segunda-feira, 19 de maio de 2014

Rosalia de Castro, poetisa galega – um apontamento biobibliográfico.



Rosalia de Castro

Nascida em Santiago de Compostela, em Fevereiro de 1837, Rosalía de Castro deixou uma obra ímpar. Os seus Cantares Gallegos são unanimemente considerados como a primeira grande obra da literatura galega contemporânea, vindo assim contrariar um conceito antigo de que o idioma galego não é propício à poesia.

Em qualquer idioma é difícil encontrar um autor que simbolize toda uma língua e toda uma literatura, mas Rosalia de Castro deve ser considerada como a fundadora da moderna literatura galega.

Co seu xordo e costante mormorio
atráime o oleaxen dese mar bravío,
cal atrái das serenas o cantar.
«Neste meu leito misterioso e frio
-dime-, ven brandamente a descansar».
El namorado está de min... ¡o deño!
i eu namorada del.
Pois saldremos co empeño,
que si el me chama sin parar, eu teño
unhas ansias mortáis de apousar nel.
 Fragmento de Follas Novas


 
Casa-Museu de Rosalía em Padrón

Em 21 de Fevereiro de 1837, Rosalía de Castro nasce em Camiño Novo, no cruzamento com a estrada para Conjo, na periferia de Santiago de Compostela, filha de María Teresa de la Cruz de Castro y Abadia e, segundo se julga, do padre católico José Martínez Viojo, embora não existam documentos que sustentem esta afirmação comummente aceite.

A sua mãe era uma aristocrata proveniente da linhagem dos Castro, implantada desde a Idade Média na Galiza, pertencendo os condes de Lemos a um dos seus ramos. María Teresa é a senhora da casa grande de Arretén; descende, portanto de uma das famílias mais ilustres e respeitadas da Galiza. Quando Rosalía nasce, María Teresa tinha 32 anos.

Não podendo, pela sua condição sacerdotal, legitimar ou reconhecer a filha, encarrega suas irmãs, Teresa e María Josefa, de cuidarem da recém-nascida. No assento de nascimento, figura o nome de María Rosalía Rita de Castro, filha de pais incógnitos.

Numa certidão do concelho de Padrón, datada de 17 de Setembro de 1842, regista-se que ali reside Teresa de Castro com sua filha Rosalía e com uma criada de nome María Martínez. Após ter vivido os primeiros anos com suas tias paternas, terá, portanto, ficado ao cuidado da mãe.

Em 1850, Rosalía e sua mãe residem em Santiago, onde a jovem estuda e participa em diversas actividades culturais.


Aurelio Aguirre

Em 1852 apaixona-se por Aurelio Aguirre, o poeta romântico chamado de "o Espronceda galego".
Sobre este poeta galego leia-se igualmente: ¿Quién fue en realidad Aurelio Aguirre?.  

Mas no ano seguinte – 1853 – contrai o tifo. Cura-se, mas Eduarda Pondal, a sua melhor amiga, morre, vítima da mesma doença.

Em 1856 muda-se para Madrid, onde vive em casa de uma prima. Deste ano datam as suas primeiras publicações. Em 2 de Março, realiza-se o célebre Banquete do Conjo.

Em 1857 sai a sua primeira colectânea de poemas em língua castelhana – La flor.

O ano de 1858 será marcado pela morte de Aurelio Aguirre, grande amigo de Rosalía e o seu primeiro amor. Neste mesmo ano, com Manuel Murguía, um escritor e investigador funcionário do Estado.


Manuel Murguía

O casal regressa à Galiza em 1859, onde, a 12 de Maio, em Santiago, nasce Alejandra, a sua primeira filha. Publica em castelhano La hija del mar.

No entanto em 1861 voltariam a Madrid. Neste ano começa a publicar textos em galego e em castelhano. É editado o seu «ensaio de romance», Flavio.

A sua mãe morre em 1862 e Rosalia dedica-lhe o seu livro A mi madre, publicado no ano seguinte.

Será em 1863 que Rosalia publica, em Vigo, a sua primeira grande obra em língua galega, Cantares Gallegos. A língua galega estava desde o século XV relegada para a condição de idioma rural. Neologismos castelhanos foram sendo tomados de empréstimo e integrados, a fonética castelhana invadira também a pureza do galego genuíno – o vernáculo foi-se perdendo.

“E cando a gaita gallega
aló nas Castillas oias,
ó teu corazón pregunta,
verás que che di en resposta
que a gaita gallega:
Non canta, que chora”


Cantares Gallegos

Em Portugal, Antero de Quental e Teófilo Braga não deixam de saudar com entusiasmo a publicação desta obra.

Neste mesmo ano sai também a público Flavio e publicará em castelhano A mi madre.

Devido à publicação de Cantares Gallegos (a primeira obra editada em língua galega), o dia 17 de Maio, passou a ser Dia das Letras Galegas, é feriado nacional na Galiza. 

Em 1864 deu-se um artigo de Rosalía cujo original se perdeu, enfurece um grupo de seminaristas de Lugo, que invadem as instalações do El Almanaque de Galicia, destruindo a composição., pelo que este nunca seria publicado.
Em 1866 edita em Madrid a narrativa Ruinas  e, em Lugo, El Cadicee no ano seguinte, ainda em castelhano, , sai o romance El caballero de las botas azules.
Em Setembro de 1868, eclode em Cádis uma revolta liberal, liderada pelo almirante Topete ao qual se junta depois o marechal Prim. A rebelião dirige-se contra a rainha Isabel II e contra o presidente do seu governo, González Bravo.


