Nicolau Tolentino de Almeida
nasceu em Lisboa a 10 de Setembro de 1740 e onde faleceu a 23 de Junho de 1811.
Era filho de um advogado da Casa da Suplicação.
Nicolau
Tolentino de Almeida
Aos vinte anos ingressou em Leis na Faculdade de Direito da
Universidade de Coimbra, mas ao mas era mais um boémio e poeta do que um
estudante aolicado. Frequentou largos anos (1760-69) esta Universidade mas sem
nunca terminar o curso de Direito.
Regressando a Lisboa, obteve carta de professor régio de Retórica e de
Poética em 1767, numa das cátedras criadas pelo Marquês de Pombal, após a
expulsão dos Jesuítas.
Nos seus versos demandava um pedido mais ou menos directo de um cargo
na secretaria de estado, que acabaria por ser satisfeito com a nomeação como
oficial de secretaria.
Foi professor durante quinze anos, embora isso não o entusiasmasse,
muito antes pelo contrário. Procura então, por vários meios, que vão da súplica
à lisonja, do auto-empequenecimento à provocação da piedade, transitar para a
carreira burocrática; disto mesmo se encontra larga matéria nos seus versos.
Foi sempre um inadaptado e descontente até conseguir um posto na
Secretaria dos Negócios do Reino, que conseguiu em 1870, quando foi nomeado
oficial praticante, sem vencimento, da Secretaria de Estado dos Negócios do
Reino e, três anos depois, ascendeu a oficial ordinário da mesma Secretaria.
Retrato do Marquês de Pombal por Louis-Michel van Loo (retrato)
e Claude-Joseph Vernet (paisagem). 1766. Pintura a oleo.
Câmara Municipal de Oeiras. Portugal.
Curiosamente conseguiu tudo aquilo que sempre ambicionou, o que não o
fez deixar de deplorar uma suposta miséria. Tolentino queixou-se amarga e
frequentemente da sua penúria financeira, o que lhe valeu o apodo de Poeta Pedinchão, uma vez que nem
dinheiro tinha para enterrar um mísero cavalo. No entanto, hegou a ser nomeado
cavaleiro fidalgo da Casa Real com uma tença e a entrar para sócio da Academia
das Ciências e a imprimir as suas obras à custa do Estado.
Foi numa publicação anual da Tipografia
Rollandiana é que apareceram, entre 1779 e 1783, impressas anonimamente,
pela primeira vez, composições de Nicolau Tolentino de Almeida.
Nicolau Tolentino pertenceu ao movimento da Nova Arcádia (1790-1794). (1)
Como bom metrificador, compôs sátiras descritivas e caricaturais,
sonetos e odes, que reuniu em dois pequenos tomos que foram publicados em 1801 com
o título de Obras
Poéticas.
ALMEIDA, Nicolau Tolentino de –
Obras poéticas de... Lisboa: Na
Régia Officina Typographica,MDCCCI [1801]. In 8º de 2 volumes com 231 - (1) e
222 - (1) respectivamente. Encadernação da época em carneira mosqueada, com rótulos
vermelhos e dourados de execução recente na lombada. papel mantendo a
sonoridade original, muito saudável, na obstante de apresentar uma mancha de
humidade marginal nas últimas paginas do primeiro volume.
Referido pelo poeta O’Neill, no prefácio a «Uma Arte do Pormenor ou um
Preâmbulo para Desatentos»: "...[Tolentino] soube preservar, no meio das
insignificâncias dum quotidiano sem relevo, uma visão implacável e irónica da
sociedade do seu tempo. Objectar-se-á que ele fez uma crítica movida de cima para
baixo, uma crítica de galarim para a plateia, mas Honoré (de) Balzac – e
abstraímos da salvação das devidas proporções – que teria feito? Se o ponto de
vista donde a visão procede é importante, a objectividade da visão não o é
menos..."
O escritor e editor Paulo da Costa Domingos nos diz ainda sobre este
poeta:
"...Poeta da transição de século, do XVIII para o XIX. A presente
edição surgiu ainda em vida, dado ele haver falecido apenas em 1811; edição a
expensas do Estado, que, na altura, e apesar da feroz vigilância sobre os
costumes, permitiu que se desse à estampa requintes sátiros como o do seguinte
exemplo entre muitos:
«Em fege eftreita entaipados, Sol á ilharga, Sol por cima, Vinha eu, e
o Padre Lima Cheios de pó, e encalmados. Eis-que na eftrada atacados, Párão as
mulas baratas; Cuidei eu que erão Piratas, Que tirão vida, e dinheiro, Fui ver
fe era o Clavineiro, E achei duas Açafatas.
Trazião a arma mais dura, Que nos peitos fe tem pofto, Trazião ambas
no rofto O refpeito, e a formozura. Querem fege mais fegura, Porque a fua eftá
quebrada; E em quanto o Padre na eftrada Lhe diz palavras pompozas, As minhas
mãos refpeitozas Lhe affoufavão a almofada. [...]»
©Livraria Alfarrabista Miguel de
Carvalho
ALMEIDA, Nicolau Tolentino de –
Obras poéticas de... Lisboa: Na
Régia Officina Typographica,MDCCCI [1801]. 1.ª edição. 2 tomos (completo). 232
págs. + 224 págs.
Encadernações da época inteiras em pele mosqueada com gravação a ouro,
rótulo em pele na lombada apenas no tomo I, pouco aparados, corte carminado. Exemplares
em bom estado de conservação; miolo limpo, papel muito fresco. Assinatura e
carimbo de posse no tomo I. Peça de colecção.
Poeta da transição de século, do XVIII para o XIX. A presente edição
surgiu ainda em vida, dado ele haver falecido apenas em 1811; edição a expensas
do Estado, que, na altura, e apesar da feroz vigilância sobre os costumes,
permitiu que se desse à estampa requintes sátiros como o do seguinte exemplo
entre muitos:
«Em fege eftreita entaipados,
Sol á ilharga, Sol por cima,
Vinha eu, e o Padre Lima
Cheios de pó, e encalmados.
Eis-que na eftrada atacados,
Párão as mulas baratas;
Cuidei eu que erão Piratas,
Que tirão vida, e dinheiro,
Fui ver fe era o Clavineiro,
E achei duas Açafatas.
Trazião a arma mais dura,
Que nos peitos fe tem pofto,
Trazião ambas no rofto
O refpeito, e a formozura.
Querem fege mais fegura,
Porque a fua eftá quebrada;
E em quanto o Padre na eftrada
Lhe diz palavras pompozas,
As minhas mãos refpeitozas
Lhe affoufavão a almofada. [...]»
©Frenesi Loja
ALMEIDA, Nicolau Tolentino de –
Obras poéticas de... Lisboa, Na
Impressão de João Nunes Esteves [à venda na Loja dos Pobres], 1828. Nova edição
[3.ª edição].2 tomos (completo) (encad. em 1 vol.) 226 págs. + 174 págs.
Encadernação da época inteira em pele com gravação a ouro na lombada muito
pouco aparado, sem o papel de revestimento então usual para proteger os
cadernos brochados* exemplar estimado, com pequenas falhas nos cantos, na
lombada e no rótulo; miolo limpo, papel fresco. Peça de colecção.
Edição simultânea a uma outra da Tipografia Rollandiana (a verdadeira
2.ª edição), enfermando da não inclusão de um terceiro volume de Obras
Póstumas, somente disponibilizado por Rolland. Ambos os editores usaram como
suporte das suas publicações a edição original de 1801, verificando-se em parte
duvidosa a compilação desse terceiro livro (ver Inocêncio Francisco da Silva,
Diccionario Bibliographico Portuguez, tomo VI, Imprensa Nacional, Lisboa,
1862).
[* A capa impressa mais antiga que conhecemos data de 1834 (vd. Pedro
Azevedo, Biblioteca Alfonso Cassuto: Inquisição – Judaica, cat. leilão,
Dezembro, 2009). Datada de 1836 é também a sóbria capa da brochura Tributo
Portuguez á Memoria do Libertador de António Feliciano de Castilho, impressa em
Lisboa por Galhardo, Irmãos.]
©Frenesi Loja
Anos depois foram publicadas novas edições da mesma obra a que se
acresceu um terceiro volume intitulado Obras Póstumas.
TOLENTINO de Almeida, Nicolau,
1740-1811 – Obras posthumas de ... - Lisboa: Na Typographia Rollandiana
1828. 150 p.
A edição das suas Obras Completas de 1861, organizada
por José Torres, inclui gravuras e vinhetas da autoria de Nogueira da Silva.
ALMEIDA, Nicolau Tolentino de –
Obras Completas de… Lisboa: Editores
– Castro, Irmão & C.ª, 1861. 1.ª edição completa. 388 págs. + 34 folhas em
extra-texto + LXXXVI págs. + X págs. Profusamente ilustrado no corpo do texto e
em separado.
Encadernação da época (de A. João de Deus) inteira em tela mareada,
pouco aparado, discreta gravação a ouro na lombada sem capas de brochura.
Exemplar em bom estado de conservação; miolo limpo, papel muito fresco. Peça de
colecção.
Capa de
brochura
©Arpose
Para além da maravilha que é a escrita sarcástica de Tolentino, esta
edição ilustrada mostra-nos a obra-prima absoluta do desenhador-gravador
Nogueira da Silva, o pioneiro da introdução da gravura de madeira em Portugal.
O seu estilo não pode deixar de nos recordar o trabalho artístico de D.
Fernando de Saxe-Coburgo-Gotha, ou, mais remotamente, o do contemporâneo John
Tenniel. A sua colaboração artística nesta obra inclui as 34 ilustrações
impressas em folhas à parte e várias dezenas de vinhetas humorísticas ao longo
do texto.
©Frenesi Loja
Em relação a esta mesma edição vamos ver um pouco mais em pormenor as
suas características que a tornam num exemplar de grande interesse bibliófilo.
Para isso vou-me socorrer do meu exemplar.
ALMEIDA,
Nicolau Tolentino de – Obras Completas de… (Enc. lombada)
ALMEIDA,
Nicolau Tolentino de – Obras Completas de… (Enc. pasta)
Exemplar com encadernação meia-francesa de pele bordeaux com cantos com
dizeres e ornatos floreados na lombada. Aparado apenas à cabeça estando as
restantes margens intactas. Carminado à cabeça. Picos de humidade dispersos. Miolo
muito bem conservado e muito fresco. Boa e sólida encadernação tornando-o bastante
atractivo.
ALMEIDA,
Nicolau Tolentino de – Obras Completas de… (Capa de brochura)
ALMEIDA,
Nicolau Tolentino de – Obras Completas de… (Pág. de título)
As diversas obras estão dispostas pelos seus tipos – caso dos Sonetos e Quartetos.
ALMEIDA,
Nicolau Tolentino de – Obras Completas de… (Sonetos)
ALMEIDA,
Nicolau Tolentino de – Obras Completas de… (Quartetos)
Como se disse esta edição está profusamente ilustrada – 34 ilustrações
no total – pelo desenhador-gravador Nogueira
da Silva, o pioneiro da introdução da gravura de madeira em Portugal.,
conforme se pode ver:
ALMEIDA,
Nicolau Tolentino de – Obras Completas de… (Ilustrações)
De igual modo apresenta várias vinhetas tipográficas conforme esta que
se mostra:
ALMEIDA,
Nicolau Tolentino de – Obras Completas de… (Vinheta tipográfica)
A obra termina com um estudo notável de José Torres – Ensaio
Biographico-Critico Acerca de Nicolau Tolentino de Almeida.
ALMEIDA,
Nicolau Tolentino de – Obras Completas de… (Ensaio Biographico-Critico)
Em 1968 esta obra seria reeditada (3ª edição) pela editora Estúdios Cor com um excelente prefácio de Alexandre O’Neill
ALMEIDA, Nicolau Tolentino de –
Obras Completas de… Lisboa, Estúdios Cor, 1968. 3.ª edição [1.ª edição:
1801; 2.ª edição: 1861]. Prefácio de Alexandre O’Neill. Desenhos de Nogueira da
Silva. XII págs. + 384 págs. Profusamente ilustrado no corpo do texto
cartonagem editorial em sintético com gravação a ouro na pasta anterior e na
lombada, e com relevo seco e estampagem na mesma pasta, guardas impressas
reproduzindo gravura de época. Frontispício a duas cores e relevo seco.
Exemplar n.º 560 de uma tiragem declarada de 1.000 exemplares impressos sobre
papel avergoado e canelado
Volume realizado seguindo a lição antológica de José Torres e o
grafismo de Nogueira da Silva para a edição de 1861 na Castro, Irmão & C.ª
– Editores. Refere-lhe o poeta O’Neill, no prefácio, «Uma Arte do Pormenor ou
um Preâmbulo para Desatentos»:
«[...] [Tolentino] soube preservar, no meio das insignificâncias dum
quotidiano sem relevo, uma visão implacável e irónica da sociedade do seu
tempo. Objectar-se-á que ele fez uma crítica movida de cima para baixo, uma
crítica de galarim para a plateia, mas Honoré (de) Balzac – e abstraímos da
salvação das devidas proporções – que teria feito? Se o ponto de vista donde a
visão procede é importante, a objectividade da visão não o é menos. [...]»
Especial destaque para as ilustrações de Nogueira da Silva.
©Frenesi Loja
A sua obra distribui-se por diversos tipos de composições – sonetos,
odes, cartas e sátiras. Estas últimas celebrizaram-no a ponto de ele hoje
representar, na história literária portuguesa, o papel de "o satírico".
Não era um poeta de grandes recursos, pois que do ponto de vista
estilístico, a sua obra caracteriza-se pela simplicidade, longe da
grandiloquência e das métricas próprias dos poetas neoclássicos. O seu verso
aproxima-se das formas populares, e o seu tom da coloquialidade, o que
contribui para os efeitos de denúncia de vícios corriqueiros, de episódios
quotidianos e onde conseguiu apreender bem os erros e ridículos da sua época.
A sua sátira consistia em realçar as proporções dos usos e vícios da
época, hipertrofiando o exagero que encontrava.
Estas sátiras têm um pendor humorista desprovido do intuito de
estigmatizar vícios ou defeitos pessoais, pelo que Tolentino se apresenta como
um espectador atento da realidade circundante, procurando matéria pitoresca
para reproduzir e transfigurar, pelo que o conjunto da sua obra se assume como
uma crónica de costumes que preludia já uma literatura percorrida por uma
galeria de tipos, ao estilo da "comédia
humana" que outros autores desenvolveriam mais tarde.
Sátira
aos Penteados Altos
(Ilustração)
Veja-se o exemplo em como ridicularizou os penteados da época que eram
muito altos, daí ter escrito que lá se podiam esconder os mais variados
objectos: uma arca, um colchão e até mesmo um homem. Ridicularizou as mulheres que
se enfeitavam com vistosas cabeleiras, sem melhorar o juízo; as velhas que
recorriam à formosura postiça; os vadios e ociosos; os maridos que apanhavam da
mulher.
Sátira
aos Penteados Altos
Chaves na mão, melena desgrenhada,
Batendo o pé no chão, a mãe ordena
Que o furtado colchão fofo e de pena,
A filha o ponha ali, ou a criada.
A filha, moça esbelta e aperaltada,
Lhe diz co'a doce voz que o ar serena:
"Sumiu-se-lhe um colchão?! é forte pena;
Olhe não fique a casa arruinada.
"Tu respondes-me assim? Tu zombas disto?
Já cuidas que por ter pai embarcado,
Já a mãe não tem mãos?" E, dizendo isto,
Arremete-lhe à cara e ao penteado;
Eis senão quando (caso nunca visto!)
Sai-lhe o colchão de dentro do toucado.
Com Nicolau Tolentino, que é considerado por muitos um dos grandes
vultos literários do século XVIII português e um dos maiores satíricos
nacionais, a sátira de costumes atinge em Portugal um nível que raramente foi
preterido. A sua influência, embora não tenha sido espectacular, é no entanto
ponderável, pois podemos detectar ainda um certo sabor tolentiniano num autor
contemporâneo como Alexandre O'Neill.
Frontispício de
uma peça de teatro "de cordel" de Tolentino.
Bibliografia:
Miscelânea Curiosa e Proveitosa
Bilhar
Passeio
Função
Guerra
Amantes
Obras poéticas de Nicoláo Tolentino
de Almeida, Tom. I
Obras poéticas de Nicoláo Tolentino
de Almeida, Tom. II
Obras posthumas
Notas:
(1)
Foi fundada em Março de 1756 na cidade de Lisboa, por iniciativa dos poetas Cruz e Silva (Elpino Nonacriense), Manuel Nicolau Esteves Negrão (Elmano
Sincero), Reis Quita (Alcino Misénio) e Teotónio Gomes de Carvalho, aos quais
se juntou Correia Garção.
A efémera existência desta
instituição (entrou em declínio em 1759 e extinguiu-se em 1776) não impediu que
desse um importante contributo para a renovação oitocentista que se seguiu nas
letras do país. Em 1790 renasceu em Lisboa sob a designação de Nova Arcádia, integrando nomes como os
de Bocage (Elmano Sadino), Curvo Semedo, José Agostinho de Macedo (Elmiro Tagideu), Nicolau Tolentino, Francisco Manuel do Nascimento (Filinto Elísio) e a marquesa de Alorna (Alcipe).
Extinta definitivamente em 1794, deixou a publicação do "Almanaque das Musas"
como testemunho do seu trabalho.
Espero ter conseguido despertar a
vossa curiosidade para este poeta português, hoje um pouco esquecido, mas que
ainda se lê com muito agrado.
Saudações bibliófilas.
Prezado autor,
ResponderEliminarO retrato de Tolentino, que ilustra o texto, há muitas décadas consta nos livros escolares brasileiros como se o fosse de Basílio da Gama, o qual certamente não é. Estou pesquisando os motivos para tal, e quando obtiver alguma informação, envio o que descobri. Se for se seu interesse, é claro.
Att., e os melhores votos,
Pedro Queiroz Leite.