ir de burro.

Paris 1916 

Todos estes poemas estão incluídos no livro Indícios de Oiro (3) de Mário de Sá Carneiro.


SÁ-CARNEIRO (Mário de) – Indicios de Oiro

Encadernação com lombada e cantos de pele azul decorada com nervuras e rótulos de ferros dourados em casas fechadas. Ligeiramente aparado e tintado à cabeça de azul.
Conserva capas da brochura.

Saudações bibliófilas e continuação de boas férias.

Eu cá volto às minhas leituras e às minhas flores.







Notas:
(1) Mário de Sá -Carneiro – Wikipedia: https://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%A1rio_de_S%C3%A1-Carneiro
(2) Revista Orpheu – Wikipedia: https://pt.wikipedia.org/wiki/Revista_Orpheu
(3) Conjunto de 32 poemas autógrafos, em caderno de capa dura azul, com assinatura do autor na capa, na diagonal – BNP: http://purl.pt/13863