Isabel II, em 1852. Próximo a sua filha Isabel.
(Quadro de Francisco Xavier Winterhalter)

A rainha refugia-se em França e é deposta. Devido à liberalização do governo, Murguía é nomeado Chefe do Arquivo de Simancas. O casal passa a viver entre Madrid e Simancas. Depois de terem residido em Lugo, Rosalía e Manuel voltam a Madrid onde, em Dezembro, nasce uma segunda filha, Aura.

Em Julho de 1871, nascem os gémeos Gala e Ovídio; em Julho 1873 nasce, na Corunha, Amara; em Março de 1875 nasce Adriano Honorato Alejandro (que viria a morrer em Novembro do ano seguinte, vítima de uma queda); finalmente em Fevereiro 1877 Rosalía dá à luz Valentina (que nasce morta).

Entretanto, em Madrid, Murguía dirige La Ilustración Gallega y Asturiana.

Em 1880 publica, em galego, a colectânea Follas novas.

Publica em 1881 El primer loco; cuento estraño. E em  La Ilustración Gallega y Asturiana, publica um texto sobre «Padrón y las inundaciones».

Em castelhano, é editada a colectânea En las orillas del Sar, em 1884.

Em Padrón, a 15 de Julho de 1885, com 48 anos, morre Rosalía de Castro, vitimada por um cancro no útero. É enterrada no cemitério de Adina, junto à campa de sua mãe.

Os restos de Rosalía mortais serão trasladados para o Panteão dos Galegos Ilustres, no convento de São Domingos de Bonaval, em Santiago de Compostela em 1891.

Homenagens que culminariam em 1917, com a inauguração de um monumento a Rosalia de Castro no Passeio de Ferradura, no centro de Santiago de Compostela.

Estátua de Rosalía na Praça da Galiza, no Porto

Em Portugal, a Setembro de 1954, na cidade do Porto, na Praça da Galiza, é inaugurado um monumento a Rosalía, da autoria do escultor Salvador Barata Feyo (1902-1990).

Vem este apontamento a propósito de um belíssimo exemplar da 1ª edição de Follas Novas inserido na Montra de 19 de Maio  da in-libris.



8345. CASTRO (Rosalía de). — FOLLAS NOVAS // VERSOS EN GALLEGO // DE // ROSALÍA DE CASTRO DE MURGUÍA // PRECEDIDOS DE UN PRÓLOGO // POR // EMILIO CASTELAR // MADRID // La Illustracion Gallega y Asturiana // ... // 1880 (Aurelio J. Alaria, impresor, Estrella, 15, Madrid. 14,5x20 cm. 271-I págs. E.



“Guardados estaban, ben podo decir que para sempre, estes versos, e xutamente condenados po-la sua propia índole á eterna olvidanza, cando, non sin verdadeira pena, vellos compromissos obrigáronme á xubtalos de presa e correndo, ordenalos e dalos á estampa. N’era esto, en verdade, o qu’eu queria, mais n’houbo outro remedio; tuben que conformarme c’o duro d’as circunstancias que asi o fixeram (...) Despois d’o xa dito, tendrey que añadire qu’este meu libro n’é en certa maneira, fillo d’a mesma inspiracion que dou de si os Cantares gallegos? Paréce-me que non. Cousa este ultimo d’os meis dias d’esperanza e xuventude, ben se ve que ten algo d’a frescura propia d’a vida que comenza. Mias o meu libro d’hoxe, escrito como quen dí, en medio de todo-l-os desterros, non pode ter anque quixera o encanto que soye emprestarlles á inocencia d’as primeiras impressiós: que ô sol d’a vida, ó mesmo que o que alima ó mundo que habitamos, non loce n’os seus albores d’a mesma sorte que cando vay poñerse tristemente, envolto antr’as nubes d’o postreiro outono. Por outra parte, Galicia era n’os Cantares ó obxeto, á alma enteira, mentras que n’este meu libro d’hoxe, âs veces, tan soyo á ocasion, anque sempre ó fondo d’o cuadro (...)

Primeira edição do segundo livro da autora, inequivocamente a figura mais representativa da literatura galega de todos os tempos.

Espero ter despertado a vossa atenção para esta poetisa e para um melhor conhecimento da cultura galega.

Saudações bibliófilas.

2 comentários:

  1. Rosalía de Castro la tengo muy presente sobretodo por los discos que le dedicó Amancio Prada y que escucho asiduamente porque me relajan y porque las poesias son de una belleza sin límites.

    Ahora bien, no es lo mismo un CD que el lujo de poderla leer en una primera edición!

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  2. Sempre gostei de ler Rosalia de Castro, até porque existe umas certa "cumplicidade" entre a cultura portuguesa e a cultura galega.

    (O "galego" era um personagem típico da Lisboa da minha juventude.)

    Quanto à 1ª edição, de facto é um luxo possuir os seus livros nestas condições, e este exemplar parece-me muito bom, mas Rosalia até se lê em livro de bolso!

    Um abraço

